Criamos essa campanha em parceria com o Whatsapp, com o objetivo de reduzir as violências contra meninas e mulheres nas redes. Na prática, a ideia é que mais pessoas possam identificar, entender e interromper as violações típicas dos ambientes online. 

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Uma das características específicas da violência de gênero que acontece online é acreditar que ela não é real, que não é tão séria ou que é menos grave por não ser física, presencial.

“Está todo mundo repassando, ninguém liga.”
“Ela nem vai saber que eu estou te mostrando isso…”
“Mas eu não encostei um dedo nela!”
“Foi só um comentário…”

Não é bem assim. Todas as formas de violência contra as mulheres têm consequências gravíssimas e precisam ser enfrentadas.

Essa conversa é para todos, mas em especial para os homens. Ah e esta conversa é com TODOS os homens!

Se você se considera um aliado, um cara que nunca reproduziu nenhum tipo de violência e que gostaria que elas não existissem, essa conversa é contigo. Vamos falar sobre como interromper ciclos, sobre como intervir quando estiver diante de uma violação cometida por outra pessoa. 

Essa conversa também é com você que sabe que já fez uma dessas coisas: repassar vídeos não-autorizados ou que já mandou uma foto íntima sua sem avisa. Com você que já “fuçou” o celular da companheira, acessou contas sem autorização, julgou ou xingou mulheres por comentários, criou perfil falso para seguir alguém.

Todas essas coisas, são formas de violência de gênero online. Essa conversa é com todos os homens por serem os principais perpetradores de violências contra mulheres. E não estamos falando só de “predadores”, de homens com um vasto histórico de misoginia e violências. Não, muitas violações online, como as que citamos agora, passam despercebidas no dia a dia acelerado de uma cultura desigual on e offline. 

Apenas 4% dos rapazes reconhecem que já tiveram atitudes violentas contra parceiras, mas quando são citados alguns tipos de ações violentas, 55% dos homens admitem que já terem praticado alguma delas contra uma parceira.- Data Popular a instituto Avon 2014

Se seguirmos no automático, se não pararmos para olhar com cuidado para certas ações, não daremos conta de enxergar essas violências. Só quando as identificamos, podemos então, freá-las. 

Trazemos aqui um aprofundamento no tema para que mais homens possam aprender, refletir e se recolocar no tema. Não queremos apontar dedos, não é sobre culpa, é sobre um processo de responsabilização e transformação. É sobre tornar-se um aliado ativo, na prática, no dia a dia. 

A violência virtual é uma violência real…

… e muitas vezes também é uma violência pública e “compartilhável”, deixando a vítima super exposta e ainda mais suscetível a outros tipos de violências, como assédios e humilhações online.

“Quando você sofre um crime de internet, sofre três dores: a da traição da pessoa que você amava, a vergonha da exposição e a dor da punição social. As vítimas deste tipo de crime são responsabilizadas pela maioria das pessoas, enquanto o agressor ainda é poupado pela sociedade machista.” – Rose Leonel, jornalista e fundadora da ONG Marias da Internet, em depoimento no Fórum Fale sem Medo de 2014.

Estamos falando aqui, por exemplo, de violências como a distribuição de conteúdo íntimo não consentido, em outras palavras enviar vídeos e nudes de mulheres sem autorização (com ou sem intenção de gerar humilhação pública).

O Instituto Patrícia Galvão ainda chama atenção para o fato de que, no espaço virtual a distribuição de conteúdo é veloz e exponencial, sendo “difícil de controlar e/ou de ser revertido.”

O que são e como acontecem as violências contra as mulheres nas redes?

Se o caso for uma agressão física durante uma briga ou a disseminação de um vídeo íntimo com intenção de causar humilhação, algumas frases frequentes ditas pelos autores de violência são “ela não se deu ao respeito, então agora está arcando com as consequências”, “se ela tivesse me ouvido, ficado comigo, nada disso estaria acontecendo”. 

Assim como no mundo presencial, as violências de gênero estão baseadas em crenças de posse, de controle do masculino sobre o feminino. Dentro desta lógica caso certas expectativas masculinas não sejam correspondidas, caso tal mulher tenha um comportamento considerado inadequado por determinado homem, ela fica passível de “punição” por isso. 

Aqui vamos elencar alguns tipos de violência de gênero online para que seja possível reconhecer e nomear quando estamos diante de alguns deles

Disseminação de imagens sem consentimento

O que é? 
Quando alguém compartilha imagens ou vídeos íntimos de outra pessoa (majoritariamente, de uma mulher), sem o seu consentimento. Aqui entra a “pornografia de vingança”, relacionada a chantagens e a tentativa de humilhação da mulher após o término de um relacionamento. 

