Estou passando por um problema que acredito que muitos caras passam ou já passaram, mas poucos decidem falar sobre.

Tenho uma namorada há quase quatro anos, ambos temos 25 anos de idade e, no geral, somos muito felizes juntos. Algo, no entanto, vem prejudicando muito nosso relacionamento no último ano: sinto pouca vontade de transar com ela.

Somos um casal que chama muita atenção visualmente. Ela não deixa nada a desejar, está sempre linda, perfumada, malhada. Não consigo nem ter coragem de conversar com meus amigos a respeito, pois acredito que eles não entenderiam como eu não sinto vontade de transar com uma mulher maravilhosa.

Nos últimos 20 meses, mais ou menos, tenho visto uma contínua diminuição no meu tesão pela minha namorada, mas só por ela. Ainda sinto vontade de transar com outras mulheres, inclusive muito menos atraentes que a minha namorada. Ela vem percebendo essa queda no meu interesse, por mais que eu tente disfarçar e me forçar a transar. E ela não é ruim de cama, muito pelo contrário, é uma delícia.

Ah, talvez seja importante acrescentar que nós moramos juntos faz mais de 2 anos. Não somos casados no papel, mas fazemos tudo como se fossemos. Somos um casal de mente aberta, acredito eu. Conversamos abertamente sobre nossos problemas. Recentemente decidi falar com ela sobre a possibilidade de um relacionamento aberto, ela prometeu pensar melhor a respeito. Foi a única solução que consegui pensar para não ter que trai-la.

Sinto que se continuarmos assim, o relacionamento irá terminar. Algo precisa mudar. Quero que ela esteja satisfeita, mas também quero estar satisfeito.

Alguma dica?

Abraços
E.R.

Olá E.R,

Sua pergunta é ótima, afinal com ela poderei ampliar o olhar para o desejo como um todo e em especial como nossa cultura condiciona e restringe o olhar masculino sobre o sexo.

O tesão nasce na cabeça

Você já deu uma pista importante e pouco comentada entre as pessoas: “eles não entenderiam como eu não sinto vontade de transar com uma mulher maravilhosa”.Ou seja: o desejo e a excitação não são atos meramente físicos ou uma inquietação que surge de um olhar visualmente atrativo.

“Ela é linda e gostosa e mesmo assim o desejo não surge”. Isso quer dizer que existe algo mais nos bastidores do desejo que ignoramos, ainda que superficialmente um corpo atraente possa ser a chama inicial que ativa a imaginação.

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O tesão, longe de ser uma substância física, é essencialmente psicológico. O fato é que mesmo usando Viagra, sem nenhum suporte de uma mente que deseja, a coisa não acontece. O nosso desejo surge de uma expectativa de prazer que promete uma experiência pessoal de empoderamento, vitalidade e porque não dizer, de transcendência. Quando olhamos uma guria, nossos olhos não brilham apenas pelo decote ou as coxas que nos apontam para a expectativa de penetração e orgasmo, mas sim para o sentimento de sermos desejados e nos sentirmos mais vivos.

E não é qualquer troca que ocasiona essas sensações, mas uma que surja de uma garota que se mostra vívida diante de nós, que provoque sensações mais obscuras ou puras, mas que de qualquer forma incite uma dimensão inexplorada da vida. Caso contrário, a masturbação seria o suficiente. Queremos nos sentir vivos ao lado de alguém que está vivo. É nessa sinergia que parece haver algum descompasso entre vocês.

Se o desejo é bilateral, ou seja, desejamos o tesão do outro por nós, então fica a pergunta, onde nós mesmos nos esforçamos para sustentar o desejo da outra pessoa em nossa vida?

Abrir o relacionamento como solução

Então, seria uma solução abrir o relacionamento para mais participantes? A resposta clichê e até um pouco canibalista recomendaria trocar de parceiro na esperança de que a novidade possa reaquecer o desejo. Mas essa pode ser uma postura que subestima a real capacidade que uma pessoa tem em mergulhar no seu desejo. Ele, o desejo, não precisa de novos objetos para se estimular, mas de novas perspectivas, ou seja, tocar anseios ocultos na sua mente, independente da variação da matéria-prima: a pessoa.

Já ouvi, nesse sentido, uma comparação, como se comer o mesmo prato de comida todo dia que levasse à exaustão do desejo. Como se a pessoa desejante pudesse ser dissociada do objeto de desejo e como se fosse possível comparar uma personalidade humana multifacetada com um prato de comida. O grande engano é: no momento em que o desejo acaba, apontamos para o alvo e dizemos “naquela pessoa o desejo acabou” e não “eu não consigo sustentar o desejo por algo que já conheço e preciso de algo novo para me excitar outra vez”.

