Acho que se eu não fosse especialmente apaixonada pelo dom que é ter criatividade – e pela maneira que essas pessoas usam esse dom pra fazer publicidade – eu seria psicóloga.
Eu sou capaz de passar horas, num shopping observando, criticando/elogiando e comentando o comportamento das pessoas. A maneira como elas se vestem, se cumprimentam, conversam, dançam, caminham, tudo.
Existe uma história que eu ouvi no meu 1º ano do ensino médio, de um professor que tem a mesma mania que eu. História que achei tão interessante que queria muito ter presenciado no lugar dele.
Aí embaixo, vai seguir um texto que é mistura do relato dele e de como eu imaginei a situação na minha cabeça, além das reflexões feitas pelo professor e por mim mesma.
Relato-história…
“Estava eu, domingo à noite, no shopping, esperando minha namorada para ir ao cinema. Assim como a maioria das namoradas vaidosas, ela me ligou no celular dizendo ‘Amor, vou atrasar cinco minutinhos, mas tô terminando de me arrumar!’. Como eu não tenho saco pra ficar vendo vitrine de loja, depois de olhar todos os filmes em cartaz, resolvi sentar num banco perto da entrada principal do shopping.
Já estava começando a ficar estressado com o atrasado dela, que obviamente, foram bem mais que cinco minutinhos, até que reparei numa menina – devia ter uns 15 anos – em pé, apoiada numa pilastra.
A menina estava realmente impaciente. Cara fechada, olhava pros lados, pegava o celular, via a hora, bufava. Certamente estava esperando o namorado também. E pelo mau humor que ela já aparentava estar, devia estar ali há mais tempo que eu.
Passaram cerca de uns 15 minutos, e ela ficando cada vez mais e mais brava. Não sei por que ela não ligou pra pessoa que esperava no celular, mas acredito que provavelmente já devia ter tentado, e estava dando recado de desligado ou algo do gênero. Pelo que eu entendi, a única alternativa que ela tinha ali, era só esperar.
Até, que de repente, a expressão da menina mudou, procurei no campo de visão dela e logo vi um rapaz caminhando em sua direção, olhando-a de longe. Ela descruzou os braços e saiu caminhando rapidamente no mesmo rumo, dando uns passos fortes. No meio do caminho, quando eles já estavam mais ou menos perto um do outro, ela começou a falar rápido, e alto até demais:
– Eduardo, você é um idiota! Você me faz de idiota! Eu estou aqui há UMA HORA te esperando! – agora o tom de voz dela muda, já fica mais ‘tremido’ e dá pra perceber que ela está se esforçando pra segurar o choro, mistura de uma provável tristeza ou decepção e raiva, muita raiva. – Você acha que eu sou o quê? – Enfim, ela completa: – Quer saber de uma coisa? Eu te odeio e você foi a pior coisa que já aconteceu na minha vida.
Pausa no filme. Agora que vimos a reação dela, vamos voltar e prestar atenção no rapaz.
Assim como ela, ele também chega caminhando rápido, passos largos, resultando num balanço até cômico do corpo, porque a entrada do shopping é uma descida e ainda de piso irregular (tipo uns tijolinhos, entende?). A cara dele tem uma expressão bem preocupada, olhos um pouco arregalados e tal.
Como a menina começa a falar antes mesmo deles estarem próximos o suficiente para conversar num tom de vez normal, ele nem teve tempo de abrir a boca, só de ouvir. Se a reação dela não fosse tão explosiva, acho que ouviríamos um bom pedido de desculpas, mas pela maneira que ela terminou o discurso, ele tinha que dar uma resposta à altura.
Pausa de novo, volta mais uma vez no momento em que o rapaz chega e dá play:
– Eduardo, você é um idiota! Você me faz de idiota! Eu estou aqui há UMA HORA te esperando! Você acha que eu sou o quê? Quer saber de uma coisa? Eu te odeio e você foi a pior coisa que já aconteceu na minha vida.
E então, eis a resposta fantástica do rapaz:
– É mesmo? Que pena, porque eu te amo, e você foi a melhor coisa que aconteceu na minha vida.
Ela fica de boca aberta, pára a respiração por um segundo e começa a chorar. Ele pega na mão dela, puxa-a gentilmente para si e lhe dá um abraço. Ficam ali uns segundos, ELA pede desculpas, seca as lágrimas com as mãos e eles saem caminhando em direção a bilheteria, sem dizer nada.
Fim.”
Eu adoro quando os homens são assim, romanticamente geniais. Parecia mesmo uma cena de filme, e sabe o que mais me fascinou? Veja bem, ELE NÃO DISSE POR QUE ESTAVA ATRASADO! Pelo menos, não naquela hora, e é o que importa.
Será que?
Ele poderia estar com os amigos, ele poderia ter esquecido o compromisso, poderia estar com outra garota. Mas ele não precisou dizer nada relacionado a isso naquele momento, evitando uma discussão vergonhosa na frente de estranhos. Assim, ele ganhou tempo para inventar uma desculpa, caso precisasse.
Ele conseguiu acalmar a namorada dele usando a raiva dela contra ela: ela se sentiu mal por ter apelado com aquele que a considera algo tão importante e especial! Afinal, o que é um atraso de uma hora vindo de quem te ama? Não é nada! Com certeza, aconteceu alguma coisa, não foi por querer!
Todo mundo sabe, mulheres são mais emotivas. Parece que nessas situações não-calculadas, quem manda é o coração, e não o cérebro. Ela estava com raiva, tinha o direito de estar com raiva e ia botar isso pra fora, ali mesmo, independente de quem estivesse olhando. Não é fácil pra maioria das mulheres respirar fundo e agir racionalmente: perguntar o que aconteceu, ouvir, e daí sim, dizer que está chateada ou perdoar. Não, primeiro eu digo o que sinto, depois eu me intero dos fatos! Posso até mudar de idéia e te perdoar, e não raro, me arrepender da bronca descontrolada.
Já a reação do nosso colega Eduardo, tenho que dizer, é bem suspeita! Por mais rápido que tudo tenha acontecido, existe a possibilidade dele ter dito isso não verdadeiramente de coração, mas porque sabia que ia funcionar. Se isso aconteceu, tenho medo de um homem desses! Ele conhece tanto as mulheres que sabe como lidar com elas, tirando aquela espontaneidade que a gente precisa pra admirar as atitudes deles!
Profundo não? E aí, ele foi racional (e muito inteligente) ou tão emotivo quanto ela?
E pra terminar, deixo aqui mais algumas perguntas em aberto:
– Por que estaria Eduardo atrasado?
– Será que ele deu alguma explicação pro seu atraso? Seria essa explicação verídica?
– Quem será Eduardo? Onde está Eduardo? Será que Eduardo ainda está com aquela garota? Será que Eduardo sentia mesmo aquilo tudo por ela?
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