A possibilidade de se viver abertamente relacionamentos não-monogâmicos é uma das grandes conquistas político-sociais das últimas décadas (especialmente para as mulheres).

Entretanto, é importante ficarmos atentas para as pessoas (especialmente homens) que tentarão se utilizar desse discurso para justificar comportamentos desonestos e abusivos.


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Antes, uma definição e um aviso.

Relacionamentos não-monogâmicos são quaisquer relacionamentos que vão além da normatividade monogâmica da nossa sociedade. (Outros termos usados incluem relação aberta, poliamor, relacionamentos livres, etc. Algumas dessas definições são tão politicamente carregadas que prefiro a expressão mais neutra e mais ampla “relacionamentos não-monogâmicos”.)

Esse texto não é cis heteronormativo. Todos os exemplos e casos se aplicam ou podem se aplicar a relacionamentos entre pessoas de quaisquer identidade, sexo, gênero ou orientação, a não ser quando explicitamente mencionado.

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O principal fator que separa um relacionamento potencialmente abusivo, desonesto, infiel, etc, de um relacionamento não-monogâmico é um pacto prévio consensual articulado explícito. 

O que define que você está em um relacionamento não-monogâmico é JUSTAMENTE esse pacto prévio consensual articulado explícito.

Se uma das pessoas acha ou jura ou afirma que está em um relacionamento não-monogâmico mas a outra não, se essa questão nunca foi explicitamente articulada e decidida, então, não, não estão.

 

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Se você tem um relacionamento, transa com outras, a pessoa com quem você está descobre e continua no relacionamento, e você continua transando com outras, mas vocês nunca tiveram uma conversa explícita sobre limites, segurança, pactos, etc, então, não, o que vocês têm NÃO é um relacionamento não-monogâmico. 

(Por mais que você ache que a outra pessoa aprove — senão, teria ido embora! — você é só uma pessoa que trai a pessoa com quem tem um relacionamento.)

 

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Se existe qualquer possibilidade de mal-entendido sobre se ambas as pessoas estão em um relacionamento não-monogâmico, então não é.

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A razão disso é simples: os relacionamentos monogâmicos são a norma na nossa sociedade. Por isso, eles não precisam necessariamente ser articulados explicitamente. (Embora é bom que sejam.)

Se duas pessoas se encontram, ficam, transam, transam de novo, transam de novo, começam a sair socialmente e encontrar as pessoas amigas umas das outras, e assim sucessivamente, pode bem ser que nunca articulem de forma explícita “sim, estamos namorando”, pois já terão entrado “naturalmente” nesse estado aos olhos delas mesmas e da sociedade que lhes rodeia. 

Pelo mesmo motivo, se uma delas faz tudo isso com a outra (e continua transando com terceiras sem essa primeira pessoa saber) então, sim, é infidelidade. 

Mentir não é só uma ação, mas também uma omissão. Eu me comportar de maneira a gerar uma impressão que sei ser errônea em outra pessoa também é mentira. 

Em nossa sociedade, tudo no comportamento acima presume que as duas pessoas estão em uma relação monogâmica. Então, é desonesto eu criar na outra pessoa essa “impressão de monogamia”, continuar transando com outras e depois ainda me autojustificar dizendo:

“Ué, nós nunca combinamos que estávamos num relacionamento monogâmico!”

A monogamia, como é o relacionamento default da nossa sociedade, não precisa ser explicitamente articulada.

A não-monogamia precisa.

Por isso, duas (ou mais) pessoas só estarão vivendo um relacionamento não-monogâmico se ambas souberem e afirmarem que estão vivendo esse tipo de relacionamento, se tiverem um pacto prévio consensual articulado explícito regulando os limites de cada uma e se houver uma constante disposição para conversá-lo, negociá-lo, redefini-lo.

 

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Há mentiras em qualquer tipo de relacionamento, mas a não-monogamia retira grande parte dos incentivos para enganar, trair, se esgueirar.

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Outro dia, um homem me contou que estava acabando de sair de um casamento aberto de dez anos. Tinha tido várias relações fora do matrimônio e imaginava que a mulher também, mas ele não falava sobre os dele e ela não falava sobre os dela, e tinha sempre ficado por isso mesmo.

