Aconteceu em São Paulo a Campus Party, considerado o maior evento de inovação tecnológica, Internet e entretenimento eletrônico em rede no mundo, realizado desde 1997, com apoio da Telefonica e do governo brasileiro em níveis municipal, estadual e federal.
Na sexta passada, Gustavo Gitti moderou as discussões do painel “Is Internet for Porn?”. Na mesa, estavam Fausto @botecosujo, @AleFelix, @Castrezana e @Lini.
Participantes do papo “Is Internet for Porn?”
Fausto Salvadori se descreve como um “jornalista maldoso, marrom e violento”. Escreve no excelente Boteco Sujo sobre pornografia, prostituição e o mundo underground.
Gustavo Gitti é nosso “mestre zen” que dispensa maiores comentários.
Alê Félix é a autora do antigo Amarula com Sucrilhos, da Editora Gênese, “obcecada por boas histórias e todo tipo de liberdade”, como se descreve no Twitter. Está para lançar o @naonaopara, site dedicado à discussão de sexo e pornografia de uma perspectiva feminina. Dois nomes já estão confirmados para a equipe: Bruna Surfistina e Syang.
Rodolfo Castrezana todo mundo conhece: é o criador do OMEdIe do OmediCast.
Aline se descreve como “uma pessoa que só pensa em sexo”. Essa conhece tudo da putaria na Internet, desde o RedTube padrão atual até as profundezas da sala de bate papo UOL e ICQ.
Para quem é produzido o pornô?
A discussão começou bem, com as moças reclamando da qualidade dos filmes pornôs. Foi dito que um dos problemas da indústria pornográfica é que ela é maciçamente criada por homens, para homens, e portanto não leva em consideração as preferências do público feminino. Concordo em parte.
Empresas grandes como a Vivid Entertainment possuem em sua equipe produtores como Chi Chi LaRue, que é uma drag queen! Exatamente, um homossexual que cuida de detalhes como o estilo do salto alto combinando com a maquiagem e a minissaia da menina. Chi Chi é apenas um exemplo, mas as produtoras grandes sabem que existem nichos de mercado onde um casal quer ter a experiência de assistir a um filme que deve agradar a ambos parceiros. Outro exemplo é o de Suze Randall, que é uma das fotógrafas de maior sucesso na indústria.
No mundo prático, porém, esses reforços nos times de produção ainda não parecem equilibrar a qualidade do pornô para as consumidoras. Para gente como a @alefelix, a experiência de ir a uma locadora pegar filmes pornográficos é péssima.
Em primeiro lugar, hoje em dia houve uma reestruturação no modelo geral de locadoras, que raramente disponibilizam títulos em DVD pornô junto aos filmes de Hollywood. Um dos motivos, que não foi mencionado na Campus Party, é justamente a disponibilidade de filmes online, afetando a demanda desse mercado e a necessidade de adaptação dos modelos de negócio de locadoras (algo que será em breve tema da série PdH Porn).
Mas não bastasse isso, frequentemente os funcionários de locadoras não estão preparados para dar recomendações às clientes que desejam algo voltado ao público feminino. Assim, a mulher acaba tendo que escolher pela capa e sorte. A @alefelix diz que achou péssimo tudo o que ela encontrou, assim como o que está disponível em RedTube.
Houve um consenso geral de que as mulheres querem algo que tenha mais sedução, um contexto antes da foda, um pouco de fantasia. A impressão que ficou no painel é que o homem é mais direto, quer colocar o pau pra fora e sair metendo. E quanto menos a mulher falar, melhor.
Na plateia, o sentimento foi o mesmo. As moças participantes reclamaram dizendo que tem que procurar pelo menos dez vídeos dentro do RedTube para achar um que as excitasse. O silêncio dos homens representados deu a entender que nós, machos, batemos punheta para qualquer vídeo que aparece na rede, enquanto as meninas é que têm uma exigência maior. Como é que é?
