Dinheiro, amor, fama e beleza: onde encontrar liberdade

Muitas pessoas parecem buscar a liberdade pessoal usando caminhos concretos, como se fossem obstáculos materiais que a impedissem de caminhar.

Particularmente, essa me parece uma solução simplista para uma questão importante da existência humana e, portanto, pouco satisfatória e conclusiva.

Quando imaginam que o dinheiro seria uma via de liberdade tratam as privações da pobreza, que são reais, como um total inviabilizador. Se a pobreza restringe, então, conforme esse raciocínio, a riqueza liberta. No entanto, depois de atravessada uma faixa de crescimento financeiro, várias pessoas não se relatam especialmente mais felizes ou livres. Então, o dinheiro não parece oferecer a sensação de libertação almejada, a não ser para quem não o possui e fantasia em tê-lo aos montes.

Outros imaginam que a companhia da pessoa amada, de filhos e de amigos daria a sensação de pertencimento e completude que libertariam do mal-estar da solidão e da inadequação. No entanto, mesmo cercadas de pessoas amadas muitos não conseguem respirar e se debatem aflitos com suas prisões emocionais.

Há também aqueles que, por torcerem o nariz para essas realidades externas, imaginam um mundo ideal e melhorado, livre de cobiça, ganância, inveja, egoísmo, propriedade privada, capitalismo ou qualquer signo de privilégio. Mas mesmo pessoas que resolveram cultivar uma vida que dispensa ao máximo esses códigos também não se ajustam plenamente e sua inquietude por arrebanhar o máximo de seguidores não os deixa em paz.

Nem dinheiro, amor, fama, beleza, sucesso ou beatitude conseguem responder definitivamente o anseio por uma vida mais livre e desimpedida.

"Se eu for bonito e rico como o Beckham, serei mais livre?"
"Se eu for bonito e rico como o Beckham, serei mais livre?"

 

Ninguém consegue responder de forma adequada a esse impasse porque buscam a solução em lugares ilusórios. A liberdade e aprisionamento são sensações internas, fruto de uma concessão ou restrição criada pela própria mente em relação a uma vida mais fluida ou bloqueada.

A liberdade parece ter um saber de permissão interna, de quem se sente em paz com uma escolha sem ficar se debatendo se ela foi adequada ou não, correta ou errada, um tipo de autorização pessoal para gozar minuto a minuto cada escolha e não-escolha feita.

Então, por que essa sensação parece tão custosa? Porque, de modo geral, não temos nenhuma oposição a um ditador interno que está sempre forçando nosso olhar numa direção fixa: o desejo.

Ele, o desejo, tem uma qualidade obstinada que faz perder a liberdade em relação ao que não faz parte de seu escopo. O que impede uma pessoa de fazer uma dieta é a imposição do desejo e uma permissividade pessoal a ele. É como se ele fosse um tirano que mal questionamos. Basta que ele surja e logo corremos a atender, sem nenhuma tentativa verdadeira de resistir, restringir ou deixar passar. Agimos como filhos domesticados por um pai autoritário. Como cordeiros cedemos e colocamos o doce na boca como quem não fosse capaz de dizer não.

Dizer não para certos desejos é um caminho de liberdade que poucos trilham e por isso saem de um desejo e caem em outro. De um doce para uma meta profissional e desta para uma viagem, e ainda para uma grande meta que não tem parada. Vivemos como mulas chicoteadas pelos nossos desejos e incapazes de dialogar com nossas vontades internas.

A liberdade, mais do que uma estrada desimpedida à frente parece ser uma habilidade de não ser arrastado compulsoriamente de um imperativo para outro. Talvez, no sacrifício (palavra vista com desprezo na cultura hedonista moderna) exista uma dimensão de liberdade.

Jesus ser tentado pelo demônio no deserto, ou Buda por Mara em sua tentativa de iluminação, representam arquétipos desse tipo de liberdade transpessoal. Ao não se escravizar pelos seus desejos terá menos chances de ser coagido por contextos ruins, pessoas manipuladoras, pela mídia ou por iscas materiais e ideológicas que prometem um paraíso na terra ou no céu.

O desejo em si não é o inimigo – motivo pelo qual ninguém precisa ser um faquir existencial. Mas sim a tendência a envergar a própria vontade e ação a cada vez que ele surge, sem questionamento, contemplação e lucidez.

A serenidade perante os próprios desejos (sem condenação ou deleite) está mais perto de ser uma chave-mestra para o caminho da libertação. O desafio, portanto, está em aprender a relaxar diante do mundo interno (mascarado de realidade externa) e assim ganhar proficiência nas manobras sutis diante de si.

Parar, contemplar, refletir seriamente e então dirigir a si mesmo soam como boas pistas para essa jornada.


publicado em 26 de Outubro de 2014, 07:30
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Frederico Mattos

Sonhador, psicólogo provocador, é autor do Sobre a vida e dos livros Relacionamento para Leigos" e "Como se libertar do ex". Adora contar e ouvir histórias de vida no instagram @fredmattos. Nas demais horas cultiva a felicidade, é pai de Nina e oferece treinamentos online em Fredflix.


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