Jader, você que é o mais gordinho, não quer entrar nessa não?

E foi assim que comecei a correr.

Aprofundando mais, esse foi um e-mail que recebemos, em setembro do ano passado, do Rodrigo Cambiaghi, o cara que cuida da vida comercial aqui no PdH. Era um convite para participar de uma websérie sobre corrida, em que seis convidados passariam por três meses de treino para fazer, ao final, uma prova de corrida de 6km. Tudo isso, feito com acompanhamento de perto do pessoal da MPR Assessoria Esportiva, que nos passaria com um médico do esporte, com uma nutricionista e, claro, com os professores de corrida da própria MPR.

Voltando um pouco, em 2011, quebrei meu tornozelo esquerdo andando de skate. Nada radical, de bobeira mesmo. Uma operação e cinco meses de molho me deram uns 12kg a mais de peso e uma perna fraca para andar quatro quarteirões. De verdade. Caminhar 700m já me dava fadiga no músculo tibial, esse que fica na frente da canela. Queimava à beça. Um ano depois, em 2012, consegui fazer uma série de exercícios que fortaleceram a minha perna esquerda, mas com tanto tempo parado, não me empolgou praticar esportes novamente.

Até aí, tudo bem, não quero, nesse texto, pregar a vida saudável ou a prática de esportes.

Mas eu estava sentindo falta. A falta de autonomia sobre meu próprio corpo estava me deixando triste, ver que minha rotina era pautada sobre o que eu conseguiria fazer ou até onde conseguiria caminhar.

O Max, um dos sócios da Monstro Filmes, me convidou para praticar wakeboard e eu não fui. O Bruno Passos, estaileiro aqui da casa, me chamou pra bater uma bolinha de quinta-feira e também não fui. Não porque não tinha interesse, mas pelo fato de saber não ser (naquele momento) capaz de realizar tais façanhas corporais.

Então apareceu a tal proposta da corrida.

Isso foi em setembro, ou seja, a tal websérie já acabou e, sim, eu consegui cumprir a etapa de finalizar uma prova de 6km. E foi foda.

Mas vamos do começo.

 

Para começar a correr, é preciso correr seguro

Correr parece a coisa mais simples e natural que o ser humano pode fazer. Mas, a probabilidade de você correr errado e, na repetição do erro, acumular dores e lesões e frustrações é bem grande. Eu mesmo, se corresse como sempre corri, não duraria quatro piques.

Logo de saída, fui até a Sports Care e fiz um trabalho rápido, mesmo que paliativo, de arrumar minha postura de corrida. Eu estava todo torto e, em resumo, isso me machucaria os pés, os joelhos, o quadril. Em médio e longo prazo, eu estaria andando para trás em vez de progredir, além do fato de, ao correr errado, gastava muito mais energia e, logo, rendia bem menos.

Por isso, antes de qualquer atividade prática de corrida, sugiro fortemente a procura de alguém que manja do assunto. Claro que procurar um médico especializado pode não ser muito barato, mas vale a pena chegar o mais perto disso porque, no final das contas, vai fazer toda a diferença.

Alimentação e a autonomia alimentar

Se alimentar para melhorar sua performance de corrida é algo não muito diferente de outra dieta básica de reeducação alimentar que uma nutricionista pode te dar.

Mas o bate-papo que você pode ter com alguém que está focada no esporte pode render bem mais. E foi o que aconteceu comigo, quando fui ao consultório da Dra. Mariana Klopfer. Uma conversa toda voltada para a autonomia alimentar.

Há uma diferença enorme entre você se alimentar e matar a fome.

Somos todos uma combinação complexa de reações químicas que, se forem feitas com a maior facilidade possível, obviamente fará com que tudo funcione melhor e, consequentemente, com que vivamos melhor. Escolhemos o que vamos comer e não comemos porque precisamos suprir a fome. Essa é a diferença.

