A discussão sobre o “tamanho é documento”, não é novidade, mas ainda não ficou velha. A pulga atrás da orelha ainda perturba homens de diferentes idades e tamanhos. Pensei umas três vezes antes de fazer esse texto, até porque ninguém aguenta mais notícias do tipo “tamanho é documento?”, “saiba qual é média de tamanho do pênis”, etc.

No geral, se conclui que não é tão importante assim, que às vezes faz diferença, às vezes não. Amigas e amigos, defendem que o falo médio costuma ser mais gostoso que o grande. Nos fóruns na internet, há quem bata o pé que ‘maior é melhor’, mas outros milhares dizem que o pau grande é superestimado. Inclusive, estudos mostram que se as mulheres pudessem escolher um pênis ideal, escolheriam um de 16 centímetros e não os cultuados 20 cm do pornô.  

Eu achei que valeria a pena escrever sobre isso porque, se por um lado, há anos que se fala sobre, por outro, o tema ainda cutuca a autoestima de homens. Daqueles que mesmo que não estejam insatisfeitos com seus pênis, se questionam se não seria melhor ter alguns centímetros a mais; daqueles que se veem distante do padrão mais “desejável”; dos homens trans, das pessoas intersex…

É importante acabar com a supremacia do pau enorme, fazer com que mais homens se sintam bem consigo mesmos. No entanto, estive pensando que parar de vangloriar o pau grande porque o médio seria melhor também não funciona muito bem. Seria como transferir a coroa mas manter a mesma organização da supremacia. Por mais que o pau médio contemple mais pessoas, ainda assim estamos valorizando um padrão que deixa outras pessoas de fora. E qual é o sentido da gente permitir que o falo e que a ereção sejam responsáveis por assinar atestados de “normalidade” ou “funcionalidade”, excluindo outras possibilidades tão ricas.

Mas já que estamos aqui falando de tamanho, não queria especular sobre as vantagens ou desvantagens do pênis maior e mais largo ou do médio, ou do pequeno, do inexistente. Não. Acredito que seria melhor pensar na raiz, afinal, porque o tamanho causa insegurança? Porque é importante falarmos sobre isso?

Gostaria de propor alguns pensamentos pra gente conseguir – aos poucos – superar os complexos sobre o tamanho de pau, sem precisar se apoiar em um outro modelo ideal. Primeiro, é sempre importante a gente tentar identificar os motivos mais profundos que fazem isso ser um assunto tão importante.

No fundo, porque queremos um pau maior?

Cada um vai ter sua própria resposta para isso, mas podemos pensar em algumas respostas gerais que se misturam e se combinam de pessoa para pessoa.

Medo de não ser desejado

Não é diretamente sobre não dar prazer às outras pessoas, mas é umas insegurança sutil sobre o quanto o próprio pênis é ou pode ser um objeto de desejo para as outras pessoas. É um medo sobre ser preterido antes mesmo de ter uma chance de se provar, de provar que tem potencial para agradar e satisfazer.

Vontade dar mais prazer para a/o parceira/o

A vontade de dar mais prazer geralmente vem acompanhada do pensamento de que um pau um pouco maior sempre potencializaria a sensação e o prazer do/a parceiro/a. Por mais que os parceiros destas pessoas se digam satisfeitos, soa sempre como um consolo, como um “eu estou satisfeita/o APESAR do tamanho do seu pênis”. E quem ouve chega a conclusão de que, mesmo que o parceiro se diga satisfeito, ele estaria mais satisfeito com um pouco mais de pau.

Insegurança de ser trocado

É o medo de que, mesmo que se esteja dando prazer, pode vir alguém com um pênis maior, com essa cereja em cima do bolo, que completa o sexo e satisfaz sem nenhum “apesar”. Essa insegurança também mete medo porque, teoricamente, não depende da vontade de ninguém. Não é como se o cara com o tamanho menor pudesse caprichar mais no oral pra compensar, porque quando aparecer alguém que capriche igual e que ainda tenha um pau maior, não há como competir.

A questão estética

Nesse caso, as inseguranças não atingem tanto as relações. Desejar um pau maior por estética seria aquele desejo de corresponder ao padrão, de pertencer ao topo da pirâmide, ao grupo dos mais desejados, de poder usar sunga sem vergonha, é o desejo de não ser alvo de piadinhas nos vestiários.

Leia também  Como lidar com a expectativa masculina em relação à liberdade sexual feminina? | Mentoria PdH #49

Que tipos de compreensões podem fazer com que isso seja um incômodo menor?

