Em 1995, eram mais de 152 milhões de homens, em todo o mundo, em quadros de disfunção erétil. A estimativa é que em 2025 esse número chegue a 322 milhões – especialmente em países em desenvolvimento pela África, Ásia e América do Sul.

É um Brasil e meio de homens que não conseguirão viver sua sexualidade de forma saudável e serena. E olha que os números só contabilizam disfunção erétil.

A verdade é que a estimativa é joia rara – é extremamente difícil achar dados confiáveis, que esclareçam metodologia e abrangência, sobre disfunções sexuais masculinas. Dá para imaginar que isso se deva, entre vários possíveis motivos, também ao tabu associado ao assunto – quantos homens reportam estarem passando por problema do tipo?

Fato é que os números que temos, ainda que, creio, menores do que a realidade, já são alarmantes. Não só por serem altos, mas também por estarem aumentando em ritmo acelerado.

Não por coincidência, arrisco dizer, a expectativa de vida dos homens brasileiros, por exemplo, apesar de estar em crescimento, continua menor do que a das mulheres. Além disso, apesar dos avanços da ciência médica e da nossa qualidade de vida, a qualidade do esperma vem caindo ao longo dos anos – e esta é uma tendência mundial.

O cenário pareceria pessimista, não fosse pela disposição que homens têm mostrado para repensar suas identidades, o modo como nos relacionamos e sua autopercepção. A sexualidade é só mais um dos componentes de uma vida, bem como relacionamentos interpessoais, trabalho, conquistas e desejos.

Se a velha cartilha da masculinidade associava o valor de um homem aos seus poderes – sexual incluso -, novas discussões têm delineado valores mais humanos, reais e possíveis para a masculinidade. Dentro disso, podemos ter discussões mais sinceras sobre o modo como nos relacionamos, como cuidamos uns dos outros e de nós mesmos e sobre nossa saúde e sexualidade.

Mas não nos enganemos – colocar disfunção sexual sob o guarda-chuva único e muitas vezes raso das “pressões masculinas” é um erro. Um olhar integrativo sobre saúde é essencial aqui, uma vez que para pensar disfunção sexual é necessário pensar, sim, a masculinidade, mas também o modo de vida que temos levado e nossas condições de saúde orgânicas neste século.

Além disso, eu não poderia começar sem dizer que a definição do que é ou não é disfuncional é um tanto quanto arbitrária.

Em se tratando de saúde sexual, pode ser difícil trabalhar com números e precisão. Para tais efeitos, é importante saber que é disfuncional aquilo que interfere na satisfação de uma pessoa e seus/suas parceiros/as, considerando-se uma margem razoável de “normalidade”. Ou seja, se você acha que ejacula muito cedo ou muito tarde, mas este fato não vem incomodando nem a você, nem aos seus/suas parceiros/as, isto não é necessariamente disfuncional para a sua pessoa.

Este artigo nasceu de muita pesquisa, alguma experiência minha de estudo e lida com saúde reprodutiva e também as contribuições do Dr. Claudio Murta, urologista do Grupo Americas Serviços Médicos com experiência clínica em disfunções sexuais. O que aqui se pretende é desfazer mitos e tabus por meio de um apanhado de informações úteis sobre o assunto, bem como oferecer e despertar fagulhas e questionamentos que gerem discussão e vontade de conversa entre os homens. Vamos comigo?

Disfunção erétil ou “não consigo ter ereção”

A disfunção erétil caracteriza-se pela repetida incapacidade de um homem atingir ou manter ereção rígida o suficiente para que a transa seja satisfatória para todas as partes.

A brochada ocasional é comum e pode ter diversos motivos, mas não é disfunção erétil. Por outro lado, manter repetidas relações que acabam em ejaculação, mas nas quais a rigidez da ereção é insatisfatória para uma das partes pode ser disfunção erétil.

Entre homens, rola o papo de que situações de tensão podem dificultar as coisas. Aí, então, uma vez acontecido, o medo de falhar leve à repetição da falha, numa bola de neve sem fim. A máxima é verdadeira, principalmente para homens jovens, com menos de 40 anos. Neles, a principal causa da disfunção é psicológica – e é nesse sentido também que deve seguir o tratamento.

Curiosamente, o próprio processo fisiológico de ansiedade, com a liberação de altos níveis de adrenalina, pode causar constrição dos vasos sanguíneos e dificultar uma possível ereção.

Mas talvez te surpreenda saber que, após os 40 anos, a maioria das causas são orgânicas. Após esta idade, 50% dos homens vão experimentar algum grau de disfunção erétil, seja em grau leve ou totalmente comprometedor da ereção.