Melhorar a alimentação é botar pra dentro o que precisamos — na medida certa — para que as tais reações químicas aconteçam sem falta ou exagero de proteínas, sais, carboidratos e vitaminas. Tudo correndo certinho, automaticamente o corpo fica menos preguiçoso, menos duro, menos "pidão".

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Isso te dá autonomia. Controle.

Correndo, na prática (e ainda seguro)

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Dos seis participantes, eu era o que menos tinha prática. Havia uma menina que já corre há algum tempo, um lutador de MMA (que nunca correu, mas que tinha todas as condições físicas para tal). Tinha também mais duas participantes — uma com experiência pequena em corrida e outra que nunca havia corrido, mas que fazia muitas atividades físicas) e, além de mim, outro cidadão acima do peso, mas que gostava muito de jogar bola.

Enfim. Nos treinos, todo mundo tinha um plano — traçado pelos professores —  mais ousado que o meu. Enquanto eu tinha como meta caminhar, eles estavam correndo e percorrendo distâncias muito maiores que as minhas. Enquanto eu dava a voltinha no quarteirão, eles corriam o parque do Ibirapuera inteiro. Mais de uma vez.

Mas, em papo com os professores e com o Marcos Paulo — a cabeça por trás da MPR –, a ideia era exatamente começar seguro, tranquilo, no jeito. Não adiantava eu — gordinho e travado e ex-fumante recente — querer sair no estilo queniano de resistência física, psíquica e pulmonar. O lance era fazer com que o corpo pegasse ritmo e vontade de se movimentar outra vez.

E assim foi rolando.

Uma caminhadinha, um trotezinho (coisa pouca, "trota dois minutos e caminha três"). O primeiro mês foi dessa "mamata" que, na verdade, era um baita incentivo pra mim mesmo. Na osmose, fui trotando três minutos, quatro, correndo um e trotando cinco, correndo cinco e caminhando um, correndo oito e caminhando dois.

Dois quilômetros, dois e meio, cinco. Sem ansiedade, eu estava fazendo o que, na primeira semana, considerava mesmo impossível: correr 5km.

Antes de começar, eu vi que 6km era correr duas vezes a Av. Paulista e mais um tico. Na época, nem andar da consolação até o metrô Paraíso eu conseguia. Sem perceber, eu estava marcando o tempo que eu demorava pra correr cada km.

Da segurança à prática, bastou seguir o planejado.

Em uma prova de corrida

Dia 8 de dezembro, estádio do Pacaembu. Lá estava eu para correr a tal prova de 6km.

Havia um planejamento para mim: correr cada km em uma média de 7 minutos. Isso daria uma prova feita em 42 minutos, um bom tempo para um iniciante (mesmo sabendo, mais tarde, que o vencedor fez a prova em pouco mais de 21 minutos, ou seja, com uma média de 3,5 minutos por km.

Acabei fazendo a prova em 39 minutos, dois a menos que o esperado de mim e com o último km feito em 4,5 min (meu melhor até agora).

Em uma prova, para quem nunca esteve em uma, é fácil queimar largada e querer acompanhar a massa que sai correndo após a largada. O grande lance é saber da sua corrida, tê-la planejada na cabeça, imaginada para as suas capacidades.

Com isso, a ansiedade de começar a corrida dando o máximo inexiste e se faz uma prova como deve ser feita: começando tranquilo, começando suave. Daí, sim, km a km, vai-se aumentando a intensidade de acordo com os planos iniciais. Sem fadiga, sem a frustração de não terminar bem, de não concluir o plano traçado.

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Depois da corrida

Uma prova cansativa pra caramba, mas deliciosa de se fazer. A chegada é um baita alívio misturado a um baita orgulho. A respiração volta ao normal, o corpo descansa os músculos, vê o tempo feito, refaz os cálculos.

Um novo obstáculo vencido, a sensação de que é bem possível e, com um pouco mais de treino, pode ficar mais fácil do que parece.

Jader Pires

É escritor e colunista do Papo de Homem. Escreve, a cada quinze dias, a coluna <a>Do Amor</a>. Tem dois livros publicados