É ano de eleição presidencial para os estadunidenses, e ainda que as especulações tenham começado já no ano passado, é só em fevereiro que começam a rodar pelos estados do país as primárias – fase de escolha do candidato final dentro se seus próprios partidos.

E eis que nos últimos dias Jimmy Fallon deu seguimento às suas bombásticas entrevistas e recrutou ninguém menos do que Donald Trump pro seu sofá para uma conversa e uma entrevista de emprego para o cargo que deseja assumir.

Ao som de aplausos, Trump foi até moderado perto do que já saiu em seus discursos e declarou que o tema de sua campanha é “Tornar a América um lugar ótimo novamente”, defendeu o banimento temporário da entrada de muçulmanos no país e contou que, ironicamente, é um homem que tende a unir pessoas.

Trump é bem-humorado, sagaz, simpático. O homem conhece as artes da oratória. Propaga visões e defende medidas um tanto quanto controversas, que reverberam bastante nessa atmosfera belicosa em que estamos, entre a luta anti-terrorista, os ataques do Estado Islâmico e as necessidades dos refugiados que levam tapa de todos os lados – do EI extremista e da hostilidade do resto do mundo quanto a acolhê-los.

Ainda há um longo caminho até junho, quando acabam as primárias, mas o empresário já está liderando as pesquisas com 35% das intenções de voto, bem acima do seu principal concorrente de partido, Ted Cruz, com 20%. O atual senador do Texas e representante direitista importante do Tea Party foi o primeiro a anunciar sua candidatura, sob o chavão de ser o mais conservador dos candidados na corrida presidencial.

À Fallon, Trump disse que não tem nada contra os muçulmanos, inclusive tem amigos que são, muitos dos quais apoiam suas pretensões políticas. Resta questionar se essa sua habilidade de unir pessoas se manifesta também em seus eleitores, que hostilizaram Rose Hamid no comício do candidato na Universidade de Wintrhrop, na sexta-feira passada.

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A filha de pai palestino e mãe colombiana é nativa dos EUA e disse à CNN que foi ao evento com a intenção de estabelecer conexões humanas e mostrar aos seus compatriotas que são pessoas iguais e que o povo muçulmano não é o inimigo.

Rose protestava sileciosamente, pacificamente – estava em pé, assim como muitos outros ouvintes, vestindo uma camiseta com os dizeres “Salam. Eu venho em paz” – quando foi retirada do local por um policial. Nesse momento, os mesmos eleitores que estavam até então ao seu lado começaram a protestar em favor de Trump e, aos gritos, perguntar se ela havia trazido bombas consigo.

Eu não podia ter ficado mais grata à emissora estadunidense por ter dado à Rose seus sete minutos de fala no jornal das dez da noite. O que essa mulher falou é simples, óbvio e, ao mesmo tempo, exemplo de compaixão e lucidez extremas.

“Eu quero que as pessoas saibam que elas não precisam ter medo dos muçulmanos. Nós não somos o problema. São as pessoas que têm visões extremistas em quaisquer frentes que precisamos temer.”

 

Marcela Campos

Tão encantada com as possibilidades da vida que tem um pézinho aqui e outro acolá – é professora de crianças e adolescentes, mas formada em Jornalismo pela USP. Nunca tem preguiça de bater um papo bom.