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Ainda que em algum momento abrir o relacionamento parecesse solucionar a questão, o ponto chave não estaria solucionado, pois seu desejo poderia novamente se entediar com o terceiro, quarto ou quinto elemento numa sucessão de fastio emocional.

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Esse talvez seja o grande impasse por trás do tédio, pois ignoramos que é o olho entediado que carece de autorrenovação antes de cair no atalho de pular de novidade em novidade, sem de fato se renovar.

Se essa questão fica clara, então o modelo aberto, fechado ou qualquer variável não se torna a solução (ou um novo problema), mas apenas um estilo de vida.

O grande impasse não é você ter tudo o que quer, mas saber querer tudo o que tem.

O que abre o “apetite” sexual?

Como já disse em outro texto, os homens são condicionados a ativar seu tesão só visualmente, com pobreza de imaginação e uma limitação bem grande de desenvolver narrativas autoestimulantes mais complexas. É como se só conseguisse se excitar com uma vagina (pelo que ela produz de gozo) e não com toda a pessoa e contexto que a compõe.

Quando o relacionamento vai avançando na intimidade, muitos homens não conseguem fazer movimentos complexos de reconquista. Ou seja, só souberam impressionar a garota enquanto ela ainda não os conhecia completamente e podiam idealizar. Depois que suas vulnerabilidades são reveladas no convívio, aquele senso de grandeza dos primeiros 100 dias de relacionamento desaparece. Não educamos a nossa mente para se excitar pelo que realmente somos: incompletos e falíveis.

Esse ciclo de pouco estímulo cria uma areia movediça para o casal que reforça o distanciamento baseado na falsa crença de que tesão mesmo só pode ser de pele e intenso. Nessa fase, ambos evitam qualquer situação que os coloque em “risco” de maior intimidade sexual, nem beijo na boca rola.

Daí se revela a dor de aprofundar o desejo sob o risco de sair do conforto da estética e seguir em dimensões inexploradas da personalidade. O casal permanece fixado em visões conservadoras e começam a negar fogo para as ousadias. A vida parece não potencializar mais uma admiração mútua e, assim, ficam tentados a abandonar o barco por pura inabilidade de ativar o outro em profundidade.

Mas o que fazer na prática?

Incentivar um outro tipo de conexão, propor uma interação mais sofisticada que iniba a pressa pelo sexo em si, a penetração e o orgasmo. O script padrão precisa ser alterado para que vocês percebam uma dimensão sutil e ainda mais potente entre vocês. No que se refere ao contato usual vocês já “bateram a meta”, agora há um desafio sem roteiros pré-definidos. Para isso você, E.R., precisa entender que talvez haja um descaso sutil da sua parte e tomar a dianteira para esse aprofundamento.

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Nessa nova fase o sexo passa a ser só um pretexto para uma conexão mais profunda e não o resultado final, sua segunda intenção não é transar, mas ganhar intimidade com a pessoa e ampliar o leque de comunhão emocional.

O tesão pode ressurgir a partir da coragem de ambos se redescobrirem como pessoas, afinal, o sexo não deveria ser a única medida se o relacionamento vai bem.

Lembre, E.R., o sexo começa muito antes da cama e termina muito tempo depois, uma coisa não pode ser dissociada da outra para ser bem compreendida e vivida.

Agora nos comentários cada um pode dizer o que já tentou na prática e que funcionou como reativador dessa profundidade em casal.

* * *

Nota: A coluna ID não é terapia (que deve ser buscada em situações mais delicadas), mas um apoio, um incentivo, um caminho, uma provocação, um aconselhamento, uma proposta. Não espere precisão cirúrgica e não me condene por generalizações. Sua vida não pode ser resumida em algumas linhas, e minha resposta não abrangerá tudo.

A ideia é que possamos nos comunicar a partir de uma dimensão livre, de ferocidade saudável. Não enrole ou justifique desnecessariamente, apenas relate sua questão da forma mais honesta possível.

Antes de enviar sua pergunta olhe as outras respostas da coluna ID e veja se sua questão é parecida com a de outra pessoa e se mesmo assim achar que ela beneficiará outras pessoas envie para id@papodehomem.com.br.

Frederico Mattos

Sonhador, psicólogo provocador, é autor do <a>Sobre a vida</a> e dos livros <a href="https://amzn.to/39azDR6">Relacionamento para Leigos"</a> e <a href="https://amzn.to/2BbUMhg">"Como se libertar do ex"</a>. Adora contar e ouvir histórias de vida no instagram <a href="https://instagram.com/fredmattos/">@fredmattos</a>. Nas demais horas cultiva a felicidade