Pergunta: ”Fui casado, fiquei viúvo, tenho uma irmã com a qual faço sexo desde pequeno, ela tem 4 anos de diferença, sou mais velho. Depois de um tempo ela casou e separou, quando fiquei viúvo ela me procurou.
Fazia 17 anos que não transávamos, fizemos e ela ficou depois de um tempo grávida,
temos uma filha linda e é a unica filha dela, nasceu linda e perfeita. Somos casados agora vivemos juntos andamos como marido e mulher, foi dificil a nossa família aceitar. Agora ela quer ter outra criança.
Tenho medo que a criança saia defeituosa, pela minha idade 43 anos e ela
39 anos. Somos irmãos de sangue e també iniciei ela em sexo com outros parceiros
sexuais. Ela às vezes diz que tem muito tesão em pensar em mim como marido, tentei de tudo para distraí-la, mas não adianta, o que eu faço?”
– Anônimo
Confesso que jamais pensei que receberia uma dúvida como esta. Mas ela dá ensejos a diversos assuntos, ao contrário de 80% das que recebo, cujas respostas estão aí pelos meus artigos, e em duas linhas.
Não vou entrar em aspectos morais e religiosos da sua relação com sua mana, pois são extremamente relativos e cada cabeça é uma sentença.
Aos que ficaram chocados…
Existe um histórico de relações incestuosas e consangüíneas entre os monarcas da Europa Medieval (isso mesmo, na época da Inquisição e tudo), visando manter determinada linhagem. Contraditoriamente, quando convinha obter o divórcio, era justamente feito alegando-se consangüinidade para obter tal anulação. Coisas de uma época de trevas.
Também é estimado que 55% dos casamentos entre imigrantes paquistaneses na Grã-Bretanha sejam entre primos. Outro povo que apresenta consangüinidade elevada são os judeus asquenazi. Guardem esse nome, pois voltarei a eles mais abaixo.
Perdão, esqueci de explicar o que significa consangüinidade:
Na verdade o termo se refere ao fato de ter a mesma “linhagem” sanguínea de outra pessoa. O sentido de consangüinidade foi um tanto ampliado devido a aspectos legais e genéticos, dos quais falo a seguir, quanto às conseqüências de parentes terem relacionamentos entre si.
Aspectos legais
Em geral, casamentos entre parentes são proibidos legalmente. O grau de parentesco envolvido varia. No Brasil, apesar do repúdio da população, a relação sexual incestuosa, desde que entre maiores de idade, capazes de exercer todos os seus direitos, e que consentida sem nenhum tipo de coação ou fraude, não é passível de punição criminal.
Já o casamento civil é totalmente proibido. Apesar disso, se entre tio/tia com sobrinha/sobrinho, mediante apresentação de exame médico atestando saúde de ambos e de possível prole, é permitido. Apesar da proibição, filhos de uma relação incestuosa possuem todos os direitos de qualquer cidadão.
Aspectos genéticos
Ao contrário do que muitos poderiam crer, não é tiro certo que um filho de relação entre irmãos será doente. Mas em relação à população geral, a chance dessa criança ter tal doença é MUITO maior.
A chave para elucidar o problema são os chamados genes autossômicos recessivos. Que bicho é esse?
Todo mundo aqui deve lembrar da genética dos olhos azuis/verdes. Para uma pessoa ter olhos azuis ou verdes, é preciso que os genes que controlam esta característica sejam duplicados, ou seja, o gene que vem do pai seja da mesma espécie que vem da mãe. Se vierem “diferentes” (a grosso modo), a presença de um outro gene fará com que a pessoa se manifeste com os olhos castanhos, mesmo tendo um gene de olhos azuis/verdes.
Por isso, este gene dos olhos castanhos é chamado de DOMINANTE, e o dos azuis/verdes de RECESSIVO. Em resumo: A característica manifestada pelo gene recessivo só acontece na ausência de um gene dominante.
O que tem a consangüinidade com isso?
A relação consangüínea reduz a variabilidade genética. Havendo a presença de um gene autossômico recessivo no pool genético da família, a chance que o fruto da relação receba este gene tanto do pai quanto da mãe (leia-se, manifeste a doença) é MUITO maior que na população geral, ou que se fosse fruto de uma relação com pessoa de “outra genética”. Estima-se que a chance do descendente ter problemas de saúde é de 25%, número altíssimo, uma chance em quatro. E isto para o caso de primos em 1º grau, que dirá, então, no caso de irmãos.
Um bom exemplo disto é o caso de uma doença neurológica chamada doença de Tay-Sachs. Crianças com Tay-Sachs aparentam desenvolver-se normalmente nos primeiros meses de vida. Depois, com a distensão de células nervosas com material adiposo, há uma severa deterioração das habilidades mentais e físicas. A criança torna-se cega, surda e incapaz de engolir. Os músculos começam a atrofiar e ocorre a paralisia. Outros sintomas neurológicos incluem demência, convulsões e crescentes “reflexos de susto” a barulhos.
A doença torna-se fatal normalmente na faixa de 3 a 5 anos. Uma forma da doença muito mais rara ocorre em pacientes entre 20 e 30 anos e é caracterizada por andar inconstante e deterioração neurológica progressiva.
A doença de Tay-Sachs advém de uma herança autossômica recessiva. Na população geral, a presença de tal gene se dá em 1 a cada 250 pessoas, porém nos já citados judeus asquenazim, o gene recessivo é encontrado em 1 a cada 25 pessoas. Se ocorrer heterozigotia (há um gene dominante), a doença não se manifesta e assim podemos deduzir que a incidência da doença de Tay-Sachs entre a população de judeus asquenazim (que sabidamente têm o costume de gerar descendência entre eles mesmos, ou seja, há a consanguinidade em algum grau) é muito maior que na população geral.
Voltando ao caso do leitor
Além de tudo isto, ainda existe um fator ainda mais complicante, a idade reprodutora avançada de ambos. Nem tanto no caso do leitor, pois a renovação de espermatozóides é constante, o que reduz o risco de mutações deletérias, mas principalmente da irmã dele. A mulher já nasce com todos os óvulos que produzirá durante a vida, portanto, a célula, quanto mais tempo permanece no organismo, mas sujeita estará a mutações que podem gerar descendentes defeituosos.
Acima dos 35 anos, é sabido que uma gravidez tem maiores índices de morbidade e mortalidade tanto para a mãe, quanto para a criança, e um dos motivos é justamente o aumento do risco de mutações dos óvulos.
Concluindo
Caro leitor, se você e sua irmã vão viver maritalmente, não cabe a mim nem a ninguém julgar tal fato, vocês são maiores de idade e responsáveis. Porém, a decisão de ter filhos no seu caso é complexa e diria pouco recomendável.
Poderia te orientar a pedir aconselhamento de um geneticista, mas pelos motivos que aqui expus, creio que a resposta dele será muito semelhante à minha. A primeira filha de vocês nasceu linda e perfeita mas desta vez pode não ser o caso.
Dr Health, em momento nostálgico de quando arrancava risos dos colegas de turma no 2º período da faculdade, durante a aula de genética, ao imitar o professor falando da doença de Tay-Sachs. Good times!
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