Uma história de preconceito, indiferença, superação e humor

Conheça o caso desse sujeito que teve que superar diversas dificuldades na vida até se tornar o que conhecemos dele hoje

Eu nasci em 1987, em Diadema, no ABCD Paulista.

Meu pai conseguiu juntar uma certa grana e decidiu que era a hora de me colocar no mundo. Ele não tinha dúvidas de que minha vida seria muito difícil, mas ele se comprometeu a me dar tudo que fosse necessário para que eu pudesse conquistar meu próprio espaço.

No primeiro ano de vida, já encarei uma batalha daquelas. Eu queria fazer algo diferente, sentia que tinha nascido pra mudar as coisas e meu pai teve que enfrentar uma batalha na justiça pra conseguir derrubar uma lei que impedia o meu desenvolvimento pleno. 

Mesmo com a vitória e com meus direitos assegurados, eu ainda tinha que encarar o preconceito. O seu preconceito. E – devo admitir – essa foi minha luta mais difícil.

Podendo me reconhecer com um igual, vocês continuaram me desvalorizando, debochando. Fui alvo de chacotas, amargurei o ostracismo, flertei com o anonimato, parecia destinado a ser o patinho feio da família pra sempre.

Tentando conquistar espaço, conquistar você, me submeti a todo tipo de situação. Comecei de baixo. Tão baixo que eu até me envergonho de ter me rebaixado tanto por você. Para ter sucesso fiz apresentações esporádicas em restaurantes, virei brinde nas pizzarias, fui incluído em pacotões nas padarias. Até para poder entrar no supermercado era difícil. Na sua casa, então, impossível.

Se eu fazia um amigo qualquer, logo você olhava pra ele com desdém também. Se alguém me levava numa festa, você reclamava, xingava, fazia todo mundo me deixar de lado. Isso pra não dizer quantas vezes você me enganou. Me chamou pra brincar, fez eu me esconder de baixo da mesa e me deixou lá até a festa acabar e todo mundo ir embora.

Não desanimei. Expandi meus horizontes. Saí de casa e fui procurar alguém que gostasse de mim longe desse lugar. Fui pro interior de São Paulo, pro Rio de Janeiro, até pra Amazônia. Enquanto isso, você ainda ria de mim.

Foi então que eu finalmente descobri o caminho pro sucesso: as crianças. Essas criaturas inocentes que vieram ao mundo sem o preconceito que você carrega. Foram elas que me acolheram. Foi delas que eu resolvi me aproximar. Vivi pra ver o seu desespero quando seu filho pedia pra você deixar eu entrar na sua casa. Quebrei todas as expectativas e fui parar na televisão. Aí veio o seu golpe mais baixo.

Lá em meados de 2007/2008 você falou que eu era coisa do diabo. Que eu tinha ligação com o capeta e até que eu era o próprio anticristo. Você foi longe, longe demais nessa tentativa de me ignorar, de me varrer pra baixo do tapete, de falar pra todo mundo que eu não tinha espaço na sua vida.

Mas eu continuei sem desistir. Nessa fase, eu já me sentia mais confiante e resolvi jogar o seu jogo, me dediquei a explorar os seus pontos fracos. Comecei com o dia das crianças, a Páscoa, o dia das mães, o dia dos pais. Nessas datas eu sempre vinha com tudo e me fazia impossível de ser ignorado. Você pode até nunca ter comprado um dos meus produtos, mas eu com certeza já fiquei horas, dias, semanas na sua cabeça.

Comecei a emplacar mensagens que você não tinha como negar ou ir contra e finalmente encontrei pessoas que gostavam de mim, de verdade. Essas pessoas gostavam do que eu tinha pra dizer e de como eu dizia essas coisas, foi aí que elas começaram a reproduzir minhas mensagens e eu me transformei num verdadeiro fenômeno.

Veio a crise e você finalmente olhou pra mim, né? Meus primos, esnobes como sempre, continuaram se valorizando, se valorizando e você se viu sem saída a não ser me dar uma chance. Eu sei que se você tivesse outra opção não faria isso, mas eu não me importo. Eu venci.

Só sei que agora eu resolvi me dar o valor também e estou ouvindo todos vocês reclamarem, chorarem, esperniarem pra eu voltar a ser o que era antes. Agora que vocês se assustaram com a possibilidade de ficarem pra sempre sem mim, bateu o desespero. Vocês gostaram tanto da minha presença que torcem por mim, vibram por mim, querem me ver brilhar acima de tudo e de todos.

Bom, eu não posso garantir que vou voltar - até porque isso não depende só de mim, mas confesso que estou me deliciando de ver essa repercussão toda.

Quem sou eu?

Eu sou o Dollynho, seu amiguinho.

* * *

A Dolly, criada em 1987, em Diadema, foi a primeira marca brasileira que produziu e vendeu refrigerante diet. Na época, a empresa entrou com uma ação na justiça pedindo a revogação de uma lei de 1973 que impedia a produção desse tipo de bebidas.

Depois disso, a empresa foi se consolidando e enfrentando muito preconceito, mas acabou conquistando fãs e caiu nas graças de uma boa parcela do mercado por conta de seu preço mais acessível e das propagandas irreverentes que sempre tinham o Dollynho – um personagem criado pela marca, com formato de garrafa pet – como protagonista.

Porém, essa semana, a Dolly lançou um comercial onde o mascote não aparece mais em destaque, tampouco tem narração infantil e animações 3D simples, como acontecia antes.

A mudança de posicionamento da marca em suas propagandas poderia ser considerada um avanço, mas acabou gerando a revolta de muitos consumidores e entusiastas. Se foi só de brincadeira ou não? Tire suas próprias conclusões.

Link Youtube - Esse é novo comercial da Dolly

Link Youtube - Agora veja como era o comercial antes, aclamado pelo público.

A internet obviamente não perdoou e começou a bagunça.
O post original no Facebook já tem quase 3000 comentários e 1500 compartilhamentos.
No Twitter também rolou repercussão e a #VoltaDollynho entrou nos Trending Topics do Brasil.

A Fan Page derivada do personagem "Dicas Dollynho" inclusive fez um post reclamando do novo comercial e exigindo o retorno do mascote.

E aí? #VoltaDollynho?


publicado em 12 de Fevereiro de 2016, 00:00
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Breno França

Editor do PapodeHomem, é formado em jornalismo pela ECA-USP onde administrou a Jornalismo Júnior, organizou campeonatos da ECAtlética e presidiu o JUCA. Siga ele no Facebook e comente Brenão.


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