Já no primeiro encontro com a futura esposa, aos dezesseis anos de idade, ele afirmou que nunca toleraria um relacionamento que fosse monogâmico. Segundo ele, a moça pareceu não gostar muito e desconversou (era o primeiro encontro!), eles nunca mais falaram nisso, continuaram saindo, depois namoraram, casaram, ficaram juntos dez anos.

(Tenho sempre alguma prevenção contra esse discurso do “eu sou assim, o mundo que se adapte!” O que poderia ser mais egocêntrico?)

Perguntei, para confirmar:

“Que você saiba ela nunca teve outros relacionamentos?”

“Não.”

“Vocês nunca mais falaram sobre relacionamentos não-monogâmicos depois daquela primeira menção em um primeiro encontro quando ambos tinham dezesseis anos?”

“Não, ué. Precisava? Eu já tinha dito que pra mim a monogamia era intolerável.”

 E fui obrigado a dizer:

 “Olha, o que você viveu não tem nada a ver com um relacionamento não-monogâmico. Você simplesmente passou dez anos traindo e mentindo para sua esposa. Aliás, como tantos homens.”

 

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Os homens sempre tiveram o direito de pular a cerca à vontade e, quando são descobertos, a sociedade ainda cai de pau… nas mulheres!, dizendo que têm que perdoar, pelo “bem da família”, porque “homem é assim mesmo”, etc.

Já as mulheres, quando transam fora do relacionamento, viram sinônimo de perversidade e, até pouco tempo atrás, podiam inclusive ser legalmente mortas, e isso tinha até nome, “legítima defesa da honra”, como se a honra do homem residisse no órgão sexual da mulher. 

Por isso, um dos objetivos da instituição “relacionamento não-monogâmico”, como foi concebida e estabelecida no século XX e praticada até hoje, é justamente virar esse jogo:

1. As mulheres ganham o direito de também fazer aquilo que os homens sempre fizeram. 

2. Os homens continuam fazendo o que sempre fizeram, mas agora dentro do contexto de um pacto prévio consensual articulado explícito que reconhece a mulher como parceira igualitária e com poder de veto.

 

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 Para viver relacionamentos não-monogâmicos, é preciso muita empatia e muita alteridade, sempre se colocar no lugar do Outro, sempre articular nossas fraquezas e nossos limites, sempre acolher as fraquezas e os limites das nossas pessoas parceiras.

Ou seja, é preciso pensar e agir de forma ética do começo ao fim.

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Uma situação tristemente comum: duas pessoas estão na paquera e uma delas revela:

“Olha, preciso te dizer que sou casada.”

E a outra diz:

“Não tem problema, não sou ciumento, hehe.”

“Ok, ótimo. Deixa então eu ligar pro meu companheiro e avisar que estou indo pro motel com você.”

“Opa, como assim? Ele sabe? Ih, tô fora, ficou estranho!”

É impressionante quantas pessoas estão dispostas a cornear “otários” ao mesmo tempo em que querem distância de relacionamentos não-monogâmicos consensuais e às claras.

 

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Para os homens, é muito fácil articular o discurso “relacionamentos não-monogâmicos” só para “sair pegando geral”.

Uma moça solteira me contou ter terminado recentemente um relacionamento frustrante com um artista plástico inteligente, pretensamente pró-feminista, descolado, sensível, de esquerda, etc etc… e casado.

Na hora de seduzi-la pela internet, o assunto “monogamia” surgiu bastante. Que ele vivia um casamento aberto avançadinho, que ela era careta, que precisava se abrir, como podia uma mulher tão interessante ter ideias tão antiquadas, esse papinho. 

As barreiras da minha amiga foram caindo e ela se dispôs a ir visitá-lo em sua cidade. Naturalmente, estava esperando um pouco de atenção, que ele mostrasse a cidade, que passeasse com ela, que dormissem juntos, etc etc.

Mas o moço ó-tão-importante, do alto de sua movimentada agenda, podia conceder a ela somente uma audiência de duas horas no motel.

O resto do tempo, infelizmente, estava tomado por trabalho ou pela família.

(Quando ela perguntou se iriam poder passear juntos no domingo, ele quase riu: “imagina, domingo com a mulher e os filhos é sagrado pra mim!” Quando ela pediu para falar com a mulher dele, ele negou: “ela não gosta de saber dos meus casos.”) 

Depois de gastar mais mil reais por uma ida de duas horas a um motel e um fim-de-semana de solidão em uma cidade estranha, minha amiga voltou pra casa frustrada mas ainda apaixonadinha. Demorou algumas semanas para se dar conta de que tinha caído em um golpe tristemente comum.