Então, é importante cuidar da saúde, porque o sintoma majoritário que causa impotência é o não preenchimento suficiente do corpo do pênis com sangue – processo que acontece em homens saudáveis devidamente estimulados, resultando em ereções plenas. Mas é importante observar que isso é um sintoma, não a causa. Se algumas possíveis causas são psicológicas, a pergunta que fica é: quais as possíveis causas orgânicas?

O Dr. Claudio explicou que doenças como hipertensão, diabetes e hábitos nocivos como má alimentação, sedentarismo e tabagismo são possíveis respostas. A questão é que causam um processo de entupimento das artérias – o que chama-se aterosclerose – e, se isso pode te render um infarto por entupimento das artérias do coração, também pode te render disfunção erétil por entupimento das artérias que levam ao pênis.

Neste caso, claro, a mudança de hábitos é essencial, mas intervenções médicas e medicamentosas também estão disponíveis. Drogas vasodilatadoras como o conhecido Viagra podem ajudar nestes casos – porém, podem ser perigosas para quem tem aterosclerose e não devem ser tomadas sem recomendação médica -, bem como implantes penianos.

Mas é importante manter em mente que idade pode trazer uma mudança de paradigmas, e não só após os 40. Quando falamos de sexualidade na terceira idade, então, é importante levar em conta que as expectativas e o modo de se relacionar têm de mudar, mas as lições provenientes disso podem ser bastante úteis para parceiros de todas as idades – afinal, o que é transar?

Baixa libido, anorgasmia e saúde

Link Youtube | Reunimos o Dr. Claudio Murta, urologista pelo Grupo Americas Serviços Médicos e o Claudio Serva, fundador do @prazerele, para conversarmos sobre o que a sua vida sexual diz sobre a sua saúde. Agradecimentos à PRAVY pelo espaço e pela força!

Não é preciso, no entanto, ser diagnosticado com disfunção erétil causada por graves problemas circulatórios para repensar nossos hábitos de saúde.

Recorrente falta de disposição para transar, dificuldade para ter orgasmos, diminuição do desejo sexual e da qualidade do esperma são queixas mais recorrentes, mas menos comprometedoras, que podem seguir encobertas e ignoradas por anos, mas não deveriam.

Dr. Claudio lembra que estas disfunções podem ser causadas por medicações em uso, envelhecimento, cirurgias e por causas psicológicas. No entanto, nossa sexualidade pode refletir como estamos cuidando de nós mesmos. Vale trazer à tona, então, outras possíveis causas.

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Sedentarismo e alimentação inapropriada, cheia de ultraprocessados e fontes de açúcares, podem levar a diversos quadros que constituem o que chamamos de síndrome metabólica – o que acontece é que dificuldades na digestão de açúcares causam no corpo inflamações constantes e consequentes desequilíbrios hormonais que podem causar queda na libido e interferir na síntese e quantidade de testosterona no sangue.

É possível que se leve vida sexual aparentemente comum sob estas condições, mas o comprometimento da saúde hormonal está, com certeza, custando para sua performance.

Outro fator quase incontornável que está também sendo cogitado como possível causa para a queda na qualidade do esperma dos homens contemporâneos é nossa excessiva exposição, nos dias de hoje, a substâncias que chamamos disruptores endócrinos – plásticos e outros químicos presentes em cosméticos bastante usados, como xampus, que têm ação moduladora estrogênica. Em mulheres, isso vem causando grande número de ciclos irregulares, dolorosos e inflamatórios. Em homens, estes aumentados níveis estrogênicos também interferem em seu ritmo metabólico e equilíbrio hormonal sexual.

Estados de estafa por estresse ou excesso de atividades tendem a naturalmente prejudicar nossa disposição e desejo sexual por se tratarem de escassez de energia. Em termos orgânicos, também é importante lembrar que o sentimento de estresse está ligado à produção do hormônio cortisol, que é esteroide assim como os hormônios sexuais – são sintetizados a partir de substâncias similares. Portanto, produções cavalares de cortisol para alguém que está constantemente estressado podem afetar diretamente a produção de testosterona, que deve cair.

Quadros psicológicos de depressão e a maioria de seus tratamentos medicamentosos, por sua vez, também podem interferir na libido e sensibilidade erógena, causando sua diminuição e consequente perda de interesse sexual.

Estas últimas são realidades mais difíceis de serem contornadas por envolverem não só uma incapacidade ou comprometimento da performance sexual, mas sim a ausência ou redução do desejo de exercer a sexualidade em si. Se há vontade de retomá-la, os pontos de apoio precisam ser múltiplos: parceria nas relações, conversas honestas, ajuda médica, medicamentosa e psicológica.

Ejaculação precoce: a mente inquieta

Se subestimar causas orgânicas para disfunções sexuais é um erro, o mesmo pode-se dizer sobre ignorar pressões psicológicas sobre a performance.

