Todo mundo sabe a sensação de colocar uma música pra tocar e ter aquela rejeição, vontade de pular a faixa ou de desligar o som.

Quando você é o artista em questão, então, posso afirmar que é pior ainda. A última coisa que você quer é que alguém faça isso com seu material.

Como escritor, compositor e artista, meu maior objetivo, certamente, é fazer algo bom.

Fodido de bom.

Pra isso, junto o máximo de referências que posso, estudo, compro material e dedico muito, mas muito tempo.

Se você tem alguma ambição criativa, seja na profissão ou mesmo como hobby, talvez se identifique com essa ansiedade.

Eu fui por muito tempo um cara que tendia a repudiar novidades que soassem como modinha pra mim.

Passei um período bitolado em apenas um tipo de música, achando que ela e apenas ela era a melhor e todo o resto era horrível e deveria soar mais como aquilo. Esse padrão se repetia em outros interesses também. Cinema, livros… pode escolher.

Errei feio e rude por muito tempo. Perdi tanta coisa que hoje olho e penso no quanto de riqueza temos ao nosso redor mas acabamos não aproveitando, dominados por preciosismo quanto a formas feitas em décadas passadas.

Agora, estou em um momento no qual eu preciso tirar coelhos da cartola, compondo e produzindo. Eu entro em uma pilha autocrítica e preciso me esforçar bastante para aceitar meu material e achá-lo pelo menos “publicável”, seja texto ou música.

Falando especificamente das minhas músicas, elas às vezes não me parecem interessantes o bastante. É como se soassem corretas, no lugar, mas não necessariamente capazes de despertar curiosidade, de fazer você levantar o ouvido e querer saber o que vai acontecer. Estar nesse ponto é algo que vira uma espiral. Suas ideias parecem cada vez mais cansativas à medida que você tenta trabalhá-las e aí a lama só fica mais densa.

Eu acredito bastante que compreender a técnica ajuda a tirar ideias do papel e tornam você capaz de realizar, produzir mais. Porém, ultimamente venho me deparando com os limites de (tentar) ser apenas bom.

Em primeiro lugar, “bom” é algo completamente subjetivo. Não há formas corretas de fazer praticamente nada nessa vida. O que nós queremos é algo que funcione. Se um texto prendeu, entreteve, levou você a refletir e gerou algum impacto, então não importa se ele tem erros gramaticais ou não. A mensagem chegou, ele fez o seu papel.

Claro, escrever “certo” ajuda. Mas o mundo está cheio de escritores que cagam pro que é esperado, imprimindo ritmos, formas e imagens pouco usuais o tempo inteiro.

No Papo de Homem, um dos meus autores favoritos é o João Baldi Jr, justamente pela forma diferente com a qual ele escreve seus artigos. Além do humor, ele encadeia frases e vai colocando subcomentários de uma forma que pode parecer distração mas que no caso dele gera camadas e mais camadas de ironia e sarcasmo, como se tivessem sido tiradas de um roteiro de Friends. É sensacional.

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Usei aqui o exemplo do texto, mas o raciocínio pode se estender a outras formas de arte e entretenimento também.

Na pintura, Picasso primeiro compreendeu a técnica com perfeição. Os trabalhos do começo da sua carreira são o que nós (ainda mais nesses tempos meio esquisitos) jamais abriríamos a boca para apontar um defeito.

Retrato da mãe de Picasso, feito por ele em 1896.

Porém, Picasso é lembrado muito mais pelos seus trabalhos mais tardios, suas explorações e quebras de convenções por meio do cubismo e sua personalidade exótica.

Mas é da Guernica que todo mundo lembra

Nós ficamos intrigados pelo que é novo, único. Quando nos deparamos com algo inusitado, não conseguimos evitar o interesse, queremos resolver a dissonância cognitiva gerada por aquilo.

Pode observar, temos uma indústria de entretenimento inteira baseada nisso. Jornais, redes sociais… eles literalmente fazem a vida arremessando novidades em nós e nos mantendo presos./p>

Aqui vem o conselho pra mim mesmo: quando estiver criando ou finalizando algo, coloque na mistura pelo menos um elemento intrigante, algo que adicione frescor, que fuja do óbvio e soe novo, diferente. Tenha sempre na manga aquele tempero especial, uma pimenta, algo que sirva para manter o interesse operando. Uma disrupção no ritmo, um silêncio, algo que quebre a expectativa.

Não é preciso muita coisa. Você não precisa também exagerar ao ponto de parecer completamente fora de lugar.

O “segredo” está em criar misturas e texturas que aticem a curiosidade e prendam a atenção. Não precisa fazer escândalo. Na verdade, se exagerar, você corre o risco de assustar ao invés de atrair. O que também não é nenhum problema, vai depender do que você está tentando fazer.

Mas evite o lugar comum.

A questão é que se você está fazendo tudo certo e o resultado está bom, as chances são grandes de que você está justamente oferecendo mais do mesmo.

“Bom” é, muitas vezes, só um outro nome pra “comum”.

Ouça meu EP De Volta pra Casa

Acabei de lançar um EP chamado De Volta Pra Casa. Se quiser me fazer feliz, não economize nas palmas aqui embaixo mas também ouça minhas músicas, deixe um recado, siga minha página ou no Spotify. Assim eu garanto que você faz o meu dia. 🙂

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Nota: este texto foi originalmente publicado no meu Medium.

Luciano Ribeiro

Cantor, guitarrista, compositor e editor do PapodeHomem nas horas vagas. Você pode assistir no <a>Youtube</a>