Quando enfim terminou com o “grande artista”, ele ficou enraivecido e disse que ela era uma mulher coxinha e moralista que não tinha cacife para estar com um homem livre e arrojado como ele.

Tá.

 

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Homem casado dizendo que seu casamento é aberto só para “pegar geral” já se tornou uma coisa tão comum que eu recomendo cautela para todas as pessoas querendo começar relacionamentos com homens que dizem isso.

Naturalmente, todos os homens que de fato estão em relacionamentos não-monogâmicos também falam isso e não é o caso de jogar todo mundo no mesmo saco.

Entretanto, como essa mentira em particular já está disseminada, é caso de acreditar-desacreditando e discretamente levantar a ficha do casal: já escreveram ou se manifestaram publicamente falando de não-monogamia, fazem parte de grupos ou associações de não-monogamia, etc.

No Brasil de hoje, onde a canalhice é muito mais comum que a não-monogamia, se um homem que diz que está em relacionamento não-monogâmico não puder, de alguma maneira, comprovar que está de fato em um relacionamento não-monogâmico, eu diria que o mais provável é que esteja mentindo. 

 

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Houve época em que eu me envolvia com pessoas em relacionamentos monogâmicos, e ainda racionalizava:

“Minha relação é com ela, não sou responsável pelo seu compromisso com uma terceira.”

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Namorei uma pessoa casada, linda e inteligente, que mentia e inventava, se virava do avesso e fazia muitos sacrifícios… para poder transar comigo. Como não me sentir lisonjeado? Afinal, ela deveria gostar muito de mim, não? Meu ó-tão carente ego só faltava ronronar de prazer quando ela entrava pela porta, estalando seus saltos altos.

Mas a verdade é que ela dormia todas as noites com outra pessoa. Mentia para a pessoa-que-estava-com-ela de forma perversa e descarada, mas, ainda assim, era com ela que sonhava sonhos, subia serra, assistia séries. E o meu ó-tão carente ego passava as noites uivando para a lua, triste e apaixonado, querendo falar com ela mas proibido de telefonar fora do horário comercial.

Por fim, depois de muitos e muitos anos, apesar de ainda amá-la demais, apesar de ainda amá-la hoje, fiz o que tantos amantes na história fizeram: terminei eu mesmo o relacionamento. Porque percebi que nunca poderíamos construir nada.

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Eu jamais conseguiria confiar em alguém capaz de passar vários anos mentindo para a pessoa mais próxima a ela.

Que aliás, tristemente, não era nem nunca fui eu.

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Decidi que queria viver sem mentiras – e sem pessoas mentirosas.

Hoje, as pessoas que caminham ao meu lado são donas dos seus desejos, capazes de assumi-los e articulá-los, livres para se colocarem publicamente no mundo como minhas companheiras.

Paradoxalmente, depois dessa decisão, fui ameaçado de morte, acionei polícia e advogados, e tive até sair da cidade por uns tempos porque me relacionei com uma pessoa que disse que era solteira, mas na verdade tinha um relacionamento monogâmico com uma outra pessoa. 

Escaldado por esse caso, eu confio em todo mundo a priori, mas, para pular na cama com alguém, mesmo eu sendo homem, preciso antes dar uma excelente levantada na ficha da pessoa. 

 

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Um homem em um namoro aberto estava se relacionando com uma mulher em um casamento aberto. Saindo do cinema, ele quis andar de mãos dadas, mas ela se recusou: mesmo estando em um cinema quase vazio, num dia de semana, do outro lado da cidade, tinha medo de ser vista, de ser falada.

O homem me contou essa história indignado, achando que eu validaria sua indignação:

“Por que essas mulheres são tão reprimidas, Alex? De que adianta sermos os dois seres humanos livres, em um relacionamento não-monogâmico consensual, ambos em relacionamentos com outras pessoas que sabiam de tudo, se não podemos nem dar as mãos?! Não é um pedido justo a se fazer? Dar as mãos?”

