Coisas que você deve saber antes de voltar ao vinil

Objetivamente falando, o vinil não oferece o melhor som. Porém, carrega várias outras qualidades, peculiaridades estéticas e significativas que fazem dele muito mais do que uma plataforma de registro e reprodução musical.

O vinil suscita vários aspectos emotivos, táteis, físicos e psicológicos a respeito da música e do fetichismo que é possuir um objeto tão icônico quanto as canções que vêm em seus sulcos.

Ele possui um ritual, é necessário evocar sua atenção completamente e o ato de trocar os lados é um lembrete que não deixa você se distrair por muito tempo. Você vai ter de se voltar a ele, colocar suas mãos na bolacha, posicionar a agulha e aumentar o volume novamente, se quiser dar continuidade ao álbum.

Pra mim, a maior parte da diversão está em cair de cabeça na pira de colecionador e na paranoia da perfeição, na engenharia, nas minúcias do que é preciso se preocupar para chegar "lá", naquele lugar sonoro embolorado, quentinho e nostálgico.

Aqui vai um guia com algumas coisas para se levar em consideração, antes de começar a comprar vinis de novo.

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O que, afinal, é diferente?

O Eduardo Pinheiro já explicou isso no texto Som: entre a fidelidade e a nostalgia. Copio aqui algumas das partes mais relevantes pra nós.

Por exemplo, as pessoas que preferem o vinil louvam suas qualidades orgânicas e, em particular, como os graves são envolventes. Isto é totalmente verdade. No entanto, o som digital, como ele é registrado num CD, por exemplo, é efetivamente mais fiel (isso pode ser fisicamente medido).
Os graves envolventes do vinil são resultado de distorções eletromecânicas: e aí que está, o tal grave envolvente é um “artefato” introduzido pelo modo de reprodução, ele não é fiel a música que é produzida normalmente (a não ser que ela seja produzida de forma a exatamente imitar esse artefato). Porém, o que ocorre é que os artefatos digitais existem e, embora sejam mais sutis, nós, ao longo do tempo (e também pela questão de hoje ser mais incomum) criamos uma relação emocional com os artefatos do vinil.
Então o vinil tem um som diferente, menos fiel, com mais artefatos (além da distorção nos graves, os estalidos, e muitos outros tipos), mas que pode nos soar melhor por uma série de razões. E, de fato, podemos argumentar que certas músicas, particularmente as antigas, foram pensadas para serem ouvidas nesse meio – e que, portanto, existe uma “fidelidade” no sentido de ouvirmos como era ouvido no passado.

Qual toca-discos comprar?

Essa é uma questão que vai depender da relação entre investimento e qualidade.

Se você se preocupa apenas com a questão estética e quer convidar os amigos para tomar uma cerveja enquanto ouve um álbum do Led Zeppelin na mídia em que foi concebido, talvez não seja preciso gastar tanto.

Mas se você quer tornar evidentes as verdadeiras qualidades da plataforma, com os detalhes do espaço sonoro analógico, pode ser então que um investimento maior seja necessário. Mas, creio eu, esse segundo caso deve ser raríssimo e desnecessário na maioria das vezes.

A maior parte dos toca-discos de hoje são muito melhores que a média dos que circulavam no mercado na época. Tendo isso em vista, a dica que fica é: evite os aparelhos antigos. O principal ponto contra eles, na prática, é a alta fragilidade e dificílima manutenção, o que os torna caros.

Mas, claro, se você quer entrar de cabeça na pira de colecionador, vá fundo.

Outro ponto a favor de toca-discos mais recentes é que a maioria deles já vem com o item mais obscuro e difícil de compreender quando o assunto são sistemas de som: os pre-amps.

Pequena preciosidade produzida pelo Jack White
Pequena preciosidade produzida pelo Jack White

O que são pre-amps? Preciso de um?

De uma forma bastante grosseira e resumida, podemos explicar assim: as agulhas dos toca-discos geram um sinal ridiculamente fraco, que precisa ser amplificado muitas vezes até gerar um som audível para nós. O dispositivo responsável por essa tarefa é o pre-amp.

Em geral, os toca-discos mais recentes já vêm com um embutido, mas é algo que você precisa checar. Caso eles não venham com uma entrada marcada como "phono", você provavelmente precisa de um dispositivo externo, que vai servir de pre-amp.

Esse dispositivo é o receiver. É ele que vai processar o som, vai distribuir o sinal para as caixas. Alguns funcionam também como receptor de  rádio.

Além disso, caso você queira montar um sistema mais completo, é para ele que você joga o sinal de um CD player ou televisão, por exemplo.

