Em uma de minhas viagens a serviço visitei as Forças de Segurança de Israel. Já tinha ouvido muita coisa sobre os agentes secretos israelenses, porém a coisa que mais sabia era que, na verdade, não sabia quase nada.

Isso é justificável quando estamos falando de uma das forças de inteligência mais “famosas” do mundo – entre aspas, já que esta fama se dá justamente pelo fato de que pouco se sabe sobre essa agência de inteligência. Ouvimos muita coisa sobre a CIA, Interpol ou a MI-6, mas quase nada sobre o Mossad – Instituto para Inteligência e Operações Especiais.

A malinha deles vem até com o manual do silenciador.

Uma operação mal feita em Dubai

Chegamos em Tel Aviv poucos dias após os jornais de todo o mundo noticiarem que os homens do Mossad teriam sido identificados durante uma operação, que deveria ter sido sigilosa, em Dubai (Emirados Árabes) que resultou na morte de um dos líderes do Hamas, Mahmoud al-Mabhouh. O que todos comentavam era que a tão famosa agência de inteligência israelense teria cometido uma série de equívocos, deixando pistas sobre sua ação e colocando em xeque sua capacidade.

De fato, ficou evidente que os agentes secretos usaram passaportes falsos para entrar em Dubai, bem como deixaram ser filmados colocando seus disfarces no banheiro do hotel. Mahmoud al-Mabhouh, principal fornecedor de armas do Hamas, foi morto por envenenamento em seu próprio quarto.

Lembro que no primeiro café da manhã perguntei sobre o fracasso da missão em Dubai, e nosso anfitrião, um empresário israelense do ramo de armas eletrônicas cujo o principal cliente é o próprio Exército de Israel, sorriu e perguntou em tom irônico:

“Mas de que fracasso você está falando?”

Eu já conhecia muito bem este amigo para entender exatamente seu ponto de vista. Realmente, a missão foi cumprida e o alvo foi eliminado.

Durante toda a viagem estivemos em contato com tudo aquilo que existe de mais moderno em guerra eletrônica, ou pelo menos aquilo que o governo de Israel nos deixou ver. Mas sempre que tínhamos a oportunidade perguntávamos se o Mossad utilizava o mesmo tipo de tecnologia, e a resposta era sempre a mesma, “Mossad? Do que vocês estão falando?”, seguida de inúmeras gargalhadas de ambas as partes.

O Mossad, durante toda sua história, esteve envolvido em inúmeras operações que envolvem sequestros, assassinatos, conspiração e todo tipo de BlackOps (operações secretas negadas pelo próprio governo).

Link YouTube | Documentário sobre a história do Mossad

Conversa com um ex-agente do Mossad

Sabendo de nosso enorme interesse na área de inteligência, o nosso anfitrião conseguiu uma reunião, em um hotel de Tel Aviv, com um ex-agente do serviço secreto israelense.

Ao chegar no hotel me senti exatamente como em um filme de James Bond. Aguardávamos pelo nosso convidado no bar do hotel, quando o garçom se aproximou e entregou um bilhete e um cartão-chave do hotel.

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O bilhete, em inglês, dizia:

“Se vamos nos conhecer, venham até meu quarto à meia-noite.”

E isso é o tipo de coisa que, pelo menos para nós, era inédito.

O encontro foi realmente excepcional. Estivemos a noite inteira conversando sobre fatos históricos de Israel. O ex-agente nos explicou a diferença entre o Mossad e o Shin Bet, agência de inteligência que atua internamente em Israel. Disse que o Mossad foi fundado em 49 e está ligado diretamente ao Primeiro-Ministro de Israel. Revelou que, em geral, os agentes secretos infiltrados de Israel não são israelenses. Segundo ele é muito difícil infiltrar alguém estranho nas células do terrorismo.

Vimos desde escutas super avançadas, até aparelhos disfarçados, de relógios a galhos de árvore.

Relógío e cinto com câmera escondida. Isso não é nada!

Quando perguntamos sobre o treinamento dos agentes secretos sentimos que nosso convidado mudou o semblante. Ele olhou para nós e perguntou se no nosso exército havia algum curso de operações especiais. Eu respondi que sim. E ele então sorriu e disse: “Então você sabe como é”. Quando falamos em Operações Especiais, existe um certo padrão de qualidade mundialmente conhecido que mais tarde explicarei melhor, mas isso inclui privação de sono, fome, exaustão total, técnicas avançadas de combate, dentre outras disciplinas pouco usuais para agentes convencionais.

Uma das ações que renderam ao Mossad toda sua fama foi a operação Cólera de Deus, que tinha como objetivo eliminar os responsáveis pelo massacre nos Jogos Olímpicos de Munique. Existem muitas informações contraditórias sobre esta operação que pode ter durado mais de vinte anos. Dentre as quais o assassinato por engano de um inocente em Lillehammer, na Noruega. A operação marcou também o início de uma série de atentados do grupo terrorista palestino Setembro Negro, em represália às ações do Mossad.

Atualmente o Mossad foi acusado de tentar assassinar o primeiro-ministro turco Recep Tayyip Erdogan e teve um dos seus agentes, Yuri Brodsky, preso no aeroporto de Varsóvia, na Polônia, a pedido do Ministério Público Federal Alemão, acusado de ter participado do assassinato de Mahmoud al-Mabhouh, em Dubai.

Quanto a mim, deixei Israel com a impressão de que nem tudo é o que parece, e que muitas vezes acreditamos naquilo que o nosso oponente quer.

Até o momento não foi realmente comprovado o envolvimento do governo israelense no assassinato de al-Mabhouh. E o Mossad segue como uma das agências de inteligência mais atuantes, e polêmicas, do mundo.

Thyago Ferreira

Oficial da Polícia Militar do Rio de Janeiro. Amante de armas, explosivos, operações de inteligência, guerra eletrônica e coisas do gênero. Carioca, flamenguista, sonhador e escritor nas horas vagas. No Twitter, <a>@ferreirinha_rj</a>."