Questão de achar o que se procura
Não sei qual é a impressão geral dos leitores da Papo de Homem. Mas eu digo que no meu caso, eu devo vasculhar uns 200 filmes para encontrar um que valha a pena. Uma moça com sotaque gaúcho se lamuriava em não encontrar roteiros inusitados, tais como os criativos hentais.
Desculpem, meninas, esse comentário não é pessoal, mas vocês não estão fazendo o dever de casa como consumidoras.
Principalmente dentro do grupo de entusiastas da pornografia, existem vários elementos que são analisados para ver se o filme excita ou não. Vejam por exemplo as discussões do fórum Adult DVD Talk, que tem mais de dezoito mil membros ativos. A Private também possui uma comunidade dedicada ao debate de seus filmes, atrizes e diretores.
Esses punheteiros profissionais discutem cada mínimo detalhe da carreira profissional das atrizes e inclusive diretores. Quando um DVD não sai com a qualidade esperada, o povo mete o pau.
Como a competição é grande, existem diferentes filmes, com abordagens distintas. E a cada espectador cumpre fazer a busca para encontrar o que agrada e excita mais. No meu caso, o que eu mais aprecio é a beleza estética feminina. Sou do grupo que gosta de filmes em alta resolução, iluminação perfeita, boa fotografia, ângulos, edição e sobretudo mulheres impecavelmente belas e bem produzidas.
Alguns filmes aleatórios que me vêm à mente são Party Babes, do Alex Winterthur (Private, 2007), e Teachers, do Robby D (Digital Playground, 2009). Mulherada tão gata e siliconada que merece o rótulo dado pelo @castrezana: é como “ficção científica”.
Enfim, essas são as minhas preferências. Filmes com beleza visual. Não ligo muito para o roteiro ou até mesmo para as coreografias com posições bizarras. Não me importo se o filme tem dupla penetração, ass-to-mouth, bukkake ou a novidade do momento. O que eu quero é olhar mulher bonita transando, igual quem passeia por um museu contemplando arte.
Sei que outras pessoas têm outros desejos, e é para isso que existem as comunidades especializadas, revistas da área e outros espaços para refinar a sua busca de acordo com a técnica, tema, atriz, diretor ou companhia. Fica aqui o meu rebate à crítica de que no RedTube “apenas um entre dez” filmes agrada a mulherada: o motivo é que a plataforma buscada não é a que possui o conteúdo ideal.
Onde está o dinheiro?
Até a turma do Sedentário & Hiperativo estava na sessão e comentou que o problema do RedTube é relacionado à largura de banda e armazenamento. Como os recursos são caros e limitados, não convém a empresa fazer upload do filme inteiro – assim, apenas os clipes onde está rolando a verdadeira ação estão disponíveis, dando a impressão às mulheres de que os filmes são ruins e diretos demais.
O @botecosujo retrucou com o exemplo do BangBus, que é um pornô com temática. Mas por ser um exemplo onde o acesso é pago, diferente do RedTube, foi deixado de lado na discussão.
Eu acrescentaria ao que foi dito que existe mais um elemento na história. Os produtores de vídeo, que detém os direitos comerciais dos filmes, ficam putos da vida com os donos de “vídeos tube” da vida, que muitas vezes ignoram as regras de boa convivência e carregam (ou consentem) vídeos inteiros, infringindo direitos autorais.
Para as empresas que possuem os direitos comerciais dos vídeos, é possível fazer acordos onde apenas um pequeno pedaço do vídeo seja disponibilizado, funcionando como mecanismo de captura de possíveis clientes. É o caso dos vários vídeos curtos da Brazzers. Mas quando o vídeo está na íntegra, é briga certa entre os players.
Como o pornô afetou a sociedade?
Já iniciamos isso na série PdH Porn, com ênfase no lado negro da pornografia e como o mundo era diferente vinte anos atrás. O Rodolfo Castrezana fez um comentário com o qual assino embaixo: o sexo ficou banalizado.
