Djokovic vence Roland Garros e prova que, no esporte como na vida, bom humor te leva mais longe | Mais que um jogo #4

Tenista sérvio número 1 do mundo conquista o último título que lhe faltava e chega ao auge com o mesmo bom humor do começo da carreira

A gente dá uma corridinha no final de semana e sente as dores até quarta-feira. A gente se atreve a jogar futebol uma vez por semana com os amigos e no segundo contra-ataque já sente a velha contusão na panturrilha. Começa a fazer natação duas vezes por semana e não aguenta nem subir as escadas pro apartamento no terceiro andar. Troca o ciclo do treino na academia e reclama mais de dores do que sua avó no almoço de domingo.

Quem já tentou começar uma atividade física sabe o quanto é difícil encarar a rotina e superar as dores. Quem já passou perto de uma dessas situações deve imaginar o quanto é difícil ser um atleta profissional.

Nós, meros mortais, vivemos ouvindo das pessoas que temos que praticar mais exercícios, ter uma rotina saudável e que o esporte é o segredo para viver mais e melhor. E no nosso caso, é mesmo. Mas não se engane: esporte profissional, desses que a gente vê na televisão e tenta imitar, não tem nada a ver com isso.

Pelo contrário. Esporte profissional é dor e sofrimento intermitentes. Ser atleta poderia ser definido sem grandes prejuízos ao sentido completo por "aprender a conviver com as dores constantes". Ser atleta é encarar uma rotina bizarra de treinamentos, ser disciplinado em todas as vertentes da vida sob risco de prejuízo no rendimento e ainda estar sempre no limite de lesões que podem, em maior ou menor grau, encerrar a sua carreira, o seu sonho, a sua vida profissional de uma hora pra outra. Basta um passo em falso e tchau tchau.

Agora, devemos admitir que existem esportes e esportes. Alguns mais exigentes em determinados aspectos, outros em outros. Porém, quase todo mundo é capaz de reconhecer que o tênis é uma das modalidades mais exigentes e desgastantes que existem.

Eu que sou oriundo da natação reconheço várias loucuras que atletas são capazes de fazer, mas tem uma que eu nunca fui capaz de superar. O que diabos passa na cabeça das pessoas que praticam uma modalidade que pode simplesmente não acabar nunca?

Esportes que não têm limite de tempo ou distância, geralmente têm regulamentos que pedem que um adversário abra uma vantagem mínima sobre o outro e, enquanto isso não acontece, o jogo simplesmente não acaba. No beisebol, no vôlei, vá lá... você faz parte de um time. Além dos intervalos previstos, o esporte coletivo te permite um certo revezamento de descanso. Mas sinceramente o que leva alguém a cogitar a hipótese de jogar tênis?

Ok, estou forçando a barra. Eu mesmo já me arrisquei a pegar uma raquete e uma bolinha e amigos de verdade poderão atestar o dia em que eu joguei e ganhei uma partida de tênis (segue foto de um dia distante de 2013 onde fui pinçado para completar a dupla num glamouroso confronto contra calouros do IME pelo Bichusp, o campeonato de bichos da USP).

Reparem como eu estava com o calçado adequado para a prática plena da modalidade em questão

Mas tal recurso do exagero só foi empregado por mim para mostrar o quanto essa modalidade em específico é ridiculamente desgastante. Sem muitas pesquisas podemos encontrar exemplos de partidas de até 11 horas de duração.

Diante de tanto, resta a dúvida, se o tênis é esse esporte tão cruel e cansativo, o que faz um atleta topar encarar e como ele consegue suportar a dura rotina de preparação para modalidades como essa?

Para responder a questão, vamos introduzir nessa história ninguém menos do que o melhor jogador de tênis do mundo. Com vocês, Novak Djokovic.

O melhor do mundo no mundo hoje

Este cara conquistou tudo que um tenista poderia imaginar com uma receita simples: bom humor

Novak Djokovic nasceu em 22 de maio de 1987, em Belgrado, na Iugoslávia, atual Sérvia. Começou a jogar tênis aos quatro anos de idade (1991), se tornou jogador profissional aos 16 (2003) e alcançou o topo do ranking mundial pela primeira vez aos 24 (2011).

Depois de chegar lá pela primeira, Djoko oscilou, voltou a liderar entre 2012 e 2013, caiu algumas posições e assumiu a liderança em 7 de julho de 2014, de onde não saiu mais. Ou seja, há quase dois anos, todos no mundo do tênis querem estar onde esse cara está.

No processo, o tenista sérvio bateu/estabeleceu alguns recordes:

  • o primeiro (e único) jogador da história do tênis a superar a marca de US$ 100 milhões acumulados em faturamento com premiação por performance em quadra.
  • o terceiro maior ganhador, em atividade, de torneios de simples na Era Aberta, com 65 títulos.
  • o quarto maior vencedor de partidas de simples na Era Aberta, com 730 vitórias e o segundo mais novo a superar as 700 vitórias.
  • o melhor jogador da história de torneios em quadras dura, com 49 títulos e 84,3% de vitórias.
  • o quinto tenista que mais tempo ocupou o topo do ranking mundial na história (203 semanas).
  • detentor da quinta maior sequência consecutiva no topo do ranking mundial (102 semanas).
  • melhor percentual de vitórias na carreira da história: 730 vitórias x 149 derrotas, 82,91% de aproveitamento.
  • o terceiro maior ganhador de Grand Slams da história, com 12 títulos.
  • maior ganhador de torneios ATP Masters 1000, com 29 títulos.

