"Cascamorras", um homem contra dez mil: Conheça na série Archaic Festivals

Uma briga que vem de 1490 e se transforma em uma das maiores festas da Espanha, cheia de graxa e sujeira

Uma disputa de mais de 500 anos entre duas cidades no sul da Espanha: os Accitanos, da cidade de Guadix, contra os Basetanos, de Baza.

Conheçam a festa Cascamorras, na região de Granada.

 

Em 140, durante a construção de uma igreja em Baza, um trabalhador ouviu vozes. Ela pedia por piedade. Seguindo a tal voz, indo em busca dela, Juan Pedernal encontrou uma pequena imagem de santa, a Nossa Senhora da Piedade. Ele levou a pequena imagem para sua cidade, Guadix, há 46 quilômetros, mas os locais de Baza pediram-na de volta para o local onde foi encontrada.

Disso, a rivalidade e um acordo. 

Todos os anos, um representante de  Juan Pedernal, chamado então de Cascamorra, tem a chance de reaver a santa para Guadix, se ele conseguir entrar na Igreja da Piedade, em Baza, e levá-la de volta a Quadix.

Há apenas duas condições: ele tem que ir à pé; e ele não pode se deixar pintar.

No caminho, dez mil pessoas bezuntadas em tintas, óleos e graxas.  

 

 

Os "Cascamorras" são escolhidos pela Irmandade da cidade, pelos "guardiões da festa", que precisam estar próximos das funções da igreja e precisam escolher sabiamente quem vai representá-los nessa disputa.

Em conversa entre o entrevistador e a esposa do Carmamorra escolhido, sobre os perigos de tal função:

"É como ser mulher de um toureiro?"

"Pior! Tem um só touro. Aqui, são duas, três mil pessoas."

 

 

Um dia antes, eles fazem a procissão e a festa e, no mesmo local em que eles saúdam o Cascamorra, lá será também o posto onde ele vai pedir desculpas à população caso falhe.

Em mais de 500 anos de pelejas, nenhum deles teve sucesso.

São quatro quilômetros entre o começo da prova, nas montanhas de Baza, até a igreja. Esse caminho vai ser percorrido em aproximadamente duas horas. Logo de saída o Cascamorra é agarrado pelos adversários e coberto de tinta preta. A derrota é veloz e iminente. Mas eles deixam o fracassado seguir corrida em luta e ele simbolicamente entra na Igreja da Piedade. 

Depois disso, descanso e banho.

 

No dia seguinte, é hora de se vestir novamente com as roupas folclóricas de Cascamorra, para se desculpar com a pequena população de Guadix por faltar com sua meta de trazer de volta a santa. E começa outra batalha, contra os seus próprios conterrâneos, todos sujos em cores pastéis.

Eles correm atrás do Cascamorra que se defende com sua arma. Trata-se de um pedaço de pau com chicote de couro acoplado na ponta, chamada de "Porra". 

Do alto da janela, pessoas jogam baldes de água na disputa que acontece na rua e, ao final, redimido e bem, o Cascamorra sobe em um caminhão de bombeiros e lava todo mundo.

 

 

Do Archaic Festivals, já publicamos o primeiro episódio, o Um rugby com 7000 homens. Nas próximas semanas, daremos sequência na série.


publicado em 12 de Abril de 2017, 00:00
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Jader Pires

É escritor e colunista do Papo de Homem. Escreve, a cada quinze dias, a coluna Do Amor. Tem dois livros publicados, o livro Do Amor e o Ela Prefere as Uvas Verdes, além de escrever histórias de verdade no Cartas de Amor, em que ele escreve um conto exclusivo pra você.


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