Nos primórdios da Internet, o que se buscava era Star Trek (talvez pelo fato de haver pouca pornografia online). Com a popularização da web, o sexo ficou em primeiro lugar nas buscas. E, hoje, Castrezana conta que quem lidera a audiência é a rede social. Estamos mais preocupados em saber de fofocas e da vida social do que baixar sexo explícito. O apelo se perdeu.
Fausto tem uma bagagem de conhecimento sem igual na história da pornografia. Conta ele que, por conversas com o pessoal das antigas, o sexo era muito mais restrito. Em obras de Jorge Amado, havia referência às prostitutas francesas que faziam… “boquete”! Uau! E isso não é apenas na ficção: em entrevistas com quem ia atrás de putas nos anos 50, era raridade encontrar uma meretriz que se rebaixasse ao vil ato do cunnilinigus. Dizia a lenda que tinha “uma italiana que chupava” no prédio do 69, o puteiro vertical da Rua dos Andradas.
Era uma época em que a esposa nunca faria sexo oral no marido – esse tinha que se virar para encontrar uma prostituta que topasse, pois não era a prática comum.
Hoje, a hierarquia do boquete foi reconfigurada. É comum fazer um amasso com uma menina no carro ou dentro do banheiro da balada, com direito a leitinho na boquinha… Mas ela pode achar que é cedo para o sexo vaginal. Seria uma influência da cultura de Hollywood e do Porn Valley? Provavelmente.
Prostituição e Internet
O painel teve a nobre presença, na platéia, do Chester, criador do BitchMaps, que é um criativo da plataforma Google Maps com a base de dados (salvo engano) do GPGuia, que é uma comunidade de Internet semelhante aos fóruns dos entusiastas que discutem filmes pornô em DVD. A diferença é que o GPGuia discute a qualidade dos serviços prestados pelas garotas de programa.
Chester perguntou aos palestrantes o que eles achavam do efeito da Internet facilitando o acesso não apenas à pornografia, mas também à prostituição.
Existem milhares de desdobramentos que podem ser comentados nesse cruzamento entre Internet e prostituição. Um deles, mencionado pelo @botecosujo e @alefelix é que, da mesma forma que a Internet matou intermediários como editoras e gravadoras, os cafetões perderam a vez. A possibilidade de anúncios online e fóruns de discussão sobre serviços de acompanhantes facilitou a explosão da puta freelancer que tinha resultados pífios com anúncios de jornal e frequentemente dependia do cafetão. Hoje, ela pode embolsar toda a renda.
Gostei muito das observações da @alefelix e recomendo quem tem interesse no assunto a ficar de olho no futuro @naonaopara. Ela reconhece que existem pessoas que podem ter uma necessidade mais intensa de sexo e que, se podem pagar por uma relação, a prostituição serve como um mecanismo adequado para suprir essa tensão acumulada e talvez proteger a sociedade de possíveis problemas que o cliente do sexo poderia causar.
Enquanto eu concordo com essa possibilidade, o que vejo em fóruns como o GPGuia, GPSportClub, GPForum e semelhantes é que existe uma demanda não apenas de sexo, mecânico e frio. Por mais que um website que lista acompanhantes pareça ser um menu de restaurante ilustrado, um fenômeno interessante é que as notas dadas pelos serviços dependem muito da relação humana estabelecida entre a garota de programa e o cliente.
O termo “namoradinha” é usado na linguagem da comunidade para a referência a essa maior intimidade. Também lemos em diferentes relatos elogios quando a GP não olha o relógio (elas cobram por sessões de meia ou uma hora). Isso parece indicar que muitos dos membros da comunidade da putaria estão, de fato, buscando uma conexão humana.
Sexo virtual: será mesmo que todo mundo já fez?
