"Meu amigo me criticou por só me interessar por mulheres muito mais jovens do que eu. Só pra contextualizar, tenho 45 anos e sou professor universitário, então convivo com gente mais nova o tempo todo. Já cheguei a ficar com ex-alunas. Já li que isso é problema psicológico, mas não consigo entender o motivo disso. Por que seria?"

Caro professor,

Seria bom dar uns passos atrás para contextualizar.

Meu texto não vai endereçar a pedofilia, o que é uma outra questão e acredito não ser o seu caso. Vamos falar de quem é mais velho e tem um mero fetiche por mulheres mais novas em perfeita condição de consentimento.

O ato de desejar parece conduzir a civilização direto ao que é meio proibido, um tanto controverso. Se o incesto é um tabu, o desejo anseia o seio farto da mãe. Se papai é vetado, é o seu bigode que fetichizo. Então, estamos entrando na esfera daquilo que se alimenta das coisas que mais nos constrangem e zombam da razoabilidade.

O desejo parece seguir uma curva de amadurecimento, assim como a mente. Quando pequenos, percebemos as coisas de uma maneira indiferenciada. Nosso próprio pé é indiferenciado do corpo da mãe. Tudo é uma amálgama esquisita.

O tempo passa e vamos percebendo que a mãe e o pé são coisas distintas, mas ainda somos e vemos coisas parciais, até que o quebra-cabeças vai se montando aos poucos. De repente, mamãe é uma pessoa e eu sou outra. O desejo vai seguindo esse caminho. De algo indiferenciado e misturado até algo completo, inteiro, fluido, disponível de uma pessoa para outra. Quando somos livres, o desejo está à minha disposição, de pessoa pra pessoa, inteireza pra inteireza, inclusive para não exercê-lo (e ser escravo dele). Confesso, é raro.

O fetichismo, ou seja, o desejo fincado em coisas ou partes/tipos estereotipados de pessoas é visto como uma patologia porque é um desejo que permanece estagnado numa mente que não se atualizou, que não conseguiu colocar a pessoa mais como as partes que a compõe.

Mas antes que fique assustado, desejar "novinhas" não é considerado uma patologia mental. Mas se isso é tão recorrente e todas as outras pessoas não-novinhas estão excluídas, se basta a novinha envelhecer que é descartada para a próxima, então, isso se aproxima em algum nível a um quadro digno de análise, não diagnosticável pela psiquiatria, mas que é problemática em muitos níveis.

Mulheres são pessoas que, como os homens, passam pelos mesmos processos de degenerescência. Mas há um estigma social, tão embutido nos homens, que nem notamos, pois a velhice masculina é pintada com glamour há muitas gerações, provavelmente para mascarar o fato de que aquilo que ele mais se vangloria, o pênis, se torna relativamente indigno de confiança erétil.

Já para as mulheres, o envelhecimento é uma maldição, a não ser para ser aquela boa MILF que nos ensinará as mágicas do sexo com as mais jovens.

Mas vamos à questão.

Afinal, o que um homem procura quando quer uma mulher jovem?

Talvez seja melhor perguntar o que ele evita numa mulher de igual idade. Menos colágeno, alegarão os sapequinhas que acham que a única coisa que existe numa relação humana é sexo.

A verdade é que a grande maioria dos homens não querem encheção de saco, mas de que espécie? De duas: psicológica e sexual.

Emma Stone e Joaquin Phoenix em O Homem Irracional, de Woody Allen. 

Como se condicionou a um tipo de estética e ainda está ancorado exclusivamente numa fantasia de virilidade e jovialidade infinita de si mesmo, o homem ignora a sua própria decrepitude e imagina que só as mulheres ficam enrugadas e menos lubrificadas.

Ele esquece que também não sustenta a excitação com tanta facilidade, mas jamais vai admitir isso. Ele vai dizer que uma mulher que envelhece não o excita tanto, até porque está preso no olhar viciado da pornografia (mulheres jovens, plásticas, feitas para o seu deleite audiovisual e sem a profundidade de possibilidades e demandas que uma mulher real possui).

Mas se estivesse olhando com apreço para a parceira que envelhece com ele, admiraria cada ruga, marca e pé de galinha como sinal de potência de vida. Não seria escravo de uma suposta perspectiva biologicista de que "os machos da espécie vão sempre atrás de fêmeas mais jovens para seguir procriando".

Somos humanos, animais adaptados, claro, mas predominantemente humanos. Explicações estritamente biológicas não deveriam bloquear nosso raciocínio. Não podemos mais nos esconder atrás de teorias antropológicas distorcidas e mal utilizadas.

Temos medo de nossa impotência, por isso, precisamos de "drogas mais potentes" e condizentes com aquilo que consumimos, "as novinhas".

Do ponto de vista psicológico, o cenário é ainda pior. A mulher tão velha quanto ele próprio o faz parecer infantilizado. Quando temos dez anos de idade, essa diferença é gritante. Os meninos só sabem falar das coisas que têm, do que vão ter e dos heroismos (muitas vezes mentirosos) de coisas que consquistaram.

As meninas são socializadas para versar sobre a vida em sua abrangência. O que nós fazemos aos quarenta e cinquenta anos? Praticamente a mesma coisa. É meio deprimente notar isso, mas nossos truques de sedução não se renovam, apenas se tornam mais caros.

