Bem, amigos, chegou a hora de encerrar o nosso especial editorial dinheiro. Depois de pedir sua contribuição para responder a pesquisa e receber mais de 2000 respostas de todo o Brasil sobre como anda a sua vida financeira, apresentamos algumas dicas de como organizar melhor suas finanças com base num perfil dos nossos leitores e depois ainda atacamos quatro problemas básicos bastante recorrentes, mas que não foram contemplados no primeiro exemplo.

Agora, finalmente, chegou a hora de apresentar um compilado dos dados um pouco mais detalhado. É hora do resultado final da nossa pesquisa sobre dinheiro e o que podemos aprender com os comportamentos narrados por vocês, nossa comunidade.

Dando uma olhada nos dados, graças ao trabalho da socióloga e pesquisadora Gabriela Lima e o olhar técnico do consultor financeiro Eduardo Amuri, algumas coisas chamaram nossa atenção e resolvemos destacá-las. Sem mais delongas, vamos a elas:

Por que, quando e como os homens se endividam?

A primeira e mais óbvia conclusão que chegamos é de que os homens parecem estar menos endividados do que imaginávamos (sempre lembrando que podemos afirmar isso apenas a respeito do universo de pessoas que participaram da nossa pesquisa, ok?). Dentre os 1449 homens que nos responderam, quase dois terços (63,5%) afirmaram não ter dívidas atualmente.

Uma hipótese que passou pela nossa cabeça é de que homens com situações financeiras mais confortáveis sentem-se mais à vontade para responder pesquisas como esta e, portanto, os dados ficam um pouco maquiados. Quando analisamos casos de outras pesquisas sobre assuntos delicados como dinheiro, sexo e doenças, percebemos que esta distorção ocorre, é natural e merece ser levada em consideração.

De qualquer forma, resolvemos investigar as razões que a pesquisa nos apresentou, afinal de contas, será que os homens estão de fato aprendendo a lidar melhor com dinheiro? Quais são os hábitos e percepções dessas pessoas em contraste com as demais? Como elas avaliam sua relação com dinheiro?

Para obter essas respostas decidimos fazer um recorte de dois grupos a fim de compará-los: homens que devem versus homens que não devem; e descobrimos coisas bastante interessantes.

Quanto eles ganham?

O primeiro ponto observado foi: o salário não é um fator determinante para o endividamento.

Essa conclusão é muito valiosa porque uma hipótese que sempre levantamos quando pensamos a respeito dos motivos que levam as pessoas a se endividarem diz respeito a quanto essas pessoas ganham.

Os dados, porém, nos mostraram que o percentual de endividados é semelhante ao dos não-endividados em todas as faixas de renda e obedecem praticamente à mesma proporção, ou seja, o quanto você ganha não é o que determina se você fará dívidas ou não.

Por exemplo: 8,2% das pessoas que afirmaram não estar devendo ganham um salário mínimo ou menos, um percentual muito parecido com os 8,1% que recebe a mesma coisa, mas deve.

Isso reforça uma tese, contrária ao senso comum, de que a capacidade de não se endividar está mais atribuída ao gerenciamento dos seus próprios recursos do que à quantidade desses recursos disponíveis. É uma lógica de "gasto o quanto posso de acordo com quanto ganho" contrária ao pensamento "preciso ganhar mais para pagar o quanto gasto."

Antes da frieza dos dados, vale fazermos uma ressalva: apesar das curvas de crescimento serem muito parecidas, pudemos notar que o pico de endividamento das pessoas está na faixa que ganha entre 2 e 3 salários mínimos, enquanto a dos não-endividados está um pouco acima (de 3 a 5). Cruzando com alguns outros dados, isto nos fez entender que o estilo de vida das pessoas que nos responderam custa algo em torno de R$ 3 mil por mês e quanto maior for o salário a partir deste valor, maior também é a tendência de estar com as contas em dia.