Link Ustream | Debate na íntegra, cortesia do @castrezana
Um dos pontos mais divertidos da discussão foi sobre cybersex. Os painelistas perguntaram à plateiaquem já tinha feito sexo virtual: três gatos pingados levantaram a mão. Ficou um ar cínico de que tinha gente mentindo… E eu confesso que fiquei puto com essa presunção.
Na boa, eu, que sou usuário da Internet desde a época do ICQ e bate-papo UOL, como a @lini, nunca fiz o tal do sexo virtual. Podem me chamar de coxinha, de brocha digital ou de mentiroso. Mas o fato é que eu sempre achei isso meio besta.
Houve uma época que uma amiga de ICQ propôs de fazermos cyber e eu topei para ver como era. Depois de umas quatro mensagens trocadas, eu disse que aquilo era muito chato e marcamos de nos encontrar num Fran’s Café. Foi muito melhor.
Enfim, não sei se eu é que sou realmente minoria ou se de fato o padrão é que todo mundo tenha feito cyber mas não admita de forma alguma. Mas desconfio não estar sozinho. O @castrezana também disse que prefere o sexo real, sendo que a Internet serve mesmo é para matar a curiosidade das pessoas. Para ele, “sexo virtual é punheta interativa”, não é sexo. Concordo.
A @alefelix, sempre refletindo bastante antes de falar, confessou que tem interesse na vida das pessoas. E que parece que hoje as pessoas têm medo de estabelecer vínculos, de modo que o sexo se torna instrumental, um atalho.
Já a entusiasmada @lini não tem o menor problema em dizer que é veterana de cybersex e hoje o Twitter é um grande banco de picas. Acho interessante que nessa conversa ela se abriu dizendo que não é chegada em baladas. Ao mesmo tempo, já conheceu as casas de swing e de masoquismo. Ela me lembrou algumas meninas que conheci mais de uma década atrás pelo ICQ. De fato, existe uma quantidade grande de gente que prefere formas alternativas de interação do que a vida das baladas. Fica aqui a dica para quem pensa em investir nos canais online: o mar tem peixe!
E por fim o o @GustavoGitti apontou que, em seu blog de relacionamentos, o texto sobre orgasmo vaginal e clitoriano é de longe o mais popular. Seguindo a brecha dada pela Alê, o Gitti repara que a conversa sobre sexo é o primeiro passo. As pessoas vão se abrindo e no diálogo nota-se que o tema principal não é o sexo em si, mas outros que a ele estão ligados. Sem dúvida! E por isso estamos dando continuidade à série PdH Porn.
Duas dicas extras
A Alê Félix revelou um segredo que até agora eu guardava apenas para mim, pois é muito eficiente. Uma das (várias) fantasias femininas é mostrar o peito. Por questões anatômicas, é a parte mais prática para ser exibida, sendo que “pagar peitinho” é um equivalente a “colocar o pau pra fora”.
Assim, ao conversar de temas sexuais e escalar a tensão sexual com uma menina, um coringa a ser utilizado é tocar nessa fantasia e dar corda. Se ela pagar peitinho com pouco esforço, é sinal verde para prosseguir. Eu fiz várias vezes e confirmo a eficiência do método.
A segunda dica, para encerrar o post, é que as mulheres de modo geral se ressentem em não poder falar abertamente de sexo. Quando elas começam a falar de putaria, o feedback que elas recebem é muito negativo. Isso me pareceu unânime entre todas as presentes no painel. No Brasil, a mulher que fala de sexo é taxada como puta. Eis aqui mais uma simples dica de tema para continuar conversas sexuais com uma mulher – certamente ela terá muita coisa interessante para contar.
Aliás, mulherada leitora da Papo de Homem, o que vocês acham? Se sentem confortáveis para falar sobre sexo em uma roda de amigos com homens em volta?
P.S.: Como moro na Europa, não compareci fisicamente à Campus Party, mas acompanhei tudo pelo streaming organizado pelo @castrezana. Indico também a cobertura feita pela B., no A Vida Secreta.
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