Caixas de som

Não que exista uma parte "menos importante", já que tudo vai compor um conjunto e, quanto melhores os componentes, melhor o todo que eles vão formar. Mas, sim, as caixas são muito importantes. Elas influenciam, por exemplo, qual o volume e quais faixas de frequência você vai realçar quando o som estiver saindo por elas.

A principal perda que você pode ter por comprar falantes ruins é distorção e perda de frequência. Sabe aquela sensação desagradável de ouvir música pelo celular? Pode acontecer com você, se escolher mal suas caixas.

A agulha

Esse item costuma precisar de manutenção regular. Tanto é que a peça, em geral, é facilmente substituível.

Aqui tem um guia para você fazer o trabalho sujo.

Rotações, espessura, cores, tamanhos... e todo esse jargão, o que significa?

Os vinis propriamente ditos variam muito de tamanho, cor, espessura e quantidade de rotações. Pode parecer um pouco confuso no começo, mas na realidade é bem simples.

O tamanho influencia principalmente na quantidade de músicas e no tempo de execução do álbum.

Os singles vinham em vinis de 7 polegadas, menorzinhos, feitos para serem mais baratos. Você basicamente comprava uma música e ganhava outra do outro lado do disquinho, os tais B-sides.

Os discos de 12 polegadas são os álbuns completos que têm cerca de 22 minutos de cada lado. É por isso que os cd's de hoje, que costumam ter uns 60 minutos de duração, geralmente resultam em vinis duplos.

Eles são feitos para, basicamente, três tipos de rotações: 33 1/3 RPM, 45 RPM, e 78 RPM. Você olha a rotação correta especifica no seu toca-discos, para garantir a velocidade correta de execução.

Os discos também vêm em muitas edições coloridas, combinando com a arte da capa. É um recurso estético bem interessante, que dá todo um plus no visual da coisa, mas alguns audiófilos não gostam, pois o preto tem uma função de aumentar a durabilidade do produto.

Quanto à densidade/espessura, os vinis de hoje são bem mais grossos e pesados que os de certos períodos. É comum que você veja um selo nas capas dizendo que aquele disco tem "180 gramas", por exemplo. O ponto é que o vinil também sofre desgaste à medida em que vai sendo usado e quanto mais denso e grosso o vinil, maior a durabilidade. Dizem que faz diferença no som também.

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Álbuns clássicos: há diferença entre os vinis de hoje e os antigos?

Sim.

A principal, eu diria, é que os vinis de hoje, em sua maioria, não são derivados das masters originais – sugiro ler um pouco sobre como é a masterização de um álbum –, mas das masters das versões em CD. Isso acontece porque os selos que distribuem os álbuns não possuem acesso às masters analógicas originais, por isso recorrem ao arquivo digitalizado.

Há um lado relativamente bom: álbuns remasterizados costumam vir com um grave mais acentuado e uma certa dose a mais de ganho, o que pode melhorar a percepção do som, de certa forma (ok, esse é um ponto sensível, se quiser saber mais, recomendo ler sobre loudness wars).

O problema é que isso mata totalmente a graça de se ter uma versão em vinil de um álbum clássico. Basicamente, você só está comprando uma versão cheia de ruído e estalos de um CD.

Por isso, se tiver a chance de comprar uma cópia de prensagem original, não pense duas vezes. A experiência é outra.

O mercado de colecionadores

Uma das melhores partes de se comprar vinis é que eles são extremamente colecionáveis. Isso quer dizer que ao comprar um álbum, você provavelmente está adquirindo um objeto que, daqui a alguns anos, pode valer alguma coisa.

Essa é uma qualidade que os arquivos digitais nunca vão possuir, afinal, tratam-se de dados facilmente copiáveis, sem o aspecto material que torna os álbuns em vinil tão interessantes. É o ritual completo que nos fascina.

Sabe aquela coisa bonita de ir a uma  livraria e escolher justo aquela edição de capa dura do livro que você ama? É por aí.

Claro que essa não é a melhor forma de se fazer grana, mas é bom saber que algum dia, seus discos podem salvar você de um perrengue.

Álbuns antigos, álbuns clássicos, álbuns tardios e mesmo os lançamentos recentes, todos têm o seu devido valor, muito mais emocional do que objetivo – o que  torna até um pouco difícil de mensurar.

E vocês, gostam de vinil? Têm toca-discos em casa? Quais álbuns estão ouvindo?


publicado em 20 de Setembro de 2013, 07:10
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Luciano Ribeiro

Cantor, guitarrista, compositor e editor do PapodeHomem nas horas vagas. Você pode assistir no Youtube, ouvir no Spotify e ler no Luri.me. Quer ser seu amigo no Instagram.


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