Muito do que é produzido pelo jornalismo hoje tem nos deixado mais cínicos, exaustos, confusos e divididos. Um excesso de matérias sensacionalistas e com viés negativo fazem parecer que o mundo está cada vez pior, em uma espiral de caos e histeria da qual não há escapatória.
Nós acreditamos que há caminhos para transformar essa realidade e que isso começa pelas perguntas certas.
Será possível cobrir temas como gênero, racismo e política de maneira mais construtiva, focada em soluções e que nos ajude a construir pontes com quem pensa diferente de nós? Qual impacto emocional as notícias geram em quem as lê? De que maneira a saúde emocional dos próprios jornalistas afeta o que produzem?
Pensando nisso e, no contexto de nosso estudo, oferecemos dicas práticas baseadas nas perspectivas do “jornalismo de soluções” e do “jornalismo construtivo". Ao final, recomendamos alternativas para que possam se aprofundar nesses caminhos.
O que é um jornalismo construtivo e focado em soluções?
É uma abordagem rigorosa e envolvente, que inclui elementos focados em soluções e um olhar construtivo. Fornece recursos que empoderam os leitores, ajudando-os a ter uma compreensão mais ampla da realidade, sem abrir mão dos pilares éticos do jornalismo.
Não é um jornalismo focado apenas em notícias positivas ou que façam os leitores se sentirem bem. O olhar crítico e responsável segue presente.
Essa perspectiva jornalística é recente e tem ganho cada vez mais adeptos ao redor do mundo, com um corpo de evidências científicas sólido apontando para sua eficiência e benefícios. É complementar a abordagens mais usuais, como a investigativa e a das notícias quentes.
“Não é só dar notícias positivas ou boazinhas, não é ativismo, não é política. Jornalismo construtivo é pura e simplesmente lembrar que também somos responsáveis pela sociedade.” – Ulrik Haagerup, fundador do"Constructive Journalism Institute"
10 práticas para um jornalismo mais construtivo e focado em soluções
1. Investigar os pontos em comum entre lados opostos. Dar luz ao progresso feito até agora, assim como às histórias de resiliência, compaixão e aprendizado.
2. Oferecer recursos e sugestões que permitam aos leitores se aprofundar e aprender mais sobre o assunto.
3. Incluir contexto explicativo e didático que facilite compreender o tema de maneira mais ampla e ponderada, assim como as questões centrais envolvidas e possíveis consequências. Procure adicionar as camadas de nuance e complexidade necessárias. A notícia ganha força como fagulha de processos de aprendizado e conversas mais longas.
4. Priorizar abordagens orientadas à construção de futuros possíveis. Não priorizar a busca por mais cliques e acessos. O vício em cliques e curtidas é um dos maiores inimigos atuais do jornalismo.
5. Cobrir em detalhes o que não está funcionando e quais os obstáculos específicos a serem superados.
6. Investigar os dados com cuidado, numa perspectiva histórica. A situação está progredindo ou piorando? Uma análise superficial e apressada pode levar a leituras equivocadas e sensacionalistas.
7. Evitar abordagens que aumentem a polarização. Relatar apenas o pior de um lado e/ou o melhor de outro é a receita ideal para aumentar o ódio.
8. Evitar abordagens focadas excessivamente nos aspectos negativos do que aconteceu. Mas não fuja dos problemas e dos aspectos críticos. Reporte-os com clareza e sinceridade, pois abordagens que tratem apenas de aspectos positivos podem ser vistas como ingênuas.
9. Evitar manchetes e chamadas de redes sociais que sejam sensacionalistas ou raivosas. Muitas vezes o resultado disso é apenas intensificar um sentimento de histeria coletiva, aumentando o ódio de um grupo pelo outro, favorecendo o surgimento de diálogos rasos. O tom da própria matéria encoraja os leitores a serem mais colaborativos ou mais agressivos uns com os outros.
10. Ativamente encorajar a participação construtiva, respeitosa e com bons argumentos dos leitores/ telespectadores/ ouvintes. Ativamente desencorajar ofensas, ataques pessoais e participações vazias.
A saúde emocional dos jornalistas não está boa — e isso torna mais difícil para a sociedade dialogar sobre temas complexos:
Não temos dados sobre a realidade brasileira, infelizmente. Mas levando em conta a crise que assola boa parte dos veículos nos últimos anos, é possível deduzir que haja obstáculos similares.
Se as pessoas que contam pra nós a história do que acontece no mundo estão mal pagas, sobrecarregadas, frustradas, ansiosas e depressivas, qual impacto isso tem em nós?
É chave cuidarmos melhor do bem-estar emocional dos jornalistas para que possamos ter melhores conversas entre segmentos sociais em lados opostos.
Caso seja jornalista, se aprofunde aqui:
- Jornalismo de Soluções
- Jornalismo Construtivo
- DART Center (Saúde emocional dos jornalistas)
- Livro "From Mirrors to Movers: Five Elements of Constructive Journalism" por Catherine Gyldensted, disponível gratuitamente
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Esse artigo faz parte da nossa recém-lançada pesquisa "Derrubando muros e construindo pontes: como conversar com quem pensa muito diferente de nós". Você pode saber tudo sobre ela aqui.
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publicado em 16 de Abril de 2019, 17:34