Como todo menino de uns poucos anos de idade, eu não era dos mais originais na hora de escolher presentes de aniversário. Eu sempre queria uma bola de futebol, que viria para substituir outra, que havia sido chutada em algum telhado vizinho no bate-bola do último final de semana.
Fato curioso essa minha vontade, já que na escala mundial de qualificação dos jogadores de futebol existem os ótimos, os bons, os medianos, os ruins, os péssimos e eu. Mas eu gostava de jogar. Lembro até de sentir uma ponta de frustração quando via o professor de educação física chegando com uma bola que não fosse aquela que todos desejavam. Isso durou até meus 9 ou 10 anos, quando o novo professor decidiu ser menos democrático. O esporte do mês seria o handball. Aqui entram uma série de vaias e feições de revolta, executadas incessantemente por pencas de moleques remelentos e com a camiseta suja de Toddynho.
Passado o impacto inicial, as aulas seguintes foram dedicadas aos fundamentos do novo esporte. Aquilo tudo fazia muito sentido. Fintas, saltos, arremessos, resistência, velocidade, potência e gols. De repente eu começava a achar as aulas de Educação Física extremamente curtas. Eu queria jogar todos os dias. Por horas. Foi ali que deu-se início um hobby/paixão/vício que até hoje não largo. Foram anos dedicados à pratica, inúmeras viagens, várias grandes amizades e situações difíceis às quais sou absurdamente grato. Arrisco dizer que grande parte das melhores pessoas que conheço, passaram pela minha vida por conta do esporte.
Oito anos depois, por conta de escolhas profissionais e limitações próprias, o handball deixou de ser aspiração de futuro e passou a ser, oficialmente, um lazer. O mais aguardados deles. Infelizmente, a situação do esporte aqui é precária. Diferentemente do vôlei ou do basquete, o handball não conta com grandes patrocinadores, e mesmo os jogadores da elite têm problemas sérios para tocar a vida por aqui. E isso vale para ambos os naipes. Exemplificando, mais da metade das jogadoras que integram a seleção brasileira feminina jogam na Europa, onde o esporte é largamente difundido e costuma lotar ginásios imensos.
Caberia uma crítica enorme à maneira como o esporte é conduzido em nosso país. Assim como tantos outros setores, carece de atenção, mesmo tendo conseguido um espaço bastante significativo no meio escolar e universitário. Campeonatos fracos, com poucos times realmente competitivos, jogadores talentosos largando a carreira por conta do salário pífio e trabalho de base sendo conduzido por professores despreparados e desmotivados. Não adianta importar o melhor técnico do mundo para as seleções adultas, não se ganha uma corrida acelerando só no final. O investimento tem que ser feito na base, com a criançada. Novidade, não?
Uma amostra do que rola nas quadras europeias:
Link YouTube | Vaselinas (gols de cobertura) e bolas de efeito.
Link YouTube | The most American sport that Americans don’t know about
Link YouTube | O lance mostrado nos 2:10 foi feito nas Olimpíadas.
20o Mundial Feminino de Handball
O mundial feminino começou em 3 de dezembro deste ano, e o país sede é o Brasil. As maiores potências do mundo estão presentes, e a seleção brasileira tem grandes chances de fazer um belíssimo campeonato. Acho que nunca tivemos um time tão competitivo. O melhor de tudo isso é que todo o esquema é muito acessível. Os jogos foram distribuídos em quatro grandes ginásios: José Corrêa, em Barueri, Arena Santos, em Santos, Adib Moisés, em São Bernardo, e o tradicional Ginásio do Ibirapuera, em São Paulo, onde o Brasil faz seus jogos da fase de grupos. No grupo do Brasil estão Cuba, Japão, Tunísia, Romênia e França, os dois primeiros já devidamente derrotados por nossa seleção.
Até onde pude conferir, tudo foi muito bem organizado, com funcionários e voluntários apaixonados pelo esporte. Recomendo demais conferir ao menos um jogo ao vivo, especialmente àqueles que possuem como última lembrança do esporte a aula de educação física do colégio. Amanhã mesmo, dia 14/12, o Brasil enfrenta a Espanha, após um vitória bastante consistente sobre a Costa do Marfim. A vitória do Brasil sobre a França foi surpreendente.
E para quem estava acostumado com ginásios vazios, o público tem colaborado. Mérito para o comitê de organização, que optou por fechar uma parceria com uma empresa de turismo extremamente bem relacionada com as escolas de São Paulo, o que facilitou a vinda de grupos escolares e universitários para prestigiar os jogos:
As finais serão realizadas neste domingo, dia 18, no ginásio do Ibirapuera. Os ingressos custam meros R$ 10 e podem ser comprados online. Independente dos resultados daqui para frente, a seleção brasileira está de parabéns. Potencial nós temos, resta saber se o projeto de apoio e incentivo ao esporte terá continuidade, ou se será guardado com carinho em alguma gaveta por aí, igual a tantos outros.
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