Vale destacar que também é crime transmitir fotos e vídeos de pessoas que você não conhece (e que não recebeu autorização para), mesmo que você não tenha nenhuma intenção de humilhar ou prejudicar a pessoa.

Afinal, você só pode espalhar imagens sob as quais você tenha direitos ou autorização para tal. 

Nesse tipo de crime ainda entram variedade em que o autor da violência cria ou manipula imagens para intensificar a humilhação da vítima.

[Hoje não se usa mais o termo “pornografia de vingança” por dois motivos: 1) pornografia é um material erótico criado (para fins comerciais ou não) com consentimento de todas as partes

2) a disseminação ilegal dessas imagens para fim de constranger ou humilhar a pessoa gravada não pode ser considerado “vingança”, uma vez que não há motivos que justifiquem tal crime]

Humilhação e ofensas ou Cyberbullying:

Ofender e intimidar pessoas, conhecidas ou não, por qualquer motivo (aparência, orientação sexual, peso, cor da pele, comportamento) é uma forma de violência tal qual o bullying, presencialmente.

Perseguição ou Stalking

Aqui nos referimos ao monitoramento, perseguição incessante de pessoas pelos meios digitais, muitas vezes acompanhadas de assédio moral ou sexual.

Também é comum nessa forma de violência que o perseguidor criem contas falsas para acompanhar a tal pessoa, mandar mensagens invasivas ou intimidadoras, fazer chantagens ou ameaças.

Extorsão com base em conteúdo íntimo ou sextorsão

“Se você terminar comigo, eu espalho para todo mundo que…”

Ainda que a pessoa não chegue a compartilhar as imagens íntimas, a ameaça mediante alguma condição é também uma forma de violência de gênero. 

Obtenção e compartilhamento de dados privados ou doxxing

Quando uma pessoa consegue dados da outra, como endereço, telefone, e-mail e usa esses dados para chantagear a outra, ou então os dissemina como forma de gerar um tipo de constrangimento, problema, ou intimidação. 

É possível que o doxxing esteja associado também a informações falsas, montagens e manipulações criadas para causar dano à imagem da vítima, exposição e perturbação da vida pessoal.

Um exemplo: uma mulher foi chantageada por seu ex. Ele fez uma montagem de uma foto dela associando-a ao uso de substâncias ilícitas e  mentindo sobre era tido atitudes irresponsáveis com os filhos. Ele associa essa “fakenews” aos dados reais dela, telefone, local de trabalho, endereço e ela passa então a ser perseguida por pessoas que acusam ou que desejam puní-la por algo que ela nem sequer cometeu. 

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Formação de grupos para humilhação pública ou astrosurfing

Envolve um esforço coordenado entre um grupo de pessoas que se mobiliza para intimidar, perseguir, difamar, espalhar conteúdos ou humilhar a vítima.

Astrosurfing pode envolver todas as formas de violências anteriores, associado ao agravante de ter um grupo organizado para potencializar o dano à vítima. 

Violência de gênero online é frequente

Em 2014 o Instituto Avon e o Data Popular fizeram uma pesquisa sobre violência em relacionamentos, incluindo violências online, como invasão de aparelhos celulares e contas de redes sociais. 

Vale atentar que, de 2014 para 2022, o acesso e tempo de permanência nas redes aumentou consideravelmente. Estimamos que, se refeita a mesma pesquisa, atualmente teríamos índices ainda frequentes de violências online.  

Na pesquisa, ficou constatado que:

– Mais da metade dos homens, depois de ver a lista, reconhecem já haver cometido um tipo de violência

“Apenas 8% das mulheres admitem espontaneamente já terem sofrido violência do parceiro e só 4% dos rapazes reconhecem que já tiveram atitudes violentas contra parceiras, o que evidencia a naturalização e banalização da violência contra as mulheres. Mas quando são citados alguns tipos de ações violentas, 66% das mulheres reconhecem que já sofreram violência e/ou controle por parte do parceiro e 55% dos homens admitem que já praticaram violência contra a parceira.” -Data Popular e Instituto Avon, 2014.

– Depois do término, metade das mulheres passaram por algum tipo de assédio online

“51% relatam que, após o término do relacionamento, sofreram ameaças, foram seguidas pelo ex, ou este ficou enviando mensagens ou ainda espalhando boatos sobre a mulher.” – Data Popular e Instituto Avon, 2014.

– Tentativas de controle pela informação

“40% [das mulheres] declaram que o parceiro tentou controlá-las por meio do telefone para saber onde e com quem estavam, e 53% das jovens já tiveram mensagens ou ligações no celular vasculhadas.

