Podemos olhar as caixas de comentários pela internet afora e vermos facilmente que a dificuldade de comunicação no que diz respeito à oposição e críticas é bem grande.
No entanto, esse não é um privilégio das plataformas online. Acontece nos mais variados ambientes. Em casa, em um jantar de família, com os amigos, com a namorada, esposa, etc. Alguém solta um comentário indevido, uma visão torta, algo constrangedor, agressivo. Ou você pode se deparar com uma falha de alguém próximo que gostaria de ajuda-lo a enxergar.
Uma vez que surge a necessidade ou ânsia de criticar, tem gente que sua frio, só de se imaginar fazendo um papel que pode ser visto como de “carrasco”. Por outro lado, há também aqueles que se sentem sempre na posição de apontar dedos e não vê os danos que podem resultar de uma ação irresponsavelmente dura.
Em qualquer conversa, por mais trivial que seja, esse acaba se tornando um dos momentos mais sensíveis: quando chegamos ao ponto de nos deparar com uma determinada posição ou visão que, por qualquer motivo, esteja fora dos nossos parâmetros de qualidade e pensemos ser danosa.
Diante da deixa, às vezes surge uma vontade irresistível de provar nosso ponto, pensamos ter o direito de ser sarcásticos, mostrar nossa superioridade intelectual e acabamos metendo os pés pelas mãos, prejudicando a exposição dos nossos argumentos, gerando fechamento no interlocutor e falhando, de um modo geral, em nos fazermos ouvidos.
“Ao conversar sobre qualquer assunto o que mais idealizamos, sem saber, é criar algum tipo de troca e escuta saudável. Ninguém quer um relacionamento truncado, aflitivo e cheio de problemas.
Muitas vezes não conseguimos e aumentamos o abismo psicológico entre nós e os outros.
Usamos termos agressivos, palavrões, ataques desproporcionais, acusações e trocas de argumentos falaciosos para chegar ao final de uma conversa com a sensação de soberania.
Basta reparar como as pessoas falam com suas mães, alvo usual de descarga emocional. O resultado de longo prazo é que depois de muito tempo de convívio já não sentimos aquela vibração ou conexão inicial estimulante.
A comunicação usual que estabelecemos é cheia de ruídos, vindos também de uma dificuldade pessoal em se abrir de forma vulnerável e em atingir a pessoa na necessidade delicada de ser apreciada.” –Fred Mattos no texto Comunicação não-violenta: o que é e como praticar
Como colocou Fábio Rodrigues no “Por que larguei o satanismo”, há várias outras formas de se posicionar que não a oposição ansiosa. Podemos ver iguais nos nossos oponentes, ignorar a ação danosa, enriquecer aquilo que parece benéfico ou aumentar o leque de possibilidades.
Porém, para o caso de não ser possível ou mesmo de você achar que a melhor forma de gerar benefício é realmente se posicionar como crítico ou oponente, Daniel Dennett sugere nos fazermos uma pergunta:
“Quão generoso você conseguiria ser ao criticar a visão de um oponente?”
Arthur Martine, em seu guia de 1866 (!) chamado The Art Of Conversation, aconselha um ajuste na motivação antes de entrar em contendas:
“Em disputas sobre pontos morais ou científicos, sempre faça do seu objetivo a verdade, não conquistar seu oponente. Então, você nunca estará perdendo ao falhar sua argumentação, e sim fazendo uma nova descoberta.” –Arthur Martine, em Art Of Conversation
Daniel Dennett oferece no livro o que chama de . Ou seja, um pequeno guia para enxergar o oponente de maneira rica, gerar abertura e também ser ouvido. Não para vencer a discussão, nem para se provar dono da razão, mas para gerar o maior benefício para as partes envolvidas.
“1. Você deve tentar re-expressar a posição do seu alvo de forma tão clara, vívida e justa que ele diga: ‘Obrigado, eu gostaria de ter colocado dessa maneira.’
2. Liste quaisquer pontos de concordância, especialmente se eles não são amplamente difundidos.
3. Mencione quaisquer aprendizados que teve com o seu alvo.
4. Só então você está apto a dizer uma palavra de criticismo ou contestação.”
Considero esse um guia bastante prático e direto, simples de se lembrar, mesmo em situações de bastante tensão. De uma certa maneira, já vi os passos acima operando em muitas das melhores inserções críticas com as quais pude ter contato e, quando eu próprio me vi sendo criticado dessa forma, me senti muito mais propenso a ouvir e pensar sobre a opinião do meu opositor.
Claro que há vários pontos para se adicionar, em especial no quarto item, sobre como efetivamente dizer as palavras de criticismo. Além disso, em muitos casos, pode ser que não haja a menor necessidade ou essa tática simplesmente não funcione, por realmente ser necessária uma ação enérgica.
Sabendo disso, podemos estender a conversa nos comentários e abordar juntos exceções e outras formas de ação.
E vocês, quais táticas usam para fazer melhores críticas e serem ouvidos?
Para se aprofundar:
- Por que larguei o satanismo
- Comunicação não-violenta: o que é e como praticar
- Sem palavras: fala de coração
- Ouvir além das palavras: o que é e como fazer
- Por que ironia e sarcasmo tendem a ser tão devastadores em conversas digitais
- How to Criticize with Kindness
- 37 Conversation Rules for Gentlemen from 1875
- The Art of Conversation
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