Gente, carro e bike na rua: por que não?

Andar a pé eu vou, que o pé não costuma falhar

Eu lembro da última vez que fui à rua 25 de março comprar bijuterias.

Aquela Ladeira Porto Geral apinhada de gente. Quando damos sorte, é sol na cabeça – melhor que chuva, não é mesmo? A calçada não chega perto de dar conta e a gente fica tentando pular os cantos do asfalto, por onde passa todo o tipo de água suja. Então fica gente pra lá da calçada e gente pra cá, mas todo mundo com pressa.

E aquele barulho de buzina na orelha? Os carros tentando passar e "ô, moço, não vai dar certo isso". A gente anda meio olhando pra trás pra ter certeza de que não está sendo atropelado.

Umas semanas atrás, aqui em São Paulo, o prefeito comunicou que uma das principais vias da cidade, a Avenida Paulista, provavelmente ficará fechada para carros aos domingos. Só pessoas e bicicletas poderão ocupar o espaço.

Teve a galera que aproveitou pra andar de skate, patins e afins. Caminhar, fazer pique-nique com a família e os amigos, fazer sarau. Ocupar o espaço, sem prestar contas ou gastar dinheiros. Também teve quem não gostasse da medida – dava pra dividir com os carros!, por que esse pessoal não vai pra um parque?, mas e os hospitais da região?.

Não, seu cão não corre riscos

As reações foram múltiplas, mas similares àquelas de quando as ciclofaixas foram pintadas por aqui. Ou quando a velocidade das principais marginais foi reduzida.

Mais recentemente, o mesmo prefeito comunicou que, em outra via importante da cidade, será pintada uma faixa verde com mais ou menos 1,5m de largura como forma de estender a calçada para os pedestres. A região é universitária e muitas pessoas circulam por ali.

Além disso, o piso do calçadão da rua Sete de Abril será substituído por um novo material removível e autolimpante.

Todo esse cuidado que está sendo dispensado pra com os pedestres me parece carregar uma mensagem: "voltem às ruas, batam à porta do vizinho de calçada, há vida fora da lataria".

Não é só a cidade de São Paulo que está tomando iniciativas assim. Pelo Brasil e pelo mundo elas já existem. Mesmo consideradas as devidas proporções de cada lugar – extensão, número de pessoas e de carros, diferenças socioculturais, IDH –, é uma ideia inspiradora. Não acham?

Rua Coronel Oliveira Lima, na cidade de Santo André, aqui em São Paulo. Além do calçadão, os pedestres têm cobertura
Belo Horizonte também tem ruas fechadas aos carros, como essa, no bairro Savassi. Aos domingos pela manhã, outras vias da cidade, como a Avenida Bandeirantes, também ficam interditadas para o trânsito e os mineiros tomam conta do espaço
Salvador, na Bahia, surgiu nos comentários desse texto, na fala do Lucas Dantas. Na Orla da Barra agora só circulam bicicletas, pedestres ou carros autorizados a um limite máximo de 20 km/h
O Bell Street Park, em Seattle, EUA, é uma área de uso comum para pedestres e carros. A intenção é que o parque atraia mais gente pra área antes abandonada a roubos e tráfico de drogas. Com mais gente transitando, o lugar torna-se mais seguro.
Na Nova Zelândia, a velocidade e quantidade dos carros na Elliot Street diminuiu e o número de acidentes não aumentou
A pequena cidade de Bohmte, na Alemanha, é toda assim: todo mundo anda junto, um respeitando o espaço do outro
Drachten, nos Países Baixos, também é toda constituída de espaços compartilhados

 


publicado em 09 de Setembro de 2015, 13:10
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Marcela Campos

Tão encantada com as possibilidades da vida que tem um pézinho aqui e outro acolá – é professora de crianças e adolescentes, mas formada em Jornalismo pela USP. Nunca tem preguiça de bater um papo bom.


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