Ao longo dos últimos anos vim traçando um caminho próprio, uma estrada pessoal cheia de incertezas e riscos. Durante este percurso escrevi sobre como pedi demissão, como tenho lidado com meus medos e, até mesmo, um guia, explicando um pouco de como orquestrei tudo isso, utilizando uma abordagem bem pé no chão, longe de fantasias e riscos desnecessários.
É muito difícil dizer às pessoas como devem seguir suas vidas, pois com muita facilidade aplicaremos aos outros pesos diferentes do que aplicaríamos a nós mesmos.
Aos outros, é simples apontar como seria a melhor solução. Para nós, outros elementos se apresentam, desculpas e contratempos são bem mais fáceis de serem identificados e aceitos. Por isso, acredito que posso apenas mostrar como faço e, a partir disso, deixar que outras pessoas vejam se meu caminho apresenta sentido dentro de suas próprias perspectivas.
Ressalva feita, uma das ferramentas que venho usando para me guiar é um conceito herdado do mundo dos investimentos, o chamado “Barbell Strategy” ou Estratégia do Halter (peso de academia, sabe?).
Apesar desse modelo de distribuição bimodal ser bem antigo, o uso e aplicação dessa ferramenta para os elementos da vida me foi apresentado pelo estatístico, acadêmico e – talvez – filosofo, Nassim Nicholas Taleb, em seu livro Antifrágil.
Imagine uma barra para pesos de academia onde você posiciona os pesos nas extremidades, mas sem nada no meio para te atrapalhar. Essa é a visualização do que pressupõe a estratégia do Halter.
Taleb utiliza a noção de dois territórios imaginários para situar os leitores e facilitar a ambientação da ideia.
O Extremistão é o país onde grandes riscos são assumidos, partindo do entendimento que grandes resultados positivos só são possíveis em situações onde existem grandes – e frequentes – riscos.
O outro território é chamado de Mediocristão, onde os riscos são completamente evitados e, com isso, nenhuma grande recompensa pode ser encontrada.
No halter, Extremistão são as extremidades onde ficam os pesos, Mediocristão é o meio, onde não vai peso.
Nota: para entender melhor a relação entre evitar riscos e seus reflexos negativos, leia meu texto sobre intervencionismo ingênuo.
A estratégia do Halter é um fruto típico do Extremistão, partindo do pressuposto que assumir grandes riscos podem gerar grandes benefícios, mas compreendendo que os possíveis danos não podem ser fatais, você precisa ser capaz de se recuperar após um trauma. Como num treino de academia, levantamos pesos a ponto de lesionar os músculos parcialmente, tornando-se mais forte como resultado da recuperação.
Imaginando uma barra de pesos, de um lado temos uma grande anilha que representa 10% da recompensa, mas 90% de chances de sucesso. É a aplicação segura, com pouquíssimas chances de dar errado, mas que traz uma recompensa proporcionalmente pequena em relação à segurança que oferece. É o trabalho diário com salário fixo no fim do mês.
Do outro lado temos outro peso grande, dessa vez representando 90% de recompensa, acompanhado por um peso menor, sendo este 10% de suas chances de sucesso. Aqui temos aquele aplicativo que você desenvolve nos do finais de semana, mas que se fizer sucesso, pode te tornar milionário.
Para pensar em termos de investimentos, é como se 90% do seu investimento estivesse em ações seguras, que tenham se mostrado estáveis ao longo dos anos. Do outro temos 10% investido no mercado de Opções, com risco extremamente alto, mas que oferece uma recompensa proporcionalmente alta.
Um exemplo clássico disso é o Físico Teórico Stephen Hawking, que aposta enormes quantias de dinheiro contra suas próprias teorias. Caso ele esteja errado de um lado, do outro ele ganha uma bela grana.
Agora que a estratégia está detalhada, é preciso entender como aplicar o conceito.
Nós, como seres humanos, somos bem piores em transferir conhecimentos de uma coisa para outra do que nossa ingenuidade permite acreditar. Hoje é evidente que malas de viagem devem possuir rodas, principalmente as maiores. Parece bobo, mas se passaram 6 mil anos desde a invenção da roda ao dia em que um fabricante resolveu equipar malas com pequenas rodinhas. Fizemos até carrinhos para colocar malas em cima e carregá-las, mas rodas próprias demoraram um bom tempo.
Por estar envolvido com empreendedorismo, acabo ouvindo uma frequente pergunta, principalmente dos mais novos. Por existirem incríveis relatos de empreendedores que não possuem nível superior, é comum que grande parte dos jovens acredite que não precisam de um diploma para serem bem sucedidos.
Concordo, é claro, que não seja necessário um papel carimbado, empreendedores são famosos por criarem seu próprio caminho sem respeitarem as estruturas sociais previamente impostas.
No entanto, é ingênuo aquele que opta por preencher apenas um lado do halter, o lado do alto risco com grandes recompensas, desequilibrando completamente a barra. Este caso é semelhante ao do trabalhador que deseja sair do emprego fixo para seguir o sonho de empreender.
De um lado da barra temos o que é mais seguro, do outro, o risco. No caso do jovem, sabemos que possuir um nível superior não é, nem de longe, garantia de nada, mas, perto de não possuir qualificação comprovada e tentar criar algo que impacte o mundo de um jeito que fature rios de dinheiro, se formar e conseguir um emprego mediano é incrivelmente mais seguro.
Por isso, de um lado teremos a faculdade e o destino confiável, do outro, o empreendedorismo arriscado e recompensador. Assim como no caso do trabalhador, mantendo seu trabalho convencional de um lado, enquanto utiliza algumas horas do seu final de semana em algum projeto paralelo. Eventualmente o lado arriscado do halter pode se concretizar, tomando o lugar do que antes era mais estável, abrindo espaço para novas tentativas de risco, com recompensas cada vez maiores.
Tento aplicar este modelo bimodal em praticamente tudo o que venho fazendo, observando os padrões de segurança enquanto reservo fôlego para investir em projetos de maior risco. De um lado construo uma vida acadêmica, do outro tenho minha empresa e minha paixão pelo empreendedorismo.
Apesar da literatura empreendedora estimular que devemos confiar em nós mesmos e assumir riscos, é bastante inocente depositar toda chance de sucesso em algo incrivelmente arriscado. Através da heurística é fácil reconhecer esse conceito, traduzido no português de Osasco como “Não colocar todos os ovos na mesma cesta”.
A perspectiva que queremos aplicar é simples, mas exige bastante observação para que a estratégia não seja quebrada, nos expondo a mais riscos que o necessário.
É interessante apontar que existe a versão sequencial da estratégia, sendo determinado pela divisão de esforços por temporadas.
No meu caso, construí uma profissão ao longo de vários anos, depois deixei de lado por uma alternativa mais arriscada. No entanto, posso voltar a exercer minha profissão anterior a qualquer momento, caso me depare com uma falha na opção mais arriscada. Mesmo que seja sequencial, podemos observar que de um lado eu tenho algo extremamente sólido, mas que agora me permite arriscar sem que me fragilize completamente.
Todos precisamos nos garantir em algum ponto, desde que essa segurança não nos bloqueie de experimentar oportunidades novas, assumir riscos e nos beneficiar das enormes recompensas que grandes riscos podem gerar.
O mais importante em tudo isso é a garantia que nenhum prejuízo será terminal, permitindo que nos recuperar e tentar novamente.
Aqui expus a forma como avalio meus riscos e equilibro minhas decisões, mas e você? Qual estratégia aplica para se aventurar em territórios arriscados, sem que isso signifique terminar com uma mão na frente e outra atrás?
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