Eu acredito que tudo que é audacioso, corajoso, meio cinematográfico e errado que acontece na vida real se torna um tanto fascinante. Mesmo que algumas vezes – na maioria delas – o “feito” seja um crime. De todos eles, o que mais impressiona são os assaltos bem sucedidos.
Eu sou um grande fã de filmes do gênero. Por mim poderiam fazer mais uns 30 “‘Tantos’ Homens e ‘Tantos’ Segredos“. “Vida Bandida“, “O Plano Perfeito” e “Uma Saída de Mestre” são os meus preferidos. Sem deixar de mencionar, é claro, o primeiro Missão Impossível. O que me impressiona de verdade não é o crime ou o modo “fácil” de conseguir botar a mão em milhões, é o planejamento, a execução e as bolas de aço.
Essa glamourização não vem de mim – e nem precisaria. O trabalho de Hollywood foi bem feito aqui. E, da mesma forma, também nos ensinou a admirar e respeitar a máfia italiana da metade do século passado. É aquele negócio do “bom ladrão”, do malandro, que nos conquista.
Atribuem ao famoso assaltante de bancos Willie Sutton a reposta à pergunta:
— Por que você rouba bancos?
— Porque é onde o dinheiro está.
Ele diz que nunca falou isso. E eu digo que deveria ter dito.
É com essa que vamos aos maiores assaltos a banco da história.
Banque de France, Toulon, 1992
Link Youtube | Documentário sobre o caso. Está em francês, mas dá pra entender
De acordo com os franceses – e você sabe bem como são os franceses – é o “Caso do Século”.
Em 1992 um bando, contando com informações preciosas de um empregado do banco, sequestrou a família de um dos guardas do Banco da França em Toulon.
Não satisfeito em ter a família dele sob ameaça, decidiram amarrar explosivos no corpo do guarda e ameaçaram mandar tudo pelo ares na véspera de Natal daquele ano, caso não levassem a grana. O guarda, obviamente, abriu o cofre.
O assalto demorou cerca de 20 minutos. Os ladrões conseguiram levar mais ou menos 160 milhões de Francos (uns 30 milhões de Euros, em valores atualizados). Dois meses depois, a maior parte do bando já estava presa. Adivinha só quem entregou o bando? O mesmo funcionário que havia dado informações no início. Mesmo assim, só 10% do dinheiro foi recuperado.
Em maio desse ano, mais de 20 anos depois do assalto, Marc Armando foi acusado de ter sido o mentor do roubo, preso na Holanda e deportado. Na mesma semana em que chegou à França, mais precisamente Marseille, ele se matou.
Banco Central do Brasil, Fortaleza, 2005
Por mais incrível que possa parecer, já que “essas coisas nunca acontecem aqui”, o Assalto ao Banco Central de Fortaleza é considerado o segundo maior roubo a banco da história. Quem leva a primeira posição é o famoso Assalto ao Trem Pagador (falo dele mais abaixo).
Essa história eu sei que você conhece, mas nunca é demais lembrar.
Um “consórcio” de quadrilhas, ou como gosto de pensar, um sindicato de ladrões, comprou uma casa próxima a agência do Banco Central em Fortaleza. Abriram uma empresa de fachada na casa para não levantar maiores suspeitas e começaram a cavar.
Na noite do dia 5 para 6 de agosto de 2005 (coincidência ou não, os dois maiores assaltos da história fazem aniversário na mesma semana), cerca de 23 pessoas roubaram exatos 165 milhões de reais em notas de R$50.
Como? Bem, eles não só cavaram o túnel mais sensacional história – com direito a ventilação e luz elétrica –, como conseguiram repartir o dinheiro e sumir do mapa. Mais de 40 pessoas foram presas por suspeita de participação no assalto, mas do valor total, apenas 8,4 milhões foram recuperados.
Northern Bank, Belfast, Irlanda do Norte, 2004
Esse é mais um dos assaltos que parecem filme. Mas esse é daqueles que você não sente simpatia nenhuma pelos ladrões.
Na noite do dia 19 de Dezembro de 2004, um grupo de homens armados apareceu na casa de um dos oficiais do Northern Bank de Belfast, eles estavam disfarçados de agentes da Polícia da Irlanda do Norte. Após tomar Chris Ward refém e deixar parte do grupo “tomando conta” da família de Ward, eles foram até a casa do supervisor Kevin McMullan e repetiram o procedimento.
Os dois foram instruídos a ir para o trabalho na segunda-feira, como se nada tivesse acontecido. Obviamente deveriam ficar pianinho. Mais ou menos na hora do almoço, Ward encheu uma bolsa com mais ou menos um milhão de libras esterlinas, saiu do banco e entregou a um dos assaltantes num ponto de ônibus próximo.
Mas esse foi apenas um treinamento para o que viria.
Os dois funcionários foram obrigados a ficar no banco após o fechamento, deixando então a passagem livre para os cofres que estavam cheios devido ao período de natal. Os assaltantes encheram vários veículos com a grana e se mandaram. Pouco antes da meia noite a parte do grupo que estava na casa de Ward saiu, felizmente deixando a família em paz.
A esposa de McMullan foi libertada numa estrada nos arredores de Ballynahinch.
Ao todo foram roubados cerca de 50 milhões de dólares. Desse valor foi recuperado algo em torno de 100 mil. Suspeitos foram presos mas nenhum culpado foi encontrado de verdade.
A polícia do reino unido tenta até hoje encontrar o paradeiro dos assaltantes, sem sucesso.
Assalto ao trem pagador – o Assalto do Século, interior da Inglaterra, 1963
Essa é de longe a história mais legal e mais absurda. Concordo que seja o assalto do século.
