Game of Thrones: a maioridade da fantasia épica

Há quase 2.000 anos, o imperador romano Públio Elio Trajano Adriano, que governou entre os anos 117 e 138, construiu uma gigantesca muralha na região onde hoje é a Inglaterra. Os três metros de largura e até seis metros de altura rasgavam o norte da Europa em uma linha praticamente reta de 120 quilômetros, das praias Mar Irlandês até a costa do Mar do Norte. A ideia do ousado imperador era frear os ataques bárbaros e controlar o acesso de pessoas e comércio ao ‘mundo civilizado’. De acordo com os historiadores, ele conseguiu.

Pegando carona na audaciosa empresa do imperador romano, o autor americano George R. R. Martin substituiu o Império Romano por Sete Reinos medievais, o muro de Adriano por uma muralha de gelo e 700 metros de altura, e os ‘bárbaros escoceses’ em uma raça de guerreiros sobrenaturais. Costurando o cenário imaginado por Martin, há uma dose homeopática de magia, suficiente para polir as extremidades fantásticas da série, sem cair na redundância das histórias que nasceram à sombra de O Senhor dos Anéis.

As Crônicas de Gelo e Fogo
A Guerra dos Tronos

Assim surgem , uma série de sete livros que, para muitos, já conquistou um lugar no mesmo panteão da Terra Média, lar das épicas sagas narradas pelo mestre J. R. R. Tolkien. A história vem fazendo tanto sucesso que a HBO está produzindo uma série de 10 episódios baseados no primeiro livro: (Leya, tradução de Jorge Candeias, 592 páginas, 49,90 reais). O primeiro episódio vai ao ar no Brasil neste domingo, às 21 horas. Mesmo os assinantes da Net que não possuem a HBO poderão conferir o primeiro episódio. A empresa vai liberar o sinal para todo mundo.

Fantasia para adultos

Mas que exatamente faz o mundo de Westeros e Essos – nomes dos continentes de As Crônicas de Gelo e Fogo – diferente dos demais criados na esteira da Terra Média? Bom, Martin não nos conta uma fábula medieval. Não há elfos, duendes, unicórnios, paladinos da justiça ou diferença clara entre o bem e o mal. De acordo com o próprio autor, “ninguém mais aguenta esse tipo de coisa”. E ele tem razão. Em vez disso, o leitor é imerso em uma realidade sombria, perversa e intensa.

Os personagens de Westeros fazem sexo (muito sexo), traem, corrompem, quebram tabus e morrem brutalmente. Cada personagem segue o próprio código moral, tentando sobreviver em um mundo onde não há vencedores ou perdedores, há mortos e sobreviventes.

Além disso, a história é profundamente complexa. Existem mais de mil personagens mencionados pelo menos uma vez nos quatro primeiros livros já publicados (o quinto virá em julho). São tantas coisas acontecendo ao mesmo tempo, que à medida que a história cresce, mesmo para o autor, a tarefa de manter a coesão dos livros é hercúlea.

Mesmo os mais perspicazes terão desafio suficiente para prever o desenrolar da saga, tantas são as reviravoltas. Martin nos ensina duramente que nenhum personagem está a salvo, qualquer um pode morrer a qualquer momento quando menos se espera.

Lacuna

As Crônicas de Gelo e Fogo chegaram para preencher um vazio existente há muito tempo. A verdade é que a maioria das histórias de fantasia são vendidas como se fossem para adultos, mas elas não discutem problemas muito além do infanto-juvenil. Essas histórias são cheias de lições, de um grupo de mocinhos que precisa derrotar o grupo de bandidos de desfechos estilo Scooby-Doo ou novelas da Globo.

Os jovens que consumiram literatura fantástica há algum tempo hoje são adultos órfãos de uma boa história que fale do mundo que amadureceu com eles. A guerra de egos pela busca do poder, as contradições da vida, o duplo sentido de tudo, a crudeza da violência e do sexo explícito – são elementos difíceis de encontrar na literatura fantástica e que sobram em Westeros. É por isso que tantos adultos estão devorando os livros. Finalmente uma história de fantasia que não tem medo de se assumir como corrupta, sombria, incestuosa e profundamente humana.

O enredo

Faz frio, muito frio no norte do continente de Westeros. Além da Muralha milenar que protege os Sete Reinos das ameaças sobrenaturais ou não de 8.000 anos antes, rumores sobre os Andarilhos Brancos, guerreiros sobrenaturais que transformam pessoas em mortos-vivos, começam a se espalhar.

Dentro da aparente segurança dos Sete Reinos, John Arryn, o braço direito do rei Robert Baratheon, morre por causa de uma misteriosa febre fulminante. Baratheon leva a corte até a fortaleza de Winterfell, governada pelo amigo de infância Eddard Stark, a fim de convidá-lo para substituir o falecido agente da realeza. Enquanto a corte está em Winterfell, uma carta da viúva de Arryn, avisa os Stark de que o marido teria sido assassinado pelos Lannisters, a família da rainha, Cersei.

Enquanto isso, do outro lado do mar estreito, que divide os continentes de Westeros e Essos, os últimos sobreviventes dos Targaryen, dinastia destronada pela rebelião de Robert Baratheon 17 anos antes, vive exilada esperando o momento certo para reaver o trono. O jovem Viserys Targaryen pretende vender a belíssima irmã Daenerys para Khal Drogo, líder de uma tribo de senhores de cavalos, na esperança de conseguir 40.000 guerreiros para ajudar a retomar os Sete Reinos.

Link vídeo

Se você está procurando uma série apaixonante e é entusiasta do cenário medieval, sua busca acaba aqui. Se você pretende experimentar o gênero fantastico apresentado sem frescuras, sob uma perspectiva jamais explorada, dê uma chance para As Crônicas de Gelo e Fogo. Façamos o seguinte: assista ao primeiro episódio hoje às 21h ou leia os dois primeiros capítulos do primeiro livro. Você não vai se arrepender.


publicado em 08 de Maio de 2011, 15:31
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Marco Túlio Pires

Coordenador da Escola de Dados e Assessor de Inovação e Transparência na Secretaria de Desenvolvimento Social do Estado São Paulo. Jornalista, é programador interessado na interseção entre ciência da computação, jornalismo, novas plataformas e governo aberto. Escreve de vez em quando em Bitcount.


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