Link YouTube | “Mama. Pega no meu grelo e mama. Me chama de piranha na cama. Minha xota quer gozar, quero dar, quero te dar”

No pensamento da sociedade ocidental, o sexo é tabu faz séculos. Vale lembrar que a scientia sexualis (salve Foucault) nos ensinou, em uma pedagogia bastante eficaz, que falar de sexo era proibido, visando assegurar um vigor físico e uma pureza moral. Isso, para mulher, se instaurou de maneira muito mais marcante ainda no século XIX. Esse “tabu”, o entrave em relação à livre falácia sobre os prazeres sexuais foi construído culturalmente, bem como tudo que envolve produção de sentido em um dado estrato social.

Sabe aquele dado de que “a história é contada pelos que venceram”? Pois é, poderíamos dizer que a “alta cultura” venceu e, junto com ela, diversos preceitos morais advindos do projeto de modernidade, que ainda povoam, e muito, o juízo de valor feito pelo senso comum? A arte criou ares e lugares de distinção, discriminação.

Juntando a proibição de se falar de sexo (o que data do século XIX, meu amigo) com a cultura da periferia (dos funkeiros), mais a opressão que a mulher viveu durante muito tempo em relação ao seu corpo e sua própria sexualidade, vemos um massacre “culturocêntrico” e moralista que parece não precisar de argumento algum para fazer sentido. Simplesmente é feio falar de sexo explicitamente e isso corromperá profundamente nossos filhos. Sexo? Corromper? Ah, claro, o grande problema é a promiscuidade.

Os pais se perguntam, “que será dessa geração que tem tudo tão explícito, tão solto, tão líquido e fugaz? Não seria um correlato meio torto da geração que aprendeu que a masturbação era doença e falar de sexo era proibido?”. A grande questão é que também foi essa construção histórica que nos ensinou que existia o público e o privado e alguns assuntos não deveriam ser tratados assim, à vista de todos. Para isso, existiam os lugares adequados. No entanto, hoje, as fronteiras estão borradas entre essas duas instâncias, mas o julgamento continua o mesmo.

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O sexo: fazemos, falamos (com grande dificuldade) e, no entanto, não podemos ousar colocá-lo em um lugar de produção de sentido e conformador da cultura. Aí ele é categorizado como perversão. E a liberdade de expressão esbarra no sexo, numa realidade onde ofender e bradar aos quatro ventos o seu preconceito contra homossexuais e negros é defendido por muitos como “direito de livre expressão”, contraditoriamente, falar de sexo explicitamente é motivo de “pouca vergonha” e, claro, se for mulher, é puta e não se dá valor.

No entanto, todos esses lugares comuns que insistem em manter a mulher como um ser inócuo e manter o assunto sexo entre quatro paredes (ou dentro de um consultório médico, assim como no século XIX), não se renovam para compreender que o movimento de empoderamento do corpo (e toda a problematização que esse conceito traz) é um dado muito mais complexo que uma moral pré estabelecida possa explicar ou definir.

Então, dá licença, prazer, sou mulher e, sim, eu tenho um grelo.

Nayara Barreto é jornalista formada em Estudos de Mídia pela UFF e mestranda em comunicação e cultura pela mesma instituição. Estuda pornografia, nudez e feminismo. É autora do <a>O viajante e sua sombra</a>."