Na última sexta, a polêmica em torno do novo Código Florestal ganhou ainda mais força com a quebra de protocolo protagonizada por Camila Pitanga. Em uma solenidade oficial, ela proferiu o emblemático “Veta, Dilma!“.

Vejam:

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Já foi falado aqui no PapodeHomem sobre o Código Florestal. Inclusive, isso ocorreu há mais de um ano.

O texto publicado por Arildo Dias enfocava a falta de informação existente naquele momento para se tomar a decisão de aprovar ou não o novo Código Florestal. O tempo passou, a Câmara dos Deputados discutiu, o Senado discutiu, os cientistas discutiram, os relatores trabalharam nos relatórios e a lei foi aprovada. A aprovação foi baseada nos aspectos científicos? Infelizmente não.

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Para você que caiu de paraquedas e nunca ouviu falar do Código Florestal [link para download do texto original, de 1965] , aqui vai uma explicação bem simples e direta: é uma lei antiga que determina restrições especiais ao uso da terra de toda e qualquer propriedade rural.

Entre esses usos especiais da terra temos duas principais categorias:

  • Área de preservação permanente que, segundo o Código Florestal, tem a função de “preservar os recursos hídricos, a paisagem, a estabilidade geológica, a biodiversidade, o fluxo gênico de fauna e flora, proteger o solo e assegurar o bem estar das populações humanas”.
  • Área de reserva legal, “necessária ao uso sustentável dos