Renda/Endividamento Endividadas (36,5% do total): Não-Endividadas (63,5% do total):
Até 1 salário mínimo: 8,1% 8,2%
Entre 1 e 2 salários: 15,4% 15,1%
Entre 2 e 3 salários: 26,2% 19,6%
Entre 3 e 5 salários: 22,8% 26,1%
Entre 5 e 10 salários: 8,3% 10,7%
Entre 10 e 20 salários: 17,3% 16,6%
Mais de 20 salários: 1,9% 3,7%
Total: 100% 100%

Quantos anos eles têm?

Quando fizemos o recorte por idade, também chegamos a um dado interessante: se a renda não é um fator determinante, em contrapartida, há uma tendência de nos endividarmos conforme envelhecemos.

Os números coletados foram bem claros a esse respeito ao demonstrarem curvas opostas de desenvolvimento: com o passar dos anos, o grupo de endividados aumenta de tal forma que a partir dos 46 anos há mais homens com dívidas do que sem elas.

Idade/Endividamento Sem dívidas: Com dívidas: Total:
Menor de 18 anos: 100% 0% 100%
Entre 19 e 25 anos: 68,2% 31,8% 100%
Entre 26 e 35 anos: 63,7% 36,3% 100%
Entre 36 e 45 anos: 58,9% 40,2% 100%
Entre 46 e 55 anos: 43,6% 56,4% 100%
Mais de 56 anos: 33,3% 66,6% 100%

Entre as hipóteses levantadas para explicar esse resultado, a mais provável é de que a mudança das nossas necessidades e suas respectivas urgências fazem com que tenhamos menos margem de manobra e, portanto, acabemos adquirindo dívidas.

Um exemplo palpável pode ser dado com base no resultado também bastante instintivo de que quanto mais velha for a pessoa, mais ela concorda que ter um plano de saúde é fundamental. Entre pessoas com até 25 anos, plano de saúde só é indispensável para 27,1%, para pessoas entre 26 e 35 anos o número já pula para 39,2%, mas quando passamos dos 35 anos o percentual fica ainda mais alto: 44%.

"Até os 25 anos, apenas 27,1% das pessoas acham que ter plano de saúde é indispensável, mas quando passam dos 35 anos, este número sobe para 44%."

Da mesmíssima forma, houve um percentual muito mais elevado de pessoas que afirmam gastar mais de R$ 1000 por mês com saúde/bem estar na faixa acima dos 35 anos (12,7%), se comparado com pessoas de até 25 anos que gastam o mesmo valor (2,3%).

Como eles se endividam?

Analisando comparativamente os grupos citados percebemos mais uma coisa interessante, dessa vez a respeito de como as pessoas enxergam (ou não) o problema sobre ficar devendo.

Em geral, nós temos uma tendência de achar que nossa relação com as coisas é melhor do que a média geral. Aquele velho exemplo sobre o trânsito se aplica aqui: todos reclamam das "barberagens" no trânsito, mas também acham que dirigem melhor do que a média, ou seja, o problema nunca é com ele mesmo.

A nossa pesquisa, por sua vez, detectou um sintoma muito parecido: 60,7% das pessoas que se dizem sem dívidas afirmaram também ter uma relação com dinheiro acima da média. Mas um outro dado importante revelou justamente como essas pessoas estão enganadas: apesar de se dizerem "sem dívidas", 10,6% estão financiando um imóvel e 8,8% estão financiando um carro.

"Entre as pessoas que não estão endividadas, mais de 60% acha que têm uma relação acima da média com dinheiro, mas na verdade, elas estão bem no centro da média."

Isto coloca em dúvida a própria percepção das pessoas sobre o que é estar endividada ou não. Em geral, financiamentos são mantidos sob controle, mas eles não deixam de ser uma dívida e, em geral, uma dívida que compromete boa parte da renda mensal e muitos meses de salário. Ainda segundo nossa pesquisa, os homens que têm carro (60,2%) costumam pagar uma parcela mensal média de R$ 895,00 de financiamento, sejam eles declarados endividados ou não. É quase um salário mínimo por mês comprometido apenas com essa dívida.

