Em um excelente artigo no New Inquiry, Adrian Chen questiona como as redes sociais estão ficando anti-sociais. O argumento é simples: a internet em teoria nos dá infinitas opções para ter contato com pessoas de todos os tipos, de todo mundo, com as preferências mais variadas. Mas hoje – Chen argumenta – parece que estamos menos abertos a criar amizades significativas com estranhos, erguendo cercas contra os desconhecidos. E isso mata o potencial de descoberta social da rede, que era forte na era pré-Facebook.
Ele diz:
Os espaços que encorajam os estranhos a formar amizades duradouras estão morrendo. Fóruns e email estão sendo substituídos pelo Facebook, que é construído na premissa de que as pessoas irão preferir povoar cuidadosamente as suas vidas online com apenas um punhado de amigos “reais” e fechar a porta para trolls, stalkers e golpistas.
Agora que a desconfiança aos estranhos online estão embebidas no código da nossa rede social mais popular, está ficando cada vez mais improvável que as pessoas interajam online com alguém que não seja conhecido.
Não sei se a tese se aplica a todo mundo, mas ela faz bastante sentido para mim, há pelo menos uma década e meia fazendo amizades “reais” com estranhos na internet. Em 1997, por exemplo, conheci uma namorada no mIRC, em uma dessas salas de bate-papo onde a única coisa que ligava todo mundo era o fato de morarmos na mesma cidade (canal #BSB).
Assim que me mudei para São Paulo, joguei em uma lista de discussão sobre jogos de tabuleiro (um desses YahooGroups) que estava vindo para cá, e perguntei se poderia participar de algum grupo que jogava regularmente. Conhecia pouquíssimas pessoas na cidade, e logo na primeira semana recebi vários convites, e sou bastante amigo de vários dos companheiros de tabuleiro até hoje.
Chen argumenta que pela arquitetura das redes sociais dominantes hoje, esse tipo de situação, de relações online estabelecidas não por laços anteriores, mas por gostos em comum, está rareando.
Aqui no Brasil isso é bem observável, especialmente quando investigamos melhor a substituição do Orkut pelo Facebook em termos de rede social padrão. Havia amigos, fotos, scraps e fãs no Orkut, é verdade, mas boa parte do tempo das pessoas era gasto nas comunidades de interesse comum, onde discutíamos vários tópicos com completos estranhos (e ficávamos amigos de muitos deles).
Em vários sentidos, a rede de Mark Zuckerberg é a antítese do que os primeiros teóricos da rede imaginavam como potencial do que viria a ser a internet:
Para eles (os teóricos otimistas), a capacidade de nos comunicarmos com todo mundo, em qualquer lugar, da privacidade das nossas “cavernas eletrônicas” seria um boom para a interação entre humanos. O cientista J.C.R. Licklider previu a Internet em um artigo de 1968, com Robert W. Taylor, intitulado “O Computador como um dispositivo de comunicação”: ele imaginou que a comunicação no futuro seria feita em uma rede de “comunidades interativas online” mais ou menos ligadas umas as outras.
Mas ele também previu que “a vida será mais feliz para o indivíduo online, porque aquele com quem alguém interage de maneira mais forte será selecionado mais pelos interesses e objetivos em comum do que por acidentes de proximidade.”
A possibilidade de associação online com aqueles que achamos mais estimulantes levariam a ligações mais fortes e sinceras que as relações do “mundo real” determinadas por variáveis arbitrárias como proximidade física e classe social.
É claro que o Facebook não é o único culpado. Chen reclama (com razão) do exagero de alguns teóricos rabugentos recentes, pregando que amizade online não é amizade “verdadeira”, e da exploração por parte da mídia das amizades com pessoas de mentira na rede. Há até um seriado exatamente sobre isso na MTV americana, o Catfish, que foi zoado há duas semanas pelo Saturday Night Live:
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- Você é velho o suficiente para lembrar dos “IRContros”? Era algo que envergonhava os que se auto-intitulavam descolados, mas era o grande evento social de muitas pessoas mais tímidos, graças à internet. ↩
- O Vale-tudo do UOL Jogos ainda atrai bastante gente, que faz encontros periódicos, mas é basicamente dominado por adolescentes. Fóruns de nicho do Brasil, como o Fórum PCs ou o HTFórum, que já foram gigantes, hoje estão fechados ou totalmente largados. ↩
- O pessoal do 2Centavos, que mora em cidades diferentes, se conheceu através dos comentários do Gizmodo Brasil. Eu acompanhei uma reunião em carne-e-osso deles. =) ↩
Nota do Editor: este texto é uma edição revisada e levemente ampliada pelo autor de um texto originalmente publicado em seu blog.
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