Wittgenstein, Espinosa, Nietzsche, Siddharta Gautama, Sartre, Kant, Merleau-Ponty, Humberto Maturana, Nagarjuna, Francisco Varela, Thomas Nagel, Dogen, Hilary Putnam… Acredite, dá para ter uma aula de filosofia da percepção com base nesses grandes sábios sem que nenhum deles seja citado.

Filosofia do jeito que deve ser. Com corpo, com olhos, com cheiro, com o mundo sensorial, com reflexões que são abstratas de tão concretas, que não se separam de nossa percepção usual do mundo, mas a ampliam.

Estamos discutindo esse vídeo na Cabana PdH; resolvi compartilhar aqui também. É uma fala de 12 minutos do Prof. Dr. Clovis de Barros com uma genial produção do coletivo Galeria Experiência. Recomendo muito. Vale a pena parar, ver, ouvir:

Link Vimeo

“Como ter certeza de que estamos todos no mesmo mundo?”

O professor trabalha com uma base filosófica excelente, bem ilustrada naquela imagem “Drawing Hands”, do Escher (que reproduzo abaixo), e na pergunta clássica do Zen: “Qual é o som de uma só mão batendo palma?”. Lembrei também dessa fala do Francisco Varela e do experimento de percepção que já propus aqui no PdH.

“O que vemos, na verdade, conta muito mais de nós do que do mundo.”
“Quando observamos o mundo, muitas vezes acabamos caindo na ingênua crença de que o que vemos é o que é, sem perceber que o que é sempre nos escapará.”
“Tudo que percebo do mundo, ao final das contas, percebo em mim. O mundo não passa do meu próprio corpo afetado pelo mundo.”
“Assim, quando vemos, vamos descobrindo muito a nosso respeito e o mundo acaba sendo o nosso espelho. Quando vemos o mundo, na verdade, vemos com os sentidos que são os nossos e, por isso, acabamos aprendendo mais sobre a nossa capacidade de ver as coisas do que sobre as coisas elas mesmas.”
“A nossa percepção não é um encontro mecânico com a realidade que supostamente existe.”
A percepção que eu tenho do mundo depende de todo o corpo. Dele participam o peristaltismo intestinal, o fígado, o cotovelo, o joelho, as alegrias, as tristezas, as dores, as esperanças, as frustrações e os sucessos. E é por isso que, quando estamos alegres (ou tristes), vemos mesmo o mundo diferente. Porque não é só uma questão de olho ou de ótica, é uma questão corporal. Todo o corpo encara o mundo, todo o corpo participa da percepção.”
“É importante perceber que a imagem percebida age sobre nós e nos alegra e nos entristece. Da mesma maneira, a alegria e tristeza que sentimos age sobre a imagem e a percepção e define o mundo que se apresenta diante de nós.”

Escher, “Drawing Hands”: pra enxergar melhor a relação entre eu e o outro, eu e o mundo.

Senti falta de algo que vejo ausente em toda a filosofia ocidental. O discurso se encerra como discurso e ninguém propõe uma prática corporal para sustentar essa visão ampla.

Leia também  3 receitas vegetarianas para fazer bonito sem sujar louça

O último minuto do vídeo é ótimo, metalinguístico, faz referência ao próprio vídeo sendo produzido ali naquele momento e visto depois por nós, mas e aí? Fechamos a página e voltamos à nossa percepção autocentrada e desincorporada? É isso? Uma percepção estreita com pausas semanais ou mensais para “filosofar”? (Meu questionamento não se dirige ao professor, mas a cada um de nós).

Abração.

Gustavo Gitti

Professor de <a>TaKeTiNa</a>