Tudo isso significa duas coisas: ao mesmo tempo em que subestimamos nossas próprias dívidas, compartilhamos com uma visão geral de que estar endividado é necessariamente ruim e se não for ruim, então não é dívida. Esta visão é equivocada quando descobrimos que esta é uma prática comum mesmo dentro de empresas sólidas. Nem tudo se faz com o próprio dinheiro, às vezes é interessante pegar um dinheiro emprestado para realizar algumas coisas, o problema é justamente saber com o que gastar de modo que esse dinheiro "se pague" e ainda renda, como quando usamos o aluguel de um imóvel para pagar as parcelas do financiamento de um segundo.

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Felizmente, algumas pessoas parecem ter percebido isso e começado a aplicar esse conhecimento na prática. Analisamos o caso do perfil mais comum dentre os nossos pesquisados (pessoas com renda em torno de R$ 5 mil mensais), das quais metade afirmou estar devendo uma quantia referente a no máximo um mês de salário e, destes, 60% tem um valor guardado superior a R$ 10 mil, ou seja, são pessoas que têm dinheiro para quitar suas dívidas, mas não o fazem por opção própria.

"Dentre as pessoas endividadas, a maioria tem um valor investido superior ao total de suas dívidas, ou seja, poderiam quitá-las se quisessem, mas não o fazem por opção própria. O que é uma boa estratégia desde que o rendimento da aplicação seja superior aos juros da dívida."

Existe uma diferença de hábitos e expectativas entre as gerações?

Depois que encerramos a análise sobre endividados e não-endividados partimos para uma segunda hipótese levantada com os resultados da pesquisa: existe uma diferença de tratamento ao dinheiro e objetivos entre as diferentes gerações? Sabemos que millennials e baby boomers têm visões distintas a cerca de muitas coisas, mas isto se aplica também em relação ao dinheiro?

Começamos pelo óbvio: "quanto cada um ganha"; e foi então que percebi que tem uns caras na minha idade (3) que ganham mais de 20 salários mínimos por mês. Fiquei triste, mas passou quando percebi que a maioria (56%) não foge da faixa entre 1 e 3 salários.

Já o pico da renda das pessoas que têm entre 26 e 35 anos fica na casa dos 5 a 10 salários (31,3%) e o grupo ainda mais velho – com mais de 35 anos – da mesma forma (33,6%).

Renda/Idade Até 25 anos: De 26 a 35 anos: Acima de 36 anos:
Até 1 salário mínimo: 18,4% 4,7% 2,6%
De 1 a 2 salários mínimos: 34,8% 11,4% 4,6%
De 2 a 3 salários mínimos: 21,2% 14,1% 9,4%
De 3 a 5 salários mínimos: 17,1% 26,8% 20,8%
De 5 a 10 salários mínimos: 6,2% 31,3% 33,6%
De 10 a 20 salários mínimos: 1,7% 9,5% 20,5%
Mais de 20 salários mínimos: 0,6% 2,2% 8,5%

 

O segundo passo foi analisar como essas pessoas de diferentes idades moram e o resultado foi o que esperávamos: grande parte dos jovens (44,7%) até 25 anos, ainda moram com parentes e uma boa parcela nem sequer ajuda com as contas (37,4%).

Esta análise, porém, nos permitiu ver uma progressão interessante: a maioria das pessoas passa por uma fase em que mora de aluguel, antes de comprar e financiar a casa própria. Entre os indivíduos com idades entre 26 e 35 anos, a maior parte (40,7%) disse pagar aluguel, e a partir dessa idade, o foco muda para pessoas que quitaram (35,5%) ou financiaram (20,2%) os imóveis onde moram.

"No grupo com até 25 anos, a maior parte (40,7%) mora com os pais. No grupo entre 26 e 35 anos, a maior parte (35,5%) mora de aluguel. E no grupo com mais de 36 anos, a maioria (55,7%) quitou ou financiou o próprio imóvel."

As respostas mais interessantes, porém, vieram quando começamos a avaliar o raciocínio dessas gerações em relação a planos e metas de vida como, por exemplo, parar de depender dos pais ou se sacrificar num emprego que não gosta para ter uma vida melhor no futuro.

Quando perguntadas sobre se priorizam morar bem ou ter mais dinheiro para gastar com lazer no final de semana, o grupo com até 35 anos tendeu a preferir a moradia (39%). Já o grupo mais velho – a partir dos 36 anos – prefere gastar mais com lazer (49%).

