"Nostalgia!
Você está querendo ser turista da própria juventude."
(Sick Boy/Simon)

O que o Trainspotting tem de mais especial é ter captado, lá em 1996, o zeitgeist (o espírito da época) mais preciso e gostoso daquela geração desiludida. Seria de uma estupidez juvenil querer repetir isso vinte anos depois. Ainda bem que Danny Boyle é um cara muito inteligente pra cair na caricatura de si mesmo. E, com isso, temos em T2: Trainspotting, um baita filme que fala dos desapontamentos da vida adulta.

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Você toma drogas e fica desapontado. Você "escolhe a vida" e fica desapontado. Você é uma criança desapontada com a infância, aspirando a independência e vivacidade da vida adulta e, quando vira adulto, fica desapontado com suas escolhas, com aquelas feitas inerentemente pela vida para você.

Um ciclo interminável de desapontamentos.

É do que se trata Trainspotting, no fim das contas. Vinte anos depois e tudo continua uma bosta na vida dos quatro amigos. Eles continuam sendo os mesmos, só que num mundo completamente diferente. 

Edimburgo agora é uma cidade cortada por modernos bondes, rápidos e silenciosos, brilhantes como as vitrines das lojas bem iluminadas e cheias de modernidades. Passamos pela euforia do começo do século 21, pelas explosões de novas tecnologias, o britpop hoje é coisa de museu, assim como a música eletrônica produzida no final dos anos 90 que canibalizava o rock n' roll de Iggy Pop, assim como as novas drogas sintéticas tomavam conta das noites no lugar da heroína.

Agora os vícios são outros.

T2: Trainspotting é o mesmo filme, mas em outro mundo, duas décadas mais velho. Outro ritmo, outro propósito, mas a mesma ideia de sobreviver em meio ao desgosto, a decepção com o cotidiano, o desencanto com a própria vida. Boyle faz menções constantes ao primeiro filme de maneira muito equilibrada e bonita, uma quase homenagem, mas com os dois pés fincados no presente e com a clareza de que não precisamos voltar lá para dizer que aquilo era legal. 

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"Fique viciado em outra coisa", diz Renton a Spud após a subida na montanha. Esportes, consumo, sexo. Você pode se apegar a várias coisas e continuar sendo o perdedor de sempre. O diretor explora essa "nova" crítica mesclada com as velhas impressões sobre a frustração no Reino Unido, contidas, por exemplo, na saudade do futebol com George Best no ápice de sua carreira na década de 70 .

Danny Boyle faz muito bem em pegar a cerne estética de seu Trainspotting, mas imputar uma velocidade diferente, mais reflexiva, menos impulsiva.

Afinal, já que vamos ficar desapontados, pra quê se repetir?

Jader Pires

É escritor e colunista do Papo de Homem. Escreve, a cada quinze dias, a coluna <a>Do Amor</a>. Tem dois livros publicados