Gosto de música e gosto de escrever, mas nasci no erradíssimo ano de 1987.
Ali, no limbo entre o início dos anos 80 e a Copa do Mundo de 1994, fazer mixtapes e escrever cartas de amor podiam até fazer sentido, mas não para um garoto cuja principal preocupação com o sexo feminino era saber se elas me emprestariam aquele estojo transbordando de lápis coloridos. Quando a pré-adolescência, as paixonites e os hormônios chegaram, já era tarde demais: estávamos na época do CD e – maldita seja – da internet discada.
O charme ficou pelo caminho.
Na época em que se gravava fitas, era preciso ter os discos certos ou ouvir os programas de rádio de que a garota gostava na hora exata. Trabalhoso, exclusivo e apaixonado – como devia ser. Baixar e gravar arquivos em .mp3 em um CD era uma epopeia, mas bem mais estéril – envolvia computador logado no Kazaa, canções cortadas abruptamente e, invariavelmente, terminava com aquele sentimento de “eu mesma podia ter baixado essas músicas que você gravou pra mim, seu idiota”.
Nunca usei o mIRC, mas escrever padecia de problema parecido. Os ritmos alucinantes do ICQ (e, mais tarde, do MSN) nunca facilitaram a redação de mais que um parágrafo, quem diria de uma declaração de amor com mais que uma frase e uma animaçãozinha tosca. A clássica borrifada de perfume no papel de carta dos filmes americanos, então, entrou para os livros de história.
Sem grandes opções, joguei o jogo como conseguia. Mensagem engraçadinha embaixo do nick do messenger e testimonials secretos ou comunidades em comum no Orkut serviram razoavelmente bem até que uma palavra importada surgiu no desesperançoso horizonte dos enamorados abaixo dos trópicos: link.
Já não era sem tempo. A graça sensível, nerd e artesanal da fita cassette chegou aos anos 2000 com outro formato, mas a mesma receita que fizera o sucesso anterior: curadoria personalizada. Ao invés de músicas que lembram a pessoa amada, assuntos que interessam ao sujeito da nossa paixão.
Antes, o paraíso dos tímidos era deixar uma fita dentro da mochila, no armário da escola ou entregar o presente junto de um bilhete disfarçado com um “para ouvir depois” escrito à mão. Agora, é a força de um título com piadinha interna e a individualidade do e-mail que nos dá força.
Jogados como quem não quer nada mas com a precisão que só um radar atento na internet proporciona, os links servem tanto para um começo de conversa quanto para estender aquele encontro que mal passou de uma troca de olhares fortuita. Até o verbo, compartilhar, já dá um ânimo.
“Assunto: Aqui…
Mensagem: Tem a ver com aquilo que conversamos sobre São Paulo aquele dia. [LINK]”
“Assunto: Olha isso
Mensagem: Parece com aquele projeto que você postou no Facebook, né? [LINK]”
“Viu esse gif, moça?”
Por que os gifs de cachorro não existiam na quinta série?
“Sabe aqueles vídeos de que te falei no no almoço?” [LINK] [LINK] [LINK]
Funciona, e ainda há um bônus saudosista: o histórico do gmail permite encontrar, perdido entre o gtalk e as mensagens de um punhado de gente, o momento em que tudo começou. No meu caso, agradeço ao pessoal do EGO pelo link e pelo amor alcançado. Tudo começou em um e-mail com esse título: Sandy, swing e pornô.
Não existe vergonha no ctrl+c ctrl+v do amor.
Puxe uma cadeira e comente, a casa é sua. Cultivamos diálogos não-violentos, significativos e bem humorados há mais de dez anos. Para saber como fazemos, leianossa política de comentários.