Logo depois analisamos as respostas sobre a possibilidade de se sacrificar por 10 anos ou mais num trabalho que não gosta em troca de uma situação de vida mais confortável no futuro, e nesse ponto confirmamos uma tendência mundial: os jovens não querem abrir mão de trabalhar com o que gostam, para eles, não é mais só uma questão de ter dinheiro para fazer outras coisas, é uma questão de sentir-se realizado com aquilo que estão fazendo.

Na nossa pesquisa isso ficou evidente quando notamos a curva de resposta de pessoas que concordam fortemente com o sacrífico no emprego: 16,5% até 25 anos, 18,6% de 26 a 35 anos e 19,5% a partir dos 36; em contraste com a curva de respostas de pessoas que discordam fortemente desse sacrifício: 14,8% até 25; 11,8% de 26 a 35; e apenas 9,8% a partir dos 36.

"Vale a pena sacrificar 10 anos ou mais em um trabalho que não gosto tanto, juntando dinheiro para viver melhor no futuro."

 

Concordo Fortemente Discordo Fortemente
Até 25 anos: 16,5% 14,8%
Entre 26 e 35 anos: 18,6% 11,8%
Mais de 36 anos: 19,5% 9,8%

 Analisando as respostas com esse recorte etário, porém, acabamos obtendo uma possível confirmação para uma segunda tendência mundial: os homens adiam sua percepção do que é a vida adulta conforme ficam mais velhos. E isso ficou claro de acordo com o plano desses homens em comprar um imóvel. Entre os jovens, 30,6% disseram concordar fortemente com o fato de se sentirem fracassados se não comprassem um imóvel antes dos 40 anos. Porém, esse número cai conforme eles se aproximam dessa idade. Entre os homens entre 26 e 35 anos, o número cai para 21,9% e a partir dessa idade nova queda para 20,2%.

"Preciso comprar um imóvel antes dos 40 anos ou vai bater aquele sentimento de fracasso."

  Até 25 anos: Entre 26 e 35 anos: Mais de 36 anos:
Concordo Fortemente 30,6% 21,9% 20,2%

Em relação a dois importantes valores sociais, porém, os indivíduos de todas as gerações concordaram. Um deles diz respeito à independência e outro em relação à caridade:

  • 35,7%, 45,0% e 48,5%, dentre os respectivos grupos etários, tem pressa para deixar de depender dos pais.
  • 43,4%, 43,7% e 40,4%, dentre os respectivos grupos etários, doariam no máximo 10% do valor de um hipotético prêmio na loteria.

Agora, queremos escutar vocês novamente. Este especial editorial ajudou você de alguma forma?

Assim, encerramos nosso especial editorial sobre dinheiro.

Depois de termo feito essa pesquisa, apresentado tantos dados, feito análises em cima de casos reais vividos pelas pessoas e oferecido práticas para que melhoremos nossa vida financeira, espero que vocês tenham gostado ou que tenha sido, no mínimo, útil.

Do lado de cá, todo esse percurso deu muito trabalho. Quero agradecer à todos que responderam e ajudaram a divulgar a pesquisa, mas principalmente à participação e ajuda da Gabriela Lima, do Eduardo Amuri e do Guilherme Nascimento Valadares durante todo o processo de concepção e execução desse projeto. Espero poder produzir este tipo de conteúdo mais vezes.

Quem quiser ir mais fundo no conteúdo sobre finanças, vale também conhecer o trabalho do Amuri entrando no site DinheiroSemMedo.com e acompanhando o pré-lançamento de seu livro homônimo.

Agora, se vocês têm pontos para levantar, discutir, observar e até mesmo elogiar, a caixa de comentários permanecerá sempre aberta pra isso. Se conhece alguém que possa se interessar por este conteúdo: encaminhe o link deste artigo ou de todo nosso percurso e ajude-nos a divulgar.

Obrigado a todos.

Breno França

Editor do PapodeHomem, é formado em jornalismo pela ECA-USP onde administrou a <a>Jornalismo Júnior</a>