O brasileiro trabalha cinco meses por ano para pagar seus impostos.
Se trabalhamos oito horas por dia isso significa que durante três horas e vinte minutos o nosso esforço gera dinheiro que não vai pagar as nossas contas. Não vai por comida na nossa mesa. Não nos serve diretamente.
Todo esse dinheiro vai para os cofres públicos na forma de impostos que pagamos. E isso não é ruim. Pelo contrário. Ele deveria garantir principalmente os direitos sociais descritos na Constituição brasileira, no Capítulo II, Artigo 6º: educação, saúde, alimentação, trabalho, moradia, lazer, segurança, previdência social, proteção à maternidade e à infância e a assistência aos desamparados.
Ocorre que damos pouca atenção para o dinheiro que vai pro governo. Se na nossa vida privada sabemos exatamente para onde vai cada centavo dos sete meses que nos sobra de trabalho no ano, o dinheiro que vai para os cofres públicos — aquele, fruto de cinco meses do nosso esforço — fica esquecido. Fazemos pouco caso dos gastos em nossas cidades, em nossos estados, no Brasil. Um efeito colateral sério da nossa democracia representativa.
Deixamos para que o outro decida o rumo da coisa pública, inclusive do nosso dinheiro. Isso não ocorre apenas porque há falta de interesse por parte de alguns. Há muita gente interessada também. Os jornais, por exemplo, dão uma tremenda atenção a isso. Mas temos dificuldade em interpretar, priorizar e nos articular para agir, como sociedade civil, com as informações que chegam até nós. Há muita informação e pouca explicação, direcionamento ou auxílio prático.
Se eu te perguntar quanto você recebeu no fim do mês passado a resposta está na ponta da língua. Agora, e se nos perguntássemos quanto o nosso prefeito teve disponível do NOSSO dinheiro (inclusive do dele!) no ano de 2013? Sabemos quanto foi para cada área que cuida dos nossos direitos sociais?
Quando perdemos o controle dos gastos em casa, começam as dívidas. As coisas faltam. Ficamos infelizes. Nada parece dar certo. Não é de se estranhar, então, que não estamos felizes com o Brasil.
Afinal, apesar de termos elegido pessoas que apontaram equipes para cuidar dos gastos públicos, pouco fazemos para fiscalizar esse trabalho, para saber o que realmente aconteceu. O quanto foi empenhado e porquê. E mesmo que muitos de nós não nos sintamos representados pelos políticos que lá estão, eleitos, são eles que vão mexer no nosso dinheiro. Se queremos pedir mudanças temos que entender como esse pessoal está gastando nosso recurso e porquê.
Somos muito bons em apontar o que está dando errado. Sentimos na pele, todos os dias, nos ônibus lotados, nas filas dos hospitais, nas escolas desequipadas, nos bairros sem saneamento básico, sem energia elétrica, na falta de segurança e na insuficiente assistência que damos aos desamparados. O que podemos fazer então? Vamos reclamar, sim. Ficamos indignados. Às vezes descontamos em quem não merece. Mas vamos também tomar consciência.
Vamos conhecer e entender como funcionam os gastos públicos. Como funcionam os impostos. De onde vem o dinheiro, para onde ele vai. Quanto foi previsto, quanto foi gasto.
Só no estado de São Paulo, por exemplo, a prestação de contas diz que, em 2012, 47 bilhões de reais foram gastos com “Encargos Especiais”. Mais do que foi gasto em Educação, Transporte e Direitos da Cidadania, juntos. Os encargos especiais reúnem transferências a municípios, serviço da dívida internta, outros encargos… Há poucos detalhes sobre o que é feito exatamente com esse dinheiro.
Será que não há uma forma melhor de prestar contas sobre esse recurso? Qual foi o processo de tomada de decisão que levou-se a gastar mais dinheiro com o Judiciário do que com “Direitos da Cidadania”? Não que uma coisa seja mais importante do que a outra. São perguntas que devemos fazer aos governantes. Seja comparecendo às audiências públicas, seja enviando emails, seja entrando em contato com a imprensa. Daí, sim, teremos condições de cobrar mudanças sólidas, permanentes. Como?
A Lei de Acesso à Informação deu um importante primeiro passo para diminuir a distância entre o cidadão e os bastidores do governo. Umamiríade de “portais da transparência” surgiram, prometendo uma prestação de contas mais efetiva.
Contudo, é preciso ter estômago para navegar na maioria desses sites.