Mas no último final de semana, não satisfeito, Djoko conseguiu conquistar algo ainda inédito na sua carreira e estabelecer alguns novos recordes. Com a vitória por 3 sets a 1 sobre o britânico Andy Murray, o tenista conquistou pela primeira vez o renomado torneio de Roland Garros, o último torneio que lhe faltava. Depois de ser derrotado em três finais anteriores, o sérvio finalmente venceu na quadra de terra do Grand Slam francês.

Dessa forma, Djokovic finalmente venceu os quatro principais torneios do circuito mundial de tênis. Ele é apenas o oitavo homem no mundo a conseguir tal feito (e o segundo mais velho). De quebra, com os resultados recentes, se tornou o terceiro homem na história e o primeiro europeu a conquistar os quatro principais torneios de forma consecutiva.

Uma pitada de bom humor e a vida fica mais leve

Mas chegando e ficando a bandeira no que podemos chamar de topo do tênis mundial, Djoko deu mais uma demonstração de como e porque chegou onde chegou. Com humildade e bom humor, dividiu o grande momento que vivia e fez questão de homenagear um outro jogador que você talvez conheça: Gustavo Kuerten, o Guga.

Guga, tricampeão de Roland Garros, desenhou um coração na quadra e deitou no meio

Depois de uma recente reaproximação, o tenista número 1 do mundo perguntou ao brasileiro se, caso fosse campeão no domingo, poderia repetir o gesto marcante de desenhar um coração na quadra francesa. O brasileiro autorizou. O sérvio ganhou. E os fãs do mundo inteiro puderam presenciar um dos momentos mais belos do esporte no ano. E olha que vem Olimpíadas por aí.

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Mas não foi a primeira vez que Djokovic imitou Guga. Tampouco Guga foi o primeiro a ser imitado por Djokovic. O sérvio não se deu ao direito de ser bem humorado apenas no auge, construiu sua carreira e todos os recordes que já citamos em meio a momentos como esse.

Djokovic já imitou Maria Sharapova, Rafael Nadal, Guga em outros momentos (nenhum deles se ofendeu, ok?) e também demonstrou bom humor em programas de TV, campanhas de marketing, campanhas de caridade, no sol, na chuva e mesmo quando teve seus erros apontados e foi criticado.

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Nesses momentos, o tenista sérvio poderia ter sido ranzinza, sisudo, protocolar. Poderia ter reagido mal ou menosprezado críticos e adversários, mas a maneira leve com que Djokovic resolveu encarar a dura missão de ser um atleta, um tenista, o líder de sua modalidade, não só fez com que mais pessoas gostassem dele, seguissem ele, se inspirassem nele como também fez com que ele mesmo chegasse mais longe.

Dessa forma, Djokovic superou a antipatia que muitos fãs de tênis tinham por ele. Em grande parte, porque Djoko começou a se destacar justamente quando Federer e Nadal – dois queridinhos do circuito – estavam no auge. Hoje, Djoko nos prova que manter o bom humor, mesmo nas adversidades, é a melhor forma de superá-las.

Novak Djokovic imitando Guga em passagem pelo Brasil.
Djokovic usando peruca (novamente) para imitar Sharapova.
Dessa vez ele abriu mão da peruca, mas usou todos os recursos possíveis para imitar Nadal.
Djokovic volta a colocar peruca, dessa vez por campanha de caridade.
Djoko convida boleiro para sentar com ele e conversar antes de partida começar.
Djokovic se ajoelha e come grama após ser tricampeão em Wimbledon.

Link Youtube - Djoko dançando Gangnam Style

* * *

A 'Mais que um Jogo' é uma série nova do PdH que depende da sua colaboração. Nossa intenção é reunir boas histórias que permeiam ou se aproximam do esporte, mas que o extrapolam e oferecem doses de esperança e lições de superação para todos nós. Foram anos batendo cabeça para encontrar um fórmula perfeita. Meses fazendo tentativas e testes do que rodava melhor. Semanas matutando o que finalmente poderíamos fazer. E uma única noite para decidir que agora é a hora. Chegamos a conclusão que nesse caso, assim como em quase todos os outros, ou a gente coloca as coisas pra funcionar mesmo sem ter certeza de que vai dar certo ou simplesmente as coisas nunca acontecem.

Porém, para que tudo funcione bem, mais do que nunca estamos interessados em ouvir o que vocês têm a dizer. O que vocês têm de diferente para nos contar. Precisamos disso. E eu como caseiro e curandeiro desse nosso novo filhote, estarei mais atento do que nunca às críticas e sugestões que vierem.

Por isso cada caixa de comentários dessa série é também uma caixa de sugestões e o meu email breno@papodehomem.com.br está mais aberto do que nunca para recebê-los.


publicado em 07 de Junho de 2016, 00:05
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Breno França

Editor do PapodeHomem, é formado em jornalismo pela ECA-USP onde administrou a Jornalismo Júnior, organizou campeonatos da ECAtlética e presidiu o JUCA. Siga ele no Facebook e comente Brenão.


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