Entendendo Mário Fernandes

Mário Fernandes, um promissor e versátil lateral-direito de 21 anos, não quer jogar pela Seleção Brasileira de Futebol.

Por quê?

O fato ocorrido no início dessa semana pautou noticiários esportivos. O que levaria um jogador de futebol a dispensar o posto máximo de sua profissão? A pergunta, jamais respondida, foi feita centenas de vezes. E sempre focando no considerado vacilo do atleta. A mídia tratou – e trata – o assunto de modo tendencioso. Mário Fernandes, hoje, é considerado arrogante, covarde e irresponsável.

Ontem mesmo, quando a informação foi noticiada no telejornal de maior prestígio e audiência do país, a reportagem misturou-se com cenas de fãs histéricas com a chegada Neymar e Ronaldinho a Belém (PA). O cenário era perfeito para que Mário Fernandes fosse taxado de maluco por dispensar a Seleção Brasileira. Afinal, quem em sua sã consciência trocaria todos os holofotes e atenções da mídia por uma semana comum de treinos no clube?

Ninguém pensou no lado do jogador.

E ninguém dispensa uma Seleção Brasileira à toa.

"Até logo e obrigado pelos peixes"

É cômodo colocarmos todo o peso da culpa no jogador. Afinal, somos culturalmente acostumados com um estereótipo de atleta de futebol. Os que chamam a atenção devido atitudes que demonstram personalidade são considerados mascarados, como Leandro, Renato Gaúcho e Rogério Ceni. Jogadores, inclusive, queimados pela mídia e dentro da própria CBF por não respeitarem decisões da alta cúpula.

Leandro, por exemplo, ficou fora da Copa do Mundo de 1986 em soliedariedade a Renato Gaúcho, cortado do mundial por fugir de uma concentração. Ambos passaram longe das convocações depois desse fato. Já o goleiro Rogério Ceni, na Copa dos Confederações de 1997, negou entrar no grupo dos jogadores de cabeça raspada e ganhou antipatia dos colegas de seleção.

É sério isso.

O fato foi citado na biografia oficial do goleiro:

Meu quarto estava aberto. Sabia que mais cedo ou mais tarde chegaria a minha vez. E chegou. Júnior Baiano e Flávio Conceição, entre outros, entraram no meu quarto portando máquina e tesoura. Verbalmente, resisti quanto pude:
- Ó, o negócio é o seguinte: não quero raspar. Não tô a fim de brincadeira, não vou brigar, mas comigo, por favor, não!

Pessoas do time e da comissão técnica não gostaram da postura de Rogério Ceni. Acharam que ele deveria ter levado na brincadeira aquela história. Desde então, criou-se um mito que Ceni era queimado pelos colegas para não ser firmado na seleção.

Um mito bastante plausível.

Rogério Ceni: jogador de personalidade mais conhecido por ser "chato pra caralho"

Não se trata de julgar a decisão de Mário Fernandes como a mídia vem fazendo. Mas de julgar os dois lados.

Mário Fernandes tem todo o direito de dizer não ao Brasil. Ele fez parte do time no primeiro jogo. Conheceu o grupo, viveu a realidade e, aparentemente, não gostou.

Cabe ao brasileiro analisar os motivos para isso. O torcedor não deve se deixar levar pelas imagens de glamour da Seleção Brasileira vendidas pela mídia. A atual Seleção Brasileira, por meio de sua Comissão Técnica admiradora de jogadores do Shakhtar Donetsk, vem demonstrando ser um reflexo da Confederação Brasileira de Futebol.

A podridão do escritório da Barra da Tijuca está chegando na Granja Comari.

Mas a pauta do Jornal Nacional é a faixa com o nome de Neymar na testa de pré-adolescentes em Belém (PA).


publicado em 27 de Setembro de 2011, 10:59
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Fred Fagundes

Fred Fagundes é gremista, gaúcho e bagual reprodutor. Já foi office boy, operador de CPD e diagramador de jornal. Considera futebol cultura. É maragato, jornalista e dono das melhores vagas em estacionamentos. Autor do "Top10Basf". Twitter: @fagundes.


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