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Quando uma mulher permanece casada muitos anos com um homem, ela inconscientemente percebe isso. Ela vai se interessar por artes, humanidades, história, de maneira a sofisticar a sua forma de enxergar o mundo. Nós seguimos batendo na mesma tecla, reforçando nosso repertório acumulador-capitalista-materialista.

Em algum momento ela vai se separar e, numa situação de exaustão típica da mulher pós-divórcio, ela é uma pessoa mais densa, intrigante e paradoxal (mesmo muitas mulheres de maturidade questionável).

O homem mediano, na mesma situação, é quase previsível. Tem um carro e um emprego para se exibir e a mesma conversa heroica. A quem ele vai convencer? Certamente não será uma mulher contemporânea dele. Ela sabe o que está por trás do truque.

Se alguém empurrar aquele castelo de cartas escondido na Ferrari, verá um homem com piadas prontas, alguns truques intelectuais e status financeiro, mas com bem pouca habilidade emocional.

Uma mulher mais velha é como o Mister M desvendado os mágicos da antiguidade.

Uma mulher mais jovem, ainda ingênua para as próprias potências pessoais, se impressiona com a pomba que voa da cartola.

Assim, a estratégia acaba ficando óbvia. Para quem ele vai tirar a cartola? Onde vai convencer com facilidade.

É verdade que muitas garotas se impressionam com a cantada "você é diferente das outras, é tão inteligente, madura e precoce". Quem não gostaria de ser elogiado por um velho sábio e "vivido"?
 
Enquanto não é confrontado ou exposto, o homem mais velho é soberano e imbatível. Emocionalmente, costuma ter pouca consistência.

Para quem está lendo o texto e espumando de raiva por causa de tantas generalizações, é só trazer à memória o próprio pai. Não sabe falar do que sente, não sabe ser afetivo, provavelmente não conseguiu segurar a barra de ficar na sua família nas vacas magras, deve ser alguém que espanou. Imagine ele com uma novinha. A cena é esquisita. Largou sua mãe por alguém que parece ainda tão pouco robusta existencialmente.

Gostar só de novinhas é um tipo de parque de diversão emocional, você ganha xadrez de criança. E com isso não estou dizendo que jovens mulheres realmente não dão um baile. Se elas soubessem a potência que são já tão jovens, jamais cairiam em truques babões.

É que o condicionamente de ser validado por pessoas mais velhas, o chefe, o professor, o amigão do pai, ainda tem um apelo atávico irresistível. Aquelas que complementam o fetiche não raramente costumam vir de lares disfuncionais em que o pai era o machão com a última palavra ou a figura quase invisível e fugidia que não teve forças nem para amar os filhos. Ela pode se ver impelida a procurar a força que lhe faltou em casa no tiozão. É sempre sistêmico.

Sim, minha argumentação parece diminuir todos os casais com assimetria de idade a mero fetichismo. Não seria honesto, ninguém é obrigado a ser politicamente correto e ser acorrentado a amar os seus contemporâneos.

A questão do texto é quando a palavra "só" antecede o objeto de desejo. Quando uma coisa só pode ser de um jeito, aí é que reside o problema.

Quando sabemos transitar por muitas dimensões do desejo (inclusive pessoas mais jovens) está tudo em ordem, mas quando só se pode estar numa relação de dominação com pessoas mais jovens… Bem, aí é muito válido pensar sobre o que estamos falando.

É possível amor entre uma mulher ou homem ou pares mais jovens? Claro!

A relação pode se prolongar por anos? Com certeza!

Mas se num determinado momento, por alguma "coincidência", o passar dos anos roubar sua atração da parceira, então, isso pode significar que a "velhice" é descartável pela mera perda de jovialidade.

Querido Professor, espero ter esclarecido o motivo.

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Daqui a 15 dias, o próximo tema vai ser: "Minha esposa ganhou peso e isso me incomoda".

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Nota da edição: a coluna ID não é terapia (que deve ser buscada em situações mais delicadas). É apenas um apoio, um incentivo, um caminho, uma provocação, um aconselhamento, uma proposta. Não espere precisão cirúrgica e não condene por generalizações. Sua vida não pode ser resumida em algumas linhas, e minha resposta não abrangerá tudo.

A ideia é que possamos nos comunicar a partir de uma dimensão ampla, de ferocidade saudável. Não enrole ou justifique desnecessariamente, apenas relate sua questão da forma mais honesta possível.

Antes de enviar sua pergunta, leia as outras respostas da coluna ID e veja se sua questão é parecida com a de outra pessoa. Se ainda assim considerar sua dúvida benéfica, envie para id@papodehomem.com.br. A casa agradece.

Frederico Mattos

Sonhador, psicólogo provocador, é autor do <a>Sobre a vida</a> e dos livros <a href="https://amzn.to/39azDR6">Relacionamento para Leigos"</a> e <a href="https://amzn.to/2BbUMhg">"Como se libertar do ex"</a>. Adora contar e ouvir histórias de vida no instagram <a href="https://instagram.com/fredmattos/">@fredmattos</a>. Nas demais horas cultiva a felicidade