E respondi:

“Se você é um homem que nunca se colocou na pele de uma mulher nem por um minuto e está somente vendo o seu próprio lado, sim, é um pedido justíssimo. Infelizmente, se calha de alguém ver vocês de mãos dadas no cinema, duas pessoas que estão em outros relacionamentos públicos, você vai receber high-fives na copa da empresa, por estar “pegando uma gatinha num cinema de subúrbio”. Já ela, provavelmente, vai ficar marcada para sempre como a “puta da contabilidade”. Daí o fato de ela estar um pouquinho mais preocupada com isso do que você…” 

 

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Vivemos em uma sociedade profundamente machista, onde os direitos e os deveres de homens e mulheres são profundamente assimétricos. Um homem que queira se relacionar de forma ética e igualitária com mulheres precisa ter isso sempre em mente para não virar (nem que por descuido) um babaca.

A assimetria está em tudo, inclusive na própria língua que todas falamos. 

Quase todos os xingamentos para homens são questionamentos de que não transam o suficiente com mulheres — provavelmente por serem homossexuais; por outro lado, quase todos os xingamentos para mulheres são questionamentos de que transam demais.

O “aventureiro” é o homem audaz que vive aventuras. A “aventureira” é a puta.

“Pistoleiro” é um homem que atira com pistolas. “Pistoleira” é puta.

“Vagabundo” ou “vadio” é um homem que não trabalha. A “vagabunda” ou “vadia” é uma puta.

“Cachorro”, “galo”, “touro” são alguns dos animais mais importantes na história da humanidade. “Cachorra”, “galinha”, “vaca”? Puta, puta, puta. 

Por fim, “puto” é um homem indignado, irritado.

Já “puta” é puta.

(E não que tenha nada de errado com isso.)

Todas as pessoas que querem se envolver em relacionamentos não-monogâmicos precisam ter sempre esses exemplos em mente. 

Porque, na nossa sociedade machista, quando se revela que um homem está em um relacionamento não-monogâmico, dependendo do grupo, ele pode ficar com fama de garanhão ou, em alguns casos, de corno.

A mulher sempre fica com a mesma fama.

De puta.

Então, por um lado, é importante revelarmos nossos relacionamentos não-monogâmicos e sermos ativistas por uma maior desprivatização das relações humanas. Afinal, a questão não é só pessoal, é política. 

Mas, por outro lado, é fundamental lembrarmos que, em termos de danos à reputação social e possíveis sanções profissionais e familiares, o preço mais alto será sempre pago pela mulher. 

Por isso, em minha opinião, a decisão de sair em público como estando em um relacionamento não-monogâmico deve sempre ser da mulher. 

 

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Às vezes, quando falo sobre essa importância do diálogo, alguém comenta:

“Meu Deus, quem aguenta tanta falação? Assim fica inviável ter um relacionamento!”

E eu respondo:

 “Ninguém disse que era fácil ter uma vida sexual e agir de forma ética ao mesmo tempo. Ainda mais quando se está querendo ir contra o padrão da sociedade. Se você quer só sair “pegando geral”, é mais fácil e mais eficiente ser solteiro. Mas, se está em um relacionamento (e um relacionamento não-monogâmico é, antes de tudo, um relacionamento) é preciso sempre pensar, agir, falar de forma ética em relação às necessidades, fraquezas, limites, desejos das pessoas que estão com você. Aliás, mesmo sendo solteiro, é bom agir do mesmo jeito com as pessoas com quem você transa, né?”

 

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Quando me perguntam qual é o “segredo” para relações não-monogâmicas “darem certo” (não vou nem entrar em como é problemática essa questão de “dar certo”) eu digo o seguinte: 

Des-estigmatizar a DR. (DR=Discutir a Relação)

O pacto monogâmico é pret-a-porter. É um software fechado da Apple. Já vem prontinho, apoiado por milênios de bíblias, tias chatas, padres metidos e manuais sobre como “blindar seu casamento”. Não pode abrir, não pode olhar lá dentro, não pode mudar a programação. 

Por isso, é natural que a DR seja encarada com terror. Se o pacto está dado como fechado e indiscutível, qualquer tentativa de discuti-lo já indica, por definição, necessariamente, uma crise. 

Os relacionamentos não-monogâmicos, entretanto, com sua infinidade de pactos e arranjos possíveis, são um software livre por definição. Eles PRECISAM e ESPERAM a nossa interferência. Eles só funcionam se forem criados e recriados por cada pessoa todos os dias, sempre em parceria com as outras pessoas com quem estão se relacionando. 

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Uma vez, uma moça me disse que tinha virado adepta de relacionamentos não-monogâmicos porque achava que assim tinha menos chances de perder o parceiro para outra mulher.

