Já faz mais de 10 anos que criei meu primeiro blog. Eu não queria ficar famoso, virar escritor ou ter uma legião de seguidores. Tudo o que queria era transmitir uma ideia que achava interessante. Escrever foi apenas o jeito que arrumei para fazer isso.
Nos tempos atuais, poderia ser um canal no Youtube, um podcast ou uma página no Facebook cheia de memes. O que sempre importou foi a ideia, o meio é secundário.
Eu nunca aprendi a escrever de verdade. Meu ensino médio foi pobre e nunca fui o aluno mais aplicado. Todas as regras e exceções da língua portuguesa nunca entraram na minha cabeça. Sentado na sala de aula vendo a professora falar, nada daquilo fazia muito sentido.
Ao longo de tantos anos escrevendo, posso dizer que tais regras nunca me fizeram falta. Com a prática e a repetição, fui entendendo o lugar que cada regra deveria ser aplicada, aprendendo de forma orgânica o que não consegui aprender num modelo mecânico de aprendizado.
Mas de vez em quando surge alguém que não compreende a proposta, alguém que não entendeu o texto e comenta apenas para apontar “não tem crase ali”, “aquela virgula está errada” ou qualquer outra forma de apontar um erro que no fim, não fez a mínima diferença.
Vez ou outra recebo um email fazendo uma correção – não solicitada – do meu texto. Não acho isso ruim, é exatamente quando aprendo sobre meus erros e tenho a oportunidade de melhorar. No entanto, é muito claro quando a postura da outra pessoa está em ajudar, ou quando tudo o que ele fez foi tentar te rebaixar para sentir-se superior.
Hoje tenho mais maturidade para lidar com isso, mas quase parei de escrever algumas vezes com medo das críticas e achando que nada nunca sairia bom.
É estranho como em meio à tantos elogios e comentários bacanas, aqueles poucos críticos tenham um impacto tão grande em nosso psicológico.
A caridade em primeiro lugar
Estudando um pouco sobre a lógica do debate, me deparei com uma ideia que parece esquecida no mundo moderno. Num debate lógico, existe um princípio básico chamado “Princípio da Caridade”. Quando alguém está julgando o argumento fornecido, é imprescindível que a pessoa analise o que o outro lado quis dizer, não o que foi dito.
Em tempos de discussões acaloradas, quando estamos todos procurando uma forma de vencer a discussão, pode parecer difícil agir desta forma, mas é o único jeito honesto de julgar uma ideia.
A maioria dos comentários apontando erros estão falando de problemas que em nenhum momento afetaram a lógica do argumento. Que mesmo “errado”, o significado ficou bastante claro.
É muito mais fácil lidar com esse tipo de crítica após alguns anos expondo meu trabalho num site com milhões de leitores. O triste é como as pessoas fazem o mesmo com quem que está apenas começando, com gente que nunca mais escreverá uma linha depois de uma correção arrogante e público.
É fácil acertar quando não se expõe
Uma das características que pude observar nas pessoas que ficam apontando erros por aí, é que elas raramente produzem alguma coisa.
Levei certo tempo para entender isso, mas pensando com calma, é muito difícil encontrar pessoas extremamente críticas, mas que ao mesmo tempo produzam trabalhos que sejam avaliados publicamente. O critério que aplicamos aos outros costuma ser o padrão que também exigimos de nós mesmos.
Dificilmente alguém que escreve com frequência irá reler um texto e não encontrar um erro. O perfeccionista irá desistir com frustração logo após algumas revisões. Em resumo, é mais fácil saber a regra do que aplicá-la com frequência.
Estou envolvido com artes marciais faz algo em torno de vinte anos, e se existe algo que pude aprender, é que não existe como alguém que treina alguma atividade física ser perfeccionista. Precisei repetir centenas de milhares de chutes errados, para conseguir dar o primeiro chute certo. Não existe atalho.
Qualquer atleta que cair na armadilha da autocrítica exagerada acabará lesionado ou frustrado. É preciso entender que o aprendizado é um processo resultante da experimentação, da tentativa, erro e observação.
O mesmo é verdadeiro para textos, vídeos e qualquer outra forma de criação. Só é possível melhorar tentando – e errando – milhares de vezes.
Duas formas de aprendizado
A forma como somos educados nos causa uma impressão errada de como o processo realmente funciona. Entramos na escola muito cedo, muitas vezes antes de conseguir falar, e somos guiados por mais de doze anos por professores falando na frente de um quadro negro. Após completar este ciclo, vamos para universidade onde devemos – por meio de um processo similar – desenvolver uma profissão.
A ideia por trás de tudo isso é que devemos primeiro absorver o conteúdo teórico, para depois buscar aplicações práticas para o que estamos estudando.
Mas existe um outro modelo de aprendizado, o que Nassim Taleb chama de Não-Nerd-Aplatônico: o Nerd é aquele que ao tentar aprender um idioma, passará meses lendo regras gramaticais, até o dia em que estará frente a um estrangeiro e não conseguirá se comunicar. Algo similar ao que todos sentimos com o inglês do ensino-médio.
O Não-Nerd, é aquele que se aproveita do processo inverso. Para aprender uma língua, sentará num bar no centro de Helsinki e tentará conversar com o carinha do bar, discutir o resultado do jogo de hockey com o taxista ou perguntar direções para alguém numa esquina movimentada. Só depois de se expor ao mundo real, o segundo exemplo irá buscar um livro de gramática, simplesmente para melhorar o que já foi aprendido.
Todos vamos errar
Me livrei do medo de errar apenas observando o mundo. Após ler uma centena de livros, pude entender que até grandes obras, que passaram por rigorosa revisão, com frequência trazem erros.
Eu normalmente leio um texto dez vezes antes de enviá-lo ao editor, que também lê outras várias vezes. Erros, de forma alguma, são representação da falta de esmero, mas é comum que para quem está envolvido na obra que ele passe despercebido. Seja por vício na forma que lê a própria obra ou simplesmente por não ter conhecimento do que está errado.
Ao ler as anotações originais de Isaac Newton, um dos maiores gênios da humanidade, podemos encontrar inúmeros erros de matemática básica, simples contas que qualquer um de nós acertaria. Nada disso desmerece o resultado maior, o desenvolvimento do Cálculo e toda mecânica newtoniana que permitiu um enorme salto cientifico. O resultado final é maior que pequenos deslizes.
Outro grande pensador da humanidade trazia uma postura similar aos erros. Henri Poincaré, prolífico filósofo científico e matemático, recusava-se a corrigir os erros gramaticais e de tipografia que eram encontrados em suas obras, mesmo depois de reconhecidos. Ele tinha pressa em transmitir suas ideias e acreditava que voltar em textos prontos para corrigi-los era um mau uso do seu tempo.
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É muito difícil lidar com críticas, principalmente porque normalmente são acompanhadas de um ar de superioridade, da tentativa daquele que não cria em subjugar aquele que se esforça para produzir.
A única arma que resta para quem não se expõe ao erro, é diminuir aquele que está recebendo os elogios do esforço. Para lidar com isso, podemos seguir uma simples regra e aplicar para vários aspectos criativos da vida: não aceite críticas de alguém você não contrataria para fazer o que está fazendo.
E você? Como faz para aprender e errar, sem se incomodar com as críticas exageradas ou com aqueles que não possuem nada a acrescentar, aqueles que estão ali apenas para diminuir o seu trabalho? Compartilhe conosco e nos ajude a crescer.
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