Ejaculação precoce é uma disfunção sexual que acontece quando o tempo de atividade sexual até a ejaculação do homem é recorrentemente insatisfatório para si ou para seu/sua parceiro/a.

Não há aqui definição exata de tempo mínimo ou máximo para a atividade – a questão é a incapacidade do homem de conduzir a transa do modo desejado, perdendo o controle. Via de regra, o processo fisiológico da ejaculação e do orgasmo estão funcionando como deveriam, o que torna a disfunção um sintoma de um quadro de níveis bastante elevados de ansiedade.

Há algumas possíveis causas orgânicas para o problema como hipersensibilidade da glande, prostatite, alterações da serotonina e problemas da tireoide. Nestes casos, tratamentos que resultem em diminuição da sensibilidade ou cuidem das causas primárias do sintoma são utilizados – estamos falando aqui em antidepressivos e analgésicos.

Mas a verdade é que, na maioria dos casos, as causas são psicológicas. Uma mente ansiosa e com medo de entregar ou perder o controle acaba por autossabotar-se, interrompendo o curso da transa.

A chave aqui é, novamente, parceria – conversar sobre o assunto com quem está com você nessa e buscar ajuda é essencial. Psicólogos e profissionais que cuidam da saúde mental podem ajudar, bem como terapeutas sexuais. Não acho que seja absurdo sugerir, ainda, exercícios meditativos que ajudem a serenar a mente – benéficos não só para a performance sexual, mas para o distúrbio de ansiedade que causa problemas.

Transar bem – o que é?

É claro que disfunções sexuais do tipo podem e provavelmente causarão atritos e inseguranças para quem sofre delas e seus parceiros. É importantíssimo buscar ajuda. Mas não são também uma chance de abrir um papo com menos tabus, mais honesto? De que outras formas podemos explorar nossa sexualidade? Como ter relações menos centradas na ereção? Que outras partes de nossos corpos são erógenas? Como expressar carinho e desejo sem pênis e vaginas em jogo?

Este tipo de abordagem favorece o florescimento de práticas sexuais saudáveis não só quando as causas do comprometimento são orgânicas, mas também quando são psicológicas. Na verdade, antes mesmo de Viagra e próteses penianas serem uma opção da medicina tradicional, métodos de tratamento da disfunção já estavam sendo desenvolvidos.

William Masters e Virginia Johnson, respectivamente médico e psicóloga, os primeiros pioneiros na pesquisa científica sobre nossas respostas sexuais, lá em meados de 1950, entraram a fundo na fisiologia da relação sexual. Seu segundo livro, Human Sexual Inadequacy, de 1970, trouxe um revolucionário protocolo para o tratamento de disfunções sexuais – uma combinação de terapia para ambos os parceiros com exercícios práticos a serem realizados de forma privada.

Ali, as questões eram abordadas de forma conjunta aos relacionamentos dos parceiros, bem como os exercícios. O tratamento para disfunção erétil, por exemplo, envolvia trabalhar com o toque de maneira progressiva: o casal deveria sentar confortavelmente de modo que olhassem um ao outro de frente, fazendo carinhos um no outro, inicialmente, em áreas consideradas não erógenas. Já para ejaculação precoce, técnicas masturbatórias em conjunto permitiam maior controle sobre o crescimento da excitação. Algumas das técnicas são usadas até hoje e chamam atenção pelo seu princípio básico: priorizar o contato humano, fortalecer as relações e favorecer a troca, parceria e carinho.

Essa seja talvez a chave principal de sexualidades saudáveis – lembrar que sexo não é sobre um pau que sobe. Retomar o entendimento de relação sexual como algo que acontece com dois corpos inteiros, que carregam marcas de quem são e o que já aprenderam e não se conformam a alegorias estereotipadas, é urgente. Ser capaz de ver o que há de humano no outro e aceitar que nossas vulnerabilidades são também puro deleite.

Mecenas: Americas Serviços Médicos

É com a experiência de quem soma mais de 2 milhões de atendimentos em pronto-socorro, 212 mil internações e 122 mil cirurgias por ano que fazemos um apelo sobre a sua saúde: fazer check-up periódico é a melhor chance de viver mais e melhor.

Acontece que os homens tendem a adiar a prevenção e perdem oportunidades de ouro de preservar sua qualidade de vida. Por isso, nesse Novembro Azul, nós do grupo Americas Serviços Médicos firmamos uma parceria com o Papo de Homem para levar, até vocês, os argumentos que faltam para tratar a saúde como prioridade. Nada de deixar para ler depois, certo?

Contribuiu com o conteúdo o nosso especialista Dr. Claudio Murta.

Marcela Campos

Tão encantada com as possibilidades da vida que tem um pézinho aqui e outro acolá – é professora de crianças e adolescentes, mas formada em Jornalismo pela USP. Nunca tem preguiça de bater um papo bom.