Não é novidade esse tipo de ensaio fotográfico em que celebridades são retratadas sem maquiagem e/ou photoshop em prol de uma maior veracidade, de menos poluição e exageros na moda e na mídia, contra as opressões da beleza de da juventude.
E são sempre boas e oportunas.
Dessa vez, foi o caso da revista americana Vanity Fair publicar, em sua edição comemorativa de 20 anos, uma sessão com o renomado fotógrafo Chuck Close. Foram 20 celebridades fotografadas com uma Polaroid e “de cara limpa”, sem maquiagem e muita produção.
No meio delas, temos Brad Pitt e a Scarlett Johansson.
Um homem de meia idade que ostenta suas rugas. Pessoas gostam de um homem bonito e com os traços da experiência na face. Nesse caso, há até pessoas que prefiram o ator assim do que quando era mais novo e paquitão. “Um homem de respeito”, diriam.
A Scatlett Johansson significa mais. Uma mulher no auge da vida, endeusada e desejada e foco de atenção em qualquer tapete vermelho por suas maçãs do rosto e seus olhos e seus decotes e silhueta e coxas. Mulheres tentam ser como Scarlett Johansson e mulheres se esforçam para chegar o mais perto possível do que seria a Scarlett Johansson.
Mas a pequena Scarlett é essa aqui. Testa lavada, bolsa nos olhos, maçãs do rosto como as suas — como as minhas — e dentes que não se alinham perfeitamente aos contornos dos lábios. Moleton cinza, aquele apagado, os cabelos sem o esvoaçar da recém saída do cabeleireiro.
E ela é linda.
Isso leva a duas coisas simples:
1. Pare de procurar Scarlett Johanssson nas ruas, nas festas em que você vai, nas discussões sobre taras com os amigos.
2. Mais importante ainda: pare de exigir que as mulheres com as quais você se relaciona sejam uma Scarlett Johansson de tapete vermelho ou de talk show.
Algumas leituras complementares:
Sobre mulheres imperfeitas e tangíveis, por Pedro Jansen;
Quem são as garotas que moram ao lado?
Aquelas que acordam às 6h, tomam banho correndo, tomam um iogurte de café da manhã, leem o jornal e terminam de se maquiar no carro ou metrô. Aguentam esporro do chefe, ganham menos, ignoram todas as cantadas idiotas e nojentas que só nós homens somos capazes de conceber…
São essas mulheres, com uma rotina muito mais excruciante que a nossa, que ainda precisam se manter no peso ideal, sem estrias, sem culotes, sem bad hair day, sem peito caído e mais infindáveis neuras, um bocado delas reforçadas pelos padrões de beleza e ou outro bocado marteladas pela cobrança natural que as mulheres se impõem – para se sentirem bonitas, desejadas, femininas e tantos outros adjetivos.
Nessa correria pra assobiar e chupar cana todos os dias, às vezes escapa uma unha por fazer, uma perna mais cabeluda, uma barriguinha mais saliente.
Mas você, homem consciente, inteligente, sensível e, acima de tudo, esperto, sabe mais do que ninguém que tudo isso é bobagem. E que maior bobagem ainda é reforçar as cobranças que as mulheres já se fazem todo dia.
Prisões estéticas: somos nós os carcereiros, por Giovana Camargo;
Beleza e estética são construções sociais. Se modificam ao longo do tempo e de acordo com a cultura de uma determinada sociedade. Algumas décadas atrás, no Brasil, mulher rechonchuda era sinônimo de beleza e vitalidade. Hoje, as magras e gostosas ganham os holofotes. No Paquistão, Tailândia, Coréia do Sul, Hong Kong, Malásia e Índia, bonito é ser branco, com o uso de cosméticos alvejantes que brutalizam as peles. Na Mauritânia, África Ocidental, quilos a mais são sinal de status e riqueza para as mulheres.
Daí, a libertadora verdade: não existe uma entidade chamada padrão estético que sobrevive à parte de nós.
Somos nós os criadores dos padrões que tanto nos aprisionam.
Scarlett Johansson: quando a beleza (não) atrapalha, por Jader Pires.
Você ser bela ou não influi pouco na sua carreira de atriz. Em contrapartida, a sua carreira artística não te deixa mais bonita do que você já é. Claro que, em Hollywood, não é de hoje que a beleza é fundamental para se construir uma carreira. Vinícius de Moraes teria orgulho dessa receita da indústria americana de filmes. Mas isso não é, de longe, a garantia de sucesso.
Se o trabalho é bem feito, mas bem feito mesmo, pouco importa a beleza.
Puxe uma cadeira e comente, a casa é sua. Cultivamos diálogos não-violentos, significativos e bem humorados há mais de dez anos. Para saber como fazemos, leianossa política de comentários.