Bruce Reynolds ouviu falar por meio de seu companheiro de cela sobre um trem que levava valores altíssimos entre bancos de Glasgow, Escócia e Londres, Inglaterra. Ele então começou a planejar o que até hoje é considerado um crime ‘quase’ perfeito.
Reynolds se reuniu com o amigo Ronald Biggs três anos depois e rapidamente montaram uma equipe com 15 homens de habilidades ‘únicas’ e mais dois informantes.
Com boas informações sobre o transporte, a noite do roubo foi escolhida. Era uma viagem na qual o trem levava 2,5 milhões de libras esterlinas em mais de cem sacos de dinheiro.
O bando havia se estabelecido em uma fazenda próxima ao local do roubo. Para fazer com que o trem parasse no local correto eles “hackearam” dois sinais com uma bateria portátil. No primeiro, mudaram para luz amarela – indicando para o trem diminuir a velocidade –, e noo segundo colocaram a luz vermelha, para que o trem parasse de vez.
O maquinista Jack Mills e seu ajudante desceram para ver o que estava acontecendo. Ambos foram rendidos e os assaltantes tomaram conta. No melhor estilo linha de produção, eles lotaram duas Land Rovers e um caminhão do exército roubado com sacos de dinheiro. E foram embora.
É aqui que tudo fica incrível.
Após o roubo, vários deles – ainda no esconderijo – jogaram Banco Imobiliário e deixaram impressões digitais por todo o tabuleiro e peças. Na verdade, a fazenda inteira estava cheia de evidências do crime. Eles, inclusive, pagaram uma grana alta para um homem fazer o serviço de limpeza após eles saírem. O que – obviamente – não foi feito.
O rapaz em questão só pegou a grana e vazou, deixando as pistas para a polícia prender o bando. Nem preciso dizer que esse nunca foi pego.
De qualquer modo, a maioria do bando foi presa rapidamente. Menos os líderes, Reynolds e Biggs.
O primeiro fez uma cirurgia plástica e ficou foragido por cinco anos no México e depois no Canadá.
Já Biggs, bem, esse fugiu das grades, veio para o Brasil e casou-se com uma dançarina chamada Raimunda de Castro. Desse casamento nasceu Michael Biggs, sim ele mesmo. O Mike da Turma do Balão Mágico.
Como existe uma lei no Brasil que diz que se um estrangeiro tem um filho com uma brasileira ele não pode ser extraditado, Ronald Biggs ficou no bem bom aqui até 2001 quando, voluntariamente, se entregou às autoridades britânicas.
Esse mês faz 50 anos do crime e Ronald Biggs ainda vive na Inglaterra, em liberdade, ganha após várias complicações de saúde.
Vale lembrar que só uma pequena parte do dinheiro foi recuperada pela polícia.
Depósito Knightsbridge, Julho de 1987, Londres
Valério Viccei – um dos maiores assaltantes/bandidos/terroristas que a Europa já viu – era aquele tipo de persona que a gente sempre viu nos filmes. Italiano, bonito, malandro, e com um histórico gigantesco de crimes cometidos Itália a fora. Viccei desembarcou em Londres em 1986.
Em pouco tempo, boêmio, charmoso e mal intencionado, começou um caso com a então esposa do diretor do Depósito de Seguros Knightsbridge. É o tipo de banco no qual você compra aquelas gavetinhas para guardar o que bem entender e esse era o maior da Inglaterra. Já dá pra imaginar mais ou menos a partir daí, né?
Ele e mais um comparsa foram até Knightsbridge dizendo que queriam alugar uma das gavetinhas e fazer um depósito. Eles colocaram placas nas portas dizendo que o local estaria fechado e, armados, renderam os funcionários. A estimativa é que ambos roubaram quase 170 milhões de dólares – em valores atuais.
Valério Viccei foi preso pouco tempo depois. Ele havia deixado uma digital no banco e foi facilmente encontrado pela polícia. Viccei, no entanto, fugiu para a América Latina – aparentemente somos o paraíso para esse tipo – mas foi preso quando foi até Londres para trazer sua Ferrari Testarossa. Ele ficou 5 anos preso na terra da rainha até ser deportado de volta para a Itália, onde também foi processado por seus outros crimes.
Como a justiça da Itália funciona mais ou menos como a nossa, no ano 2000 Valério Viccei já cumpria pena em regime semiaberto e, numa das suas saídas da prisão, morreu ao trocar tiros com a polícia italiana.
Durante o tempo que ficou preso, o italiano escreveu um livro que quase foi best-seller. Dizia-se que estava com um roteiro pronto sobre sua vida. Ele queria, inclusive, interpretar a si mesmo no vindouro filme. Malandro é pouco.
* * *
Poderia terminar esse texto com uma conclusão meio canalha “o crime não compensa”, ora, se não compensasse ninguém os cometia, certo? Ou poderia terminar no estilo He-Man ou Capitão Planeta, “Hoje amiguinhos, aprendemos que roubar bancos pode causar paternidade de criança com talento para fazer parte de grupo musical infantil.” Mas não farei nada disso.
Penso nos ‘finais’ dessas histórias. Os que foram pegos, presos ou mortos tiveram o fim que nós, de certa forma, conhecemos e esperamos. É o mais comum. Se for o crime perfeito – casos de Belfast e Fortaleza, por exemplo – penso na maldição e na paranóia que deve ser ter todo aquele dinheiro e não poder gastar. Passar o resto da vida olhando por cima dos ombros, só esperando o momento.
É meio assustador pensar que essas pessoas vivem assim.
O que, no fim das contas, me leva a pensar que talvez não compense mesmo.
Mecenas: Payday 2
Agora que você já conhece os maiores assaltos a banco da história, que tal você próprio vestir as máscaras e fazer parte de um?
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