Meses atrás fui marcado em um post com os seguintes dizeres “eis aqui minha bancada dos sonhos para SP”. Era um amigo. Fiquei feliz pela lembrança, mas só. A política pode até ser meu campo de atuação, mas ser político não é meu objetivo.
Sinto que não é para mim.
Com o tempo e a repercussão daquela publicação, um incômodo foi crescendo. Por que diabos tornar-se político não costuma estar no horizonte de quem trabalha por mudanças na sociedade civil? Por que a ideia de ocupar o legislativo de São Paulo me parece tão indigesta?
Acredito muito que algumas mudanças só ocorrerão por forças de fora. Mas há limites óbvios para o quanto a arquibancada pode influir no resultado do jogo. Mesmo o estádio mais lotado e a torcida mais engajada não poderão suprir certos desfalques no campo.
Fiquei ruminando: essa repulsa definitivamente não é só minha. Ela tem a ver com quem está lá e como se chegou lá.
Para mudar o jogo será preciso ter estômago
Nosso imaginário político foi tomado pelas histórias mais escabrosas, com os crimes mais obscenos dos vilões mais hipócritas. Tudo isso travestido de interesse público, de nobreza, decoro etc. Para nós cidadãos, a política tornou-se uma grande farsa contada nos jornais.
Agora, nesse nojo de ocupar a política institucional, o Poder Legislativo foi se consolidando como terra infértil. Enquanto a sociedade civil floresce, o legislativo se perverte. Um ambiente potente transformado em deserto, prestando-se a debates inúteis movidos por interesses escusos, desperdiçando recursos em assuntos absolutamente irrelevantes e arruinando um espaço legítimo de poder.
Sem dúvida é preciso promover uma reforma do sistema político, mas qualquer mudança executada por quem hoje ocupa esses espaços tende a ter efeito nulo.
Isso porque o parlamento hoje é composto essencialmente – com honrosas exceções – por representantes de causas privadas.
Nossos vereadores, mais de 55 mil espalhados no país, chegaram aonde estão muito mais pela força de articulação dos interesses que os financiam do que pelo seus posicionamentos políticos. Na verdade, suas opiniões são apenas uma decorrência da orientação de quem financia suas campanhas. As bancadas da bola, da bala, do boi e da bíblia nada mais são do que o resultado de interesses organizados na sociedade que se articulam para ter representantes no parlamento.
As eleições deste ano serão um experimento institucional
Temos neste ano uma grande oportunidade de mudar a lógica da disputa eleitoral. Estas eleições municipais serão as primeiras sem doações empresariais. E isso não é pouca coisa: se o STF já tivesse proibido doações empresariais nas eleições de 2014, por exemplo, 3 de cada 4 reais doados teriam sido ilegais.
Ainda de acordo com as eleições de 2014, candidatos eleitos gastam em média 11 vezes mais que os não eleitos. Verdade que há diferenças entre eleições municipais e federais, mas só para termos um parâmetro de comparação: segundo o TSE, todos os candidatos a deputado federal que gastaram mais de R$ 5 milhões foram eleitos, e entre os que captaram menos de R$ 500 mil, apenas 3% conseguiram garantir o mandato.
Se nós eleitores não mudarmos a nossa relação com o processo eleitoral, mesmo com a “ausência” do dinheiro de empresas, a tendência é que esse padrão se mantenha e que aqueles com grana se elejam, ao passo que os sem grana fiquem a ver navios.
A mudança do modelo de financiamento é uma oportunidade inédita de engajamento dos eleitores. Temos hoje uma plataforma aprovada pelo TSE para o financiamento de campanhas chamada Voto Legal. Com o objetivo de promover campanhas políticas mais baratas e garantir a transparência entre doadores pessoas físicas e candidatos, a plataforma foi desenvolvida por MCCE (Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral) e App Cívico, com apoio do Arapyaú.
A saída do dinheiro das empresas aumenta a relevância da participação popular na eleições. Mas a qual candidato você doaria para vê-lo eleito?
O que precisa acontecer é uma articulação na sociedade para eleger representantes alinhados com pautas mais públicas do que setoriais, mais sociais do que privadas, e aqui entram a defesa da transparência, dos direitos humanos, da mobilidade urbana, do movimento negro, da abertura de dados, da sustentabilidade, das causas LGBT etc.
Se o problema é justamente essa letargia do legislativo, o negócio é eleger gente ativa, gente de movimento, gente que já está agindo pelas causas que acredita. Gente que já nos representa.
Ativistas precisam ocupar o legislativo
Não há prova melhor para avaliar quem está disposto a trabalhar por causas públicas do que o histórico do candidato. Não se pergunte apenas o que ela/ele pretende fazer na Câmara, olhe o que ela/ele já fez, preste atenção ao que ela/ele já está fazendo.
A partir daquele simples post do começo do texto, e desse diagnóstico comum, uma galera se conectou e encontrou 8 candidatos (homens e mulheres) compromissados com os princípios que defendemos para a cidade. Todos eles já fizeram muita coisa pela cidade sem ter a caneta na mão – imagine quando tiverem!
A Bancada Ativista é um movimento suprapartidário e cidadão com o objetivo de criar um formato de campanha colaborativo, capaz de unir e eleger candidatos ativistas para o legislativo. Não temos nenhum modelo pronto. Estamos aprendendo e registrando ao longo do percurso. Queremos criar uma campanha transparente e pedagógica, que promova a participação cidadã e a diversidade e respeite a autonomia dos candidatos, não à toa tornamos públicas todas as práticas que pretendemos adotar.
Eleger ativistas em um país sem cultura de doação política é tarefa quase impossível. Do outro lado, para os candidatos, seguir o modelo de campanha tradicional é suicídio eleitoral.
Daí a necessidade de inovar no seu formato de campanha e provocar o tensionamento do jogo eleitoral. Apenas com essas práticas seremos capazes de colocar em xeque a lógica de disputa eleitoral, segundo a qual apenas a grana elege.
O desafio permanece gigantesco, mas a oportunidade é proporcional a ele: essas eleições municipais nos dão a chance de eleger idealistas pragmáticos: políticos cujas prioridades de mandato não serão pautadas por financiadores privados, mas pelo interesse público.
Gente que nunca esperou o mandato para lutar por mudanças. O legislativo deveria ser o lugar de quem já representa, e não de quem precisa vencer eleições para representar.
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