Semana passada tive a oportunidade de assistir a três palestras no Social Media Week, o maior evento do mundo sobre mídias sociais, que acontece simultaneamente em 9 cidades do planeta.
Curiosamente, as três conversas tornaram-se, a meu ver, contraditórias, porém complementares à forma como entendo a comunicação e, principalmente, a sociedade brasileira. De cara, vamos às palestras e alguns pontos que gostaria de ressaltar:
1. “Quantos, quem, onde, por que somos?”, com Renê de Paula (Locaweb) e Gil Giardelli (ESPM/Gaia), mediado por Pedro Doria (Estadão).
A discussão girou muito sobre o valor das mídias sociais, sua influência na sociedade brasileira e também sobre o perfil do público usuário. A indagação de um dos palestrantes que mais me chamou a atenção (não vi quem era pois estava sentado atrás de uma pilastra no único ponto vazio possível de permanecer na sala) foi a de que a sociedade brasileira não aprendeu a usar as mídias sociais. Que marcas, empresas e pessoas criam blogs, perfis no Twitter, fan pages no Facebook e não conseguem mantê-las. Que é fácil criar, difícil é continuar. E sugeriram que o motivo disso é que o único uso de massa web brasileira é para fazer graça e comentar o Big Brother.
2. “Desvendando @s”, com Bia Granja e os tuiteiros @NairBelo, @MussumAlive e @HebeCamargo.
A conversa uniu o público à apresentadora para tentar se aprofundar sobre os perfis (físicos e pessoais) de quem mantém os perfis fakes de celebridades no Twitter.
O painel foi exatamente uma celebração exata do perfil (social) criticado no papo anterior. Pessoas comuns, que utilizam as redes sociais para fazer graça, tem pouco a acrescentar em termos de conteúdo e reflexão e são idolatradas por uma imensa massa de seguidores. Os três perfis somam juntos mais de 200 mil seguidores no Twitter.
3. “Voz e visão do presidente”, com Fábio Barbosa, presidente do Conselho do Banco Santander.
A palestra teve como foco a mudança do mundo, do país e das pessoas. Com destaque para a interdependência entre economias, culturas e pessoas no mundo atual. Fábio, entusiasta da sociedade Wiki, usou de dados para comprovar a evolução do mundo, o crescimento estável e notável do Brasil e o Banco Santander como um modelo de construção colaborativa por um mundo melhor.
Como principal destaque vejo sua saudável obsessão pela valorização do indivíduo como responsável pelas mudanças do mundo. A necessidade de ser exemplar e dar exemplo para realizar conquistas pessoais que se revertem em vitórias sociais.
Findado o resumão das três palestras, vamos ao que interessa.
Somos uma sociedade bebê
Um comentário muito específico do Fábio Barbosa me fez estabelecer, imediatamente, todas as conexões entre os três assuntos tão diferentes abordados em sequência. E chegar a algumas conclusões que já eram motivo de assunto de mesa de bar entre minha namorada, um grande primo e eu. A resposta para a indignação dos primeiros palestrantes é simples: vivemos em uma sociedade que ainda está em processo de amadurecimento.
Fábio disse, já quase no final de sua participação, que tinha acabado de voltar de Oxford, onde sua filha estuda Direito Ambiental. O palestrante disse ter ficado impressionado com o nível aprofundado e pertinente das discussões estabelecidas no curso de sua filha. E que aqui no Brasil, onde deveríamos ser o centro de todas as principais discussões de proteção ao meio ambiente, não havia grandes indícios de tamanha preocupação e estudos científicos tão aprofundados.
O presidente do Conselho do Banco Santander está certíssimo. A resposta que une os 3 temas talvez seja uma simples linha do tempo:
- No final do século XI, em 1088, surgiu a primeira universidade do mundo, em Bolonha, na Itália. Oxford, universidade citada, data de 1096.
- A Universidade de Coimbra, em Portugal, surgiu em 1290.
- Em 1912 foi fundada a primeira universidade do país, a Universidade Federal do Paraná.
- A primeira universidade brasileira com um campus foi a de Brasilia (UnB), criada em 1962.
A resposta à pergunta dos primeiros palestrantes e à preocupação de Fábio Barbosa está no próprio desenvolvimento científico do nosso país. Enquanto ainda éramos índios sendo explorados, o mundo já produzia conteúdo crítico e desenvolvia o pensamento científico, algo que apenas mais recentemente é compartilhado com facilidade.
Link YouTube | Fabio Barbosa no TEDxSP (2009)
Há apenas 50 anos o Brasil tem a preocupação de unir diferentes campos da ciência e estudá-los de maneira científica e crítica. Sem desprezar, é claro, qualquer estudo realizado previamente, destaco aqui apenas a constituição de um ambiente amplo e puramente acadêmico.
Nossa sociedade é uma criança sendo alfabetizada pelo Twitter, recebendo milhões de informações para a sua formação pelos mesmos métodos de compartilhamento elogiados por Fábio Barbosa. Estamos sujeitos a erros e acertos aprendendo a caminhar como país em um mundo que vive a revolução mais veemente de sua história.
Nosso povo carece de pensamento crítico. Não nos falta vontade, nem nosso perfil merece ser eternamente almadiçoado. Ainda não chegamos na adolescência e nosso melhor brinquedo é o Orkut.
Enquanto os debatedores do primeiro painel citavam a ausência de redes sociais puramente nacionais, já que valorizamos apenas as criações exteriores, eles esquecem de que por aqui ainda há muito a construir antes de trocarmos os dentes.
A nossa sociedade, com todos os defeitos que lhe são naturais, mostra imensa desenvoltura em ser a que mais interage em um mundo tão conectado. Falando de BBB ou com celebridades esquizofrênicas como os fakes, ao menos mostramos ao mundo que já sabemos falar.
Fábio Barbosa pontuou que a mudança é irreversível. Nosso crescimento é impossível de parar. Não falo, assim como o palestrante não falou, sobre economia. A evolução (muito melhor que mudança) é da própria sociedade. Nada mais natural do que evoluir.
Nosso perfil atual, com políticos corruptos, desvalorização do bem-sucedido e endeusamento do malandro, entre tantos outros problemas sócio-culturais, nada mais mais é do que um estágio do nosso próprio aprendizado.
Se em sua palestra Fábio jogacom justiça a responsabilidade desta mudança de atitude no ombro dos indivíduos, eu devolvo a pergunta: se somos nós os responsáveis por separar o lixo, manter nossos valores, escolher nossos líderes políticos e também as empresas de quem compraremos nossos produtos, qual o papel da iniciativa privada para auxiliar neste processo de amadurecimento? Como acelerar o aprendizado e exercitar o pensamento crítico? Qual o papel das marcas para contornar esta nossa defasagem evolutiva que tanto é rotulada como inerente ao nosso povo, nossa cultura e nosso “jeitinho brasileiro”?
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