1) Atingir o tamanho desejado não necessariamente significa ficar satisfeito.

Se tem uma coisa que os realities de cirurgia plástica podem nos ensinar é que nunca é o suficiente. As histórias são sempre as mesmas: “eu sou inseguro por causa do (insira aqui seu “defeito”), isso atrapalha minha vida, e eu seria mais confiante e feliz se eu tivesse (insira aqui seu “desejo”). Acontece que a cirurgia costuma resolver o problema por um tempo, e logo surge outro. Se o nariz incomodava, agora serão as orelhas.

O padrão muda com o passar dos anos e, mais do que isso, o critério de cada um sobre o que é pertencer ao padrão também muda. “Nunca é o suficiente” disse, com muita razão, um dos médicos do reality. Nunca será o suficiente, enquanto a nossa solução para a insegurança for “corresponder ao padrão”. Corresponder demanda um gasto imenso de tempo, de dinheiro e de saúde, e o padrão simplesmente não é alcançável porque ele é múltiplo, está em constante mutação e só é perfeito visto de longe.

O que faz a gente se incomodar com o físico, é algo que parte de dentro da gente. É uma vontade de ser melhor, de ser mais desejado. Mas se mudar por fora nunca vai ser o suficiente, a única saída é olhar para dentro, entender o porque essa parte física se mostra tão importante e, então, passar reconstruir o de dentro e não o de fora. 

2) Precisamos entender a perda e aprender a lidar com ela

Se a vontade de ter o pênis maior, ou de dar mais prazer, tem algum pezinho no medo da perda, a gente precisa aprender a abrir mão do controle. Isso é uma dificuldade da humanidade inteira. Abrir mão do controle é entender que a gente não deve sofrer por aquilo que a gente não pode controlar. É aprender a encarar o que está por vir com uma certa serenidade.

As pessoas que se vão, que passam para outros relacionamentos, nunca o fazem só por causa de centímetros de pau, da mesma maneira, não são alguns centímetros a mais que vão fazê-las ficar. Precisamos olhar mais profundamente, acreditar que uma parceira foi perdida por conta de pau, é simplificar demais as coisas, é não querer ver os reais motivos. Se olharmos com carinho para a situação, é possível compreender muitos dos fatores que contribuíram para a perda e, então, encarar com tranquilidade que não se pode controlar as relações e que todos tem seu momento e seus motivos para partir.

3) O tamanho não define e nunca vai definir o prazer porque não é possível separar as coisas

O prazer é algo que se produz entre pessoas e que tem a ver com o toque, mas também com o clima, e com a disposição destas pessoas. Não dá para separar porque não existe prazer sem desejo e não existe desejo sem todas as coisas que acontecem na nossa cabeça.

Falar que o prazer vai além do físico, não é uma justificativa para consolar os menos “avantajados”, é uma afirmação para fazer com que mudemos nossa maneira de encarar o sexo.

Proposição final: A diferença é construtiva

Muitas vezes, o desejo de um pau maior vem acompanhado de uma vontade de ter mais possibilidades: ainda que se possa recorrer às preliminares, sexo oral, masturbação, mantém-se a vontade de ter um pênis que, supostamente, dê prazer por si só e que também permite executar mais posições, etc.

Mas será que corresponder ao padrão desejável realmente abre possibilidades? Ou será que é o contrário? Me parece que corresponder ao padrão pode significar prender-se a ele, se limitar no conforto de ter todas as possibilidades em sua mão sem realmente explorá-las.

Não é justamente quando precisamos sair das áreas de conforto, que acabamos descobrindo coisas novas? Não seria justamente a diferença de circunstâncias o que faz cada um ter habilidades mais desenvolvidas nisso ou naquilo?

A proposta final é deixar de tentar encaixar o nosso físico em parâmetros “normais” ou “mais desejáveis” e começar a valorizar as pequenas diferenças, as características e habilidades únicas, concentrando energia na produção de prazeres dos mais variados, intensos e únicos.

E aí, estamos prontos pra tentar?

Vejo vocês nos comentários!

Gabriella Feola

Editora do Papo de Homem e autora do livro <a href="https://www.amazon.com.br/Amulherar-se-repert%C3%B3rio-constru%C3%A7%C3%A3o-sexualidade-feminina-ebook/dp/B07GBSNST1">Amulherar-se" </a>. Atualmente também sou mestranda da ECA USP