“Vivemos o tempo dos objetos: quero dizer que existimos segundo o seu ritmo e em conformidade com a sua sucessão permanente. Atualmente somos nós que os vemos nascer, produzir-se e morrer, ao passo que em todas as outras civilizações anteriores eram os objetos, instrumentos ou monumentos perenes, que sobreviviam às gerações humanas.” (Jean Baudrillard, em A Sociedade de Consumo)

Brinde de anunciantes vira objeto de desejo e símbolo de exclusão da Copa

A foto acima não é o retrato de uma cadeia superlotada. É um retrato do consumo como manifestação da identidade.

A imagem foi capturada por mim ontem, na estação Cosme e Damião do metrô do Recife, após o empate entre Costa Rica e Grécia pelas oitavas-de-final da Copa do Mundo de 2014. É o registro de parte das centenas de pessoas (a maioria crianças) que, aos gritos, disputavam os copos que os patrocinadores distribuem a cada cerveja, refrigerante ou água comprada em um dos estádios do Mundial.

Durante os últimos anos, muito se falou sobre a etilização da arquibancadas da Copa do Mundo em razão do alto preço dos ingressos. Em 2013, falamos muitos dos rolezinhos.

Miramos o que vimos, acertamos o que não vimos. No bairro da Várzea, alguns copos de plástico foram mais que o suficiente para escancarar o tamanho do abismo que há entre os torcedores que levavam os souvenires e os moradores escorados no corredor gradeado rumo à linha do trem.

Ali, colocar a mão em um Copo era, na prática, um maneira de fazer parte da Copa que só se vê na televisão.

Torcedora e a doação dos objetos de desejo: copos viram símbolos de exclusão da Copa
Foi assustador olhar a cena. Perguntamos a um rapaz com 20 copos: “Por que você quer tantos copos?”. “Pra fazer coleção”. “Para beber?”. “Não. Para enfeitar a casa”.

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Uma Copa do Mundo se faz com pessoas.

As que entram em campo, as que viajam para testemunhá-la, as que enchem as ruas, as que se voluntariam, as que torcem e as que veem no evento uma oportunidade para garantir seu sustento ou para extravasar.

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A seção “Álbum de Figurinhas” pretende contar, com um microrrelato artesanal e um retrato por dia, a história de algumas dessas pessoas, muitas vezes invisíveis, que povoam os bastidores da Copa do Mundo do Brasil.

recife

Para ler todos os textos, basta entrar no nosso Álbum de Figurinhas.

Ismael dos Anjos

Ismael dos Anjos é mineiro, jornalista e fotógrafo. Acredita que uma boa história, não importa o formato escolhido, tem o poder de fomentar diálogos, humanizar, provocar empatia, educar, inspirar e fazer das pessoas protagonistas de suas próprias narrativas. Siga-o no <a>Instagram</a>."