Uma em cada três jovens também já foi proibida de conversar virtualmente com amigos, sofreu invasão da conta de alguma das redes sociais utilizadas e até mesmo amizades virtuais foram excluídas pelo parceiro.” -Data Popular e Instituto Avon, 2014.

–1 a cada 4 dos homens já espalhou imagens sem autorização

“28% dos homens ouvidos no estudo afirmam ter repassado imagens de mulheres nuas, aparentemente produzidas sem autorização, que receberam pelo celular, sejam elas fotos ou vídeos.” – Data Popular e Instituto Avon, 2014.

Isso acontece com mulher que…

Muitas vezes vemos o seguinte argumento: a violência contra mulheres poderia ter sido evitada pelas escolhas ou pelo comportamento da mulher que foi agredida. Não funciona assim.

Nenhum comportamento da mulher pode ser usado como justificativa para um ato criminoso que foi cometido por outra pessoa. O homem autor da violência, apenas ele tinha a escolha de como agir, ele poderia ter evitado a violência a partir do controle de suas próprias ações.

A lógica da responsabilizar a vítima não funciona.

Sim, as violências atingem todas as mulheres, de todas as classes, idades e raças. No entanto sabemos que as proporções são diferentes. Em relação a violências sexuais, 60% dos estupros, por exemplo, são cometidos contra menores de 13 anos. 

Nunca podemos culpar a vítima, nem responsabilizá-la por “ter evitado”.

Atos de violência de gênero são cometidos quando o autor da violência se vê na posição de poder e decide controlar, se aproveitar ou punir meninas e mulheres.

O comportamento da vítima não é um dos fatores que aumenta a chance disso acontecer. A vulnerabilidade social é. Ou seja idade, classe social, relações de poder, tudo que estabelece uma dinâmica em que a o autor se vê numa posição “segura” para cometer um crime sem encarar consequências.

Assim como as meninas menores de idade são as mais vulneráveis a violências sexuais, as mulheres negras são as mais vulneráveis ao feminicídio. 

QUEBRE O CICLO, SEJA UM ALIADO!

Como homens podem se responsabilizar e agir de maneira mais responsável pelo bem de todas?

1. Tirando o argumento moral de jogo

Começamos por desmistificar que violências são engatilhadas pelas vítimas, ou que poderiam ter sido evitadas se o comportamento delas tivesse sido mais “discreto, recatados, submisso”. Sabemos que tentar combater a violência de gênero olhando para isso é errado na teoria e, na prática, não funciona.

Pelo bem da família, das meninas, das crianças, das mulheres, é preciso que os homens possam olhar criticamente para os argumentos morais e que troquem esse discurso por um olhar autoimplicado, responsabilizante. 

2. Entendendo como essas violências se manifestam na prática

Os tipos de violências contras as mulheres são muitos e alguns são tão frequentes que parecem “normais”.

Repassar vídeos ou fotos íntimas sem autorização, fazer comentários ofensivos em foto de quem você não conhece, criar perfil falso para seguir a ex, vasculhar as redes da companheira… Apesar de corriqueiro, essas ações infringem os direitos de outras pessoas e precisam acabar.

3. Olhando para si, com coragem e honestidade

O ponto aqui é fazer uma auto análise, perceber onde e quando você mesmo acaba cometendo essas atitudes e, então, se comprometer a quebrar estes ciclos. 

4. Saindo de observador passivo para aliado ativo

Seja você alguém que precisou rever suas atitudes ou alguém que realmente nunca cometeu nenhuma dessas violências, você pode se comprometer a ser um aliado ativo, intervindo ao ver alguma dessas ações acontecendo.

Além de não repassar um vídeo não-consentido, por exemplo, você pode informar o porquê seus amigos deveriam deixar de fazê-lo e denunciar contas que compartilham. 

Como conversar com homens sobre violência contra as mulheres?

Este nosso e-book oferece caminhos práticos para dialogar com quem sofreu e também com quem cometeu abuso. Nele explicamos o que é o ciclo da violência e indicamos sinais comuns de abuso.

Situações de violência em um casal são relacionais, mais profundas e complexas do que aparentam à primeira vista, e cabe bastante atenção ao mergulharmos nas nuances desse tema.

Baixe gratuitamente nosso livro-ferramenta “Como conversar com homens sobre violência contra as mulheres

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Seguimos juntos e juntas pelo fim das violências contra meninas e mulheres, on e offline.

Gabriella Feola

Editora do Papo de Homem e autora do livro <a href="https://www.amazon.com.br/Amulherar-se-repert%C3%B3rio-constru%C3%A7%C3%A3o-sexualidade-feminina-ebook/dp/B07GBSNST1">Amulherar-se" </a>. Atualmente também sou mestranda da ECA USP