Eu respondi que respeitava essa razão, mas que achava meio difícil de comparar esses riscos.

Não existe nenhuma segurança nesse mundo. A qualquer instante, podemos morrer, nossa companheira nos deixar, nosso chefe nos demitir, um meteoro bater na terra.

Meu problema com a monogamia é que ela nos vende uma falsa segurança (de que se formos fiéis, se mantivermos o sexo apimentado, se fizermos tudo direitinho, nunca vamos perder a pessoa com quem estamos) enquanto os relacionamentos não-monogâmicos nos forçam a encarar de frente, abraçar, acolher, vivenciar essa falta de segurança primordial que define a condição humana.

Por causa disso, mais ainda, é necessário muita DR.

É preciso estarmos abertas para conversar sobre o relacionamento sempre. É preciso conseguirmos articular nossas fraquezas e limitações. É preciso conseguirmos acolher as fraquezas e limitações das pessoas com quem estamos.

É preciso que tudo esteja muito bem acordado e comunicado. É preciso que não existam mal-entendidos. É preciso que ninguém saia da cama se sentindo uma vítima.

Porque, se alguma pessoa saiu da situação se sentindo suja, vitimizada, abusada, então, não foi nem uma relação não-monogâmica.

Foi uma relação de abuso.

 

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Esse texto é parte da Prisão Monogamia.

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Três avisos importantes sobre meus textos

Eles falam sempre sobre e para as pessoas privilegiadas, justamente para tentar fazê-las ter consciência de seus enormes privilégios (Leia também Carta aberta às pessoas privilegiadas & Ação de graças pelos privilégios recebidos);

Buscam sempre usar uma linguagem de gênero neutra (Para mais detalhes, confira meu mini-manual pessoal para uso não sexista da língua);

E são sempre todos rigorosamente ficcionais(Ou não: Alex Castro não existesó o texto importa. Em caso de dúvidas, consulte minha biografia do meu site pessoal.)

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O encontro “As Prisões”

Há doze anos, escrevo sobre as bolas de ferro mentais e emocionais que arrastamos pela vida: as ideias pré-concebidas, as tradições mal-explicadas, os costumes sem-sentido.

Agora, estou promovendo o encontro As Prisões. O público-alvo são ovelhas negras em busca de interlocutores. O encontro oferece a oportunidade de passarmos o dia inteiro trocando histórias, compartilhando vidas, debatendo perplexidades. Ao final, nós, todas as pessoas, estamos exaustas, gastas, esvaziadas. Confusas, atarantadas, chacoalhadas.

O encontro As Prisões é independente por ideologia. Não possui vínculo institucional algum. É divulgado pela internet de forma alternativa e realizado em praias, parques, quintais, praças. Oferece frutas e castanhas para comermos ao longo do dia e tem um intervalo para almoço. Começa sempre às nove da manhã de sábado ou de domingo e termina na hora que terminar. Muitas vezes, a química é tanta que não queremos ir embora: o encontro mais longo durou 15 horas.

O encontro é pago. Mas negar uma pessoa só porque ela não pode pagar seria dar importância demais a essa convenção arbitrária que chamamos dinheiro. Portanto, algumas pessoas pagam, outras pagam menos, outras não pagam. Na prática, as que pagam me possibilitam fazer o encontro para as que não pagam. Nada poderia ser mais solidário do que isso. (Para saber mais, consulte a política de gratuidades.)

Não é auto-ajuda, terapia, coaching. Não é palestra, aula, exposição de conteúdo. Não tem apostila, powerpoint, frases de efeito pra anotar no moleskine. Não oferece respostas, soluções, remédios. Não promete uma vida mais calma, mais centrada, mais bem-sucedida.

Não ajuda em nada. Pelo contrário, só atrapalha. Às vezes, nos transforma em pessoas ainda mais confusas, desajustadas, perdidas. Afinal, ser bem-sucedida e bem-ajustada em um mundo canalha pode bem ser indicativo de nossa própria canalhice.

Para mais detalhes, vídeos, depoimentos, calendário completo, tudo isso, veja aqui.

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Todas as ilustrações desse texto são representações da Deusa da Fertilidade.

 

Alex Castro

alex castro é. por enquanto. em breve, nem isso. // esse é um texto de ficção. // veja minha <a title=quem sou eu