Cada um apresenta seus dados de forma diferente, cada estado usa uma nomenclatura distinta para campos similares em outros estados, cada um estabeleceu uma forma de procurar os documentos… Enfim. Demos um importante primeiro passo, mas temos que fazer muito mais para aproximar, de fato, o cidadão das contas públicas, pagas com o nosso dinheiro.
Gastos Abertos: para onde foi meu dinheiro?
Esse é o nome do projeto que vai dar mais um passo adiante nessa discussão.
Acreditamos que se todos soubessem que pode ser fácil e intuitivo acompanhar como o governo gasta NOSSO dinheiro a gente teria um país bem melhor. Vamos oferecer uma plataforma digital que fará a visualização de como o governo federal vem gastando nosso dinheiro, com infográficos e visualizações amigáveis e intuitivas. Vamos também mostrar detalhadamente os gastos do governo e da cidade de São Paulo.
Nosso projeto tem o potencial de alcançar 80 milhões de brasileiros, todos que têm acesso à Internet. Sabemos que não será fácil chegar em todos os computadores, smartphones e tablets conectados. Será uma batalha dura. É por isso que não queremos que o Gastos Abertos fique limitado apenas a São Paulo. Vamos oferecer cursos de capacitação, online e presenciais, para que qualquer um possa levar a estrutura dos Gastos Abertos para todos os cantos do Brasil.
Onde houver governante gastando o nosso dinheiro, vamos lá mostrar para a população que é muito fácil e intuitivo entender o processo para que todos possam cobrar mudanças concretas.
Estamos entre os dez finalistas do Desafio de Impacto Social Google | Brasil, que vai premiar quatro deles com um milhão de reais, e queremos dar o primeiro passo para uma profunda mudança de postura e transformação no Brasil.
A ideia é encabeçada pela Open Knowledge Brasil, uma fundação que já atua em 40 países pelo conhecimento livre. Os cursos e a ampliação do projeto ficarão a cargo da Escola de Dados, um projeto da Open Knowledge que dá condições para qualquer cidadão usar dados, públicos ou não, de forma impactante e relevante. A Open Knowledge Brasil já deu passos importantes apoiando a criação do “Para onde foi meu dinheiro” e criando o “Orçamento ao Seu Alcance” junto ao Inesc.
Vamos expandir, ampliar e melhorar essas ideias. Por exemplo, possibilitando ver como estão gastando nosso dinheiro no nível local, comparando até subprefeituras, como feito em Berlim.
Nada mais próximo às pessoas que mostrar os dados na sua realidade cotidiana, como saber o quanto foi gasto para reformar a escola onde seus filhos estudam, o recapeamento das ruas que usa para ir ao trabalho a construção do hospital na região etc.. Assim a gente consegue transformar um número frio de uma planilha em algo palpável, que todos conseguem se conectar e identificar no seu dia-a-dia.
É essa idéia por trás do projeto Cuidando do Meu Bairro, de geolocalizar os gastos públicos. Esse projeto, hoje na Open Knowledge Brasil, iniciou como trabalho de pesquisa na USP Leste, com o apoio da World Wide Web Foundation, organização de Tim Berners-Lee (o inventor da web) e tem sido utilizado por muitos movimentos sociais da cidade de São Paulo.
Parceria com o PdH para ampliar o alcance
Uma parte dessa mudança começa hoje. Assumimos um compromisso com a comunidade do PapodeHomem caso o nosso projeto seja um dos vencedores.
Queremos que o maior número possível de pessoas tenham contato com o Gastos Abertos. Vamos produzir relatórios e conteúdo sobre o projeto, mensalmente publicados no PdH, para que mais e mais pessoas entrem em contato com os bastidores dos gastos públicos e possam entender o que fazem com nosso dinheiro.
Lançamos esse desafio e provocação porque nós somos a geração da mudança social. Não houve outra época em que estivemos tão informados, tão conectados, tão sensibilizados e tão determinados a fazer o bem. Queremos entender melhor o país onde vivemos para que as mudanças ocorram de baixo para cima, de forma sólida e permanente, para o benefício de todos. É o mínimo que podemos fazer. É o que todos nós merecemos.
Quer ver o “Gastos Abertos” acontecer?
Se achar que nosso projeto merece o seu voto, vote na gente. Leva menos de 30 segundos, é só clicar, não tem cadastro. O prazo se encerra na meia-noite de quarta-feira, dia sete. Vamos, juntos, mudar o Brasil?
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