Se você me falasse que conhece um cara que fez 2000 flexões, eu provavelmente iria rir e duvidar muito disso. Talvez você até me convencesse e eu viraria fã desse cara. Se você me falasse que ele pretendia fazer 3800, eu diria que ele não é muito esperto.
Eu, assim como todo mundo que acompanhou a criação do desafio naquela tarde de feriado, tendo a não acreditar no que somos capazes. Não sou diferente de nenhum de vocês, provavelmente não sou mais forte, mais determinado ou mais fanático. Eu sou uma pessoa como qualquer outra.
E se você acha que, para testar os limites do seu corpo, você tem que siar de casa e ir para algum local inóspito e fazer tudo sozinho? Pense de novo, campeão.
O Desafio
Em uma tediosa tarde do feriado, tive a magnifica ideia de postar no Facebook uma proposta inocente. A cada “Curtir” que eu ganhasse naquele post, eu faria 10 flexões. Tenho consciência das minhas ambições no momento. Eu tinha acabado de chegar de um treino especificamente de braço, não esperava mais de 30, no máximo 50 pessoas curtindo o post. Até que nosso amigo Guilherme me provocou a ampliar o desafio na página do Papo de Homem no Facebook , e isso acabou me empurrando para um recorde pessoal inimaginável.
Ao fim do prazo estipulado, a contagem dos “curtir” somou 380. É, amigo, eu estava com um problemão.
Li cuidadosamente todos os comentários que diziam que eu estava ferrado. O Guilherme postou meu próprio artigo para me motivar, e sim, li completamente e assisti aos vídeos antes de começar o desafio. Cada frase precisava ser absorvida, eu precisava acreditar que alcançar aquela meta era possível. A partir daí, eu já não tinha dúvidas nenhuma, eu ia até o final. Neste momento eu parei de lidar tudo como uma brincadeira, assumi um objetivo, agora era sério.
Depois que a contagem dos “curtir” foi finalizada, eu era outra pessoa. Eu era alguém capaz de fazer quatro mil flexões. E se eu não duvidava mais de mim, quem era você para me dizer o contrário? Esse é o ponto em que a dúvida e a incerteza são tomadas por uma forte euforia, um sentimento que faz você esquecer o limite do possível e acreditar que pode fazer absolutamente qualquer coisa. O verdadeiro guerreiro enxerga a oportunidade no desafio. Eu tinha a oportunidade de fazer a maior quantidade de flexões que já fiz na vida, e não ia deixar passar assim.
Dez
A primeira série de dez repetições foi a mais dolorosa, como em qualquer desafio do tipo, a contagem ecoa dentro da sua cabeça, se você for fraco de espirito amigo, desiste ali mesmo.
Quando terminamos a primeira série começamos a rir, simplesmente rir. São os vários momentos em que reconhecemos o absurdo do que queremos fazer, e que reconhecemos que somos diferentes. Assumimos que temos uma qualidade que pode mudar o mundo, o que falta na maioria das pessoas, nós acreditamos em nós mesmos e no que somos capazes. Dois minutos se passam e então entramos em transe, só vou me lembrar de quando já estava beirando as 250 e comecei a sentir sede.
Enquanto a contagem aumentava, eu me desligava do objetivo final lendo os comentários e conversando com pessoas. Falei com Curiosos, entusiastas, e respondi muitas perguntas. Expliquei até todo processo de ganho de flexibilidade para abertura de pernas.
Desprender-se do resultado é essencial, o importante é aproveitar a jornada. Pensar no quanto seria difícil alcançar número final, só me faria pensar em desistir. Enquanto as pessoas pensavam na quantidade de flexões que eu precisava fazer, para mim, eram apenas mais dez. Dois minutos depois eu me lembraria das outras dez. Se preocupe com o problema quando ele realmente existir.
No que estava pensando?
Tenho certeza que uma das maiores curiosidades por aí, é sobre o que passava pela minha cabeça enquanto eu estava ali, com uma câmera me transmitindo para o mundo, mostrando o que eu estava fazendo, buscando algo que para a maioria das pessoas era bobagem, sem nexo. Uma sempre surge em loop: por que estou fazendo isso?
Você lembra quem você é. Pensa em tudo que já fez, em todos os outros treinos, todas as suas experiências, lembra-se das pessoas que motivou. Aqueles que dizem que você os ajudou, aqueles que vão se inspirar por aquele simples ato. Pensa na importância de terminar o que começou. E da metade pra frente, eu só pensava na frase de um dos vídeos que postei na lista descaralhante:
“Você já está sofrendo, já está com dores. Tire uma recompensa disso! Não vá dormir até que você suceda.”
É engraçado como você esquece os problemas, o mundo parece muito mais simples e compreensível.
Link YouTube | Pode ser sim uma baita brisa, mas eis aqui um belo exemplo de “limites”
Eu não pensava que eu precisava trocar o blindex do meu banheiro que quebrou, não pensava que preciso pintar a casa, não pensava que tinha uma reunião com um cliente cedo pela manhã, nada disso passava pela minha cabeça. Lembrei que devia um texto pro Jader e que me esqueci de pagar a conta de luz, mas foi um lapso de foco.
E a resposta para a pergunta que sempre surge na cabeça?
Porque eu posso.
Sinergia
Toda a experiência vai muito além de passar horas empurrando seu corpo pra cima. Enquanto sentimos dor e fadiga, ficamos muito mais sensíveis ao que está acontecendo, estamos totalmente grudados ao momento, cada segundo é sentido. Cada palavra de apoio ou de dúvida vai te afetar de alguma forma. Aprendi a utilizar todo incentivo, positivo ou negativo, como uma forma de me impulsionar pra frente.
Fiz todo o desafio ao lado de um amigo, alguém que acreditava tanto quanto eu que éramos capazes, e cada vez que ele me provocava, eu ficava duas vezes mais determinado. Por várias vezes ele me perguntou “Já está com o braço cansado é?”, eu voltava sempre duas vezes mais determinado. Minha namorada dizendo que acreditava em mim, que sabia que eu conseguiria porque “Você é ninja amor!”, me fazia ter cada vez mais certeza de que o objetivo ia chegar. O relógio agora era apenas um sino, me avisando que precisava fazer mais 10 flexões.
Fazer com um amigo mudou toda a experiência. Como todo bom brother, ele me sacaneou sempre que possível. Como quando fez o alarme tocar antecipadamente enquanto eu estava mijando, só pra voltar correndo e desesperado. Risadas eram comuns entre a gente. Ele era a única pessoa no mundo que entendia o que eu estava passando. Alguns amigos fizeram 100, 50 e até 500 flexões para mostrar solidariedade à causa, eles são fodas.
Nosso editor Rodolfo Viana comentou, lá pelas tantas, que eu já tinha provado que era forte, que já podia parar antes que me lesionasse. Entendo plenamente o que quis dizer, agora eu concordo plenamente com ele, na hora eu só conseguia pensar que não queria provar nada para ninguém, precisava provar para mim mesmo que podia terminar. Uma amiga trouxe uma garrafa de energético para me ajudar a ficar acordado até o final da tarefa.
Em conjunto, toda energia é multiplicada.
Dificuldades
Todo o desafio é cheio de altos e baixos. As dores musculares começaram a aparecer por volta das 400 flexões, mas depois das 700 o corpo ficou dormente, não sentia mais isso. Naturalmente o corpo começa a compensar a ausência de sustentação muscular com tendões e articulações. Até que meu cotovelo direito começou a avisar que estava com o “life” vermelho piscando. Quando você está muito determinado, é muito fácil ignorar a dor e continuar caminhando, é praticamente instinto.
Nunca pensei em desistir porque meu cotovelo estava doendo, eu tinha certeza de que ele ia doer por algum tempo e depois iria parar, mas a cada série ficava mais dolorosa, estava ficando bem preocupado.
Tudo ficou mais difícil depois de 1350, quando meu parceiro precisou atender a sua vida pessoal. A namorada estava chateada porque ele a deixou em casa e estava fazendo flexões. Entendo muito bem, se fosse ele também teria ido correndo. Tenho certeza que em alguma linha de estudos psicológicos tudo aquilo representava carência crônica. Tive que continuar sozinho.
Eu falhei
Infelizmente não consegui. Quando alcancei o numero de 2000 flexões, meu cotovelo parecia que ia explodir, estava com mais dores do que eu conseguia aguentar. Não era mais possível sustentar o peso do corpo, mesmo tendo apelado para flexões com apoio de joelhos desde as 1600, estava com mais dores do que dava para aguentar. Decidi que fecharia com um numero simbólico, fiz mais 11 flexões, na última eu entendi que não dava mais para passar de lá.
Agradeci todo mundo, muita gente viu que fiquei chateado por não ter alcançado o número determinado. Depois que passei das 1500 eu realmente senti que era possível alcançar aquele numero todo, fiquei muito animado, acreditando na possibilidade do cotovelo parar de doer. Mas não rolou. Eu me despedia ali do desafio, com 2011 flexões concluídas.
Entrei para o banho e me senti muito bem, pensei até em voltar e retomar. Mas um homem tem que entender quando já deu, quando a história já perdeu o seu ponto.
Ressalvas
Eu tenho total e completa consciência de que um desafio como esse não agrega absolutamente nada ao meu ganho físico. Pelo contrário, passei horas e horas consumindo massa muscular, e criando micro lesões pesadas nos meus músculos. Passei uma semana inteira sem conseguir me exercitar. Corria em trotes lentos para ajudar na minha recuperação. Tive muita, mas muita sorte em não ter terminado com overtraining.
Essa experiência me acompanhou duramente por toda a semana seguinte, não me esqueci do desafio nem um segundo, lembrei cada momento, cada sensação, cada dor. A dor, física ou psicológica nos desperta um absoluto estado de introspecção, é quando podemos utilizar isso a nosso favor e entender mais sobre nós mesmos.
É importante ter em mente que podemos sonhar. Não apenas sonhar alto, mas sonhar com o impossível. Provavelmente se eu tivesse como meta as 2000 flexões, meu corpo teria me pregado uma peça antes, eu teria me convencido de que era impossível, e teria conseguido apenas 800 ou até menos. Quando nosso objetivo é acima de qualquer limite, fazemos tudo para chegar perto dele, e perdemos nossas limitações.
“Nem sempre um objetivo é para ser alcançado. Em geral, ele serve apenas como uma direção a seguir.”
Bruce Lee
Depois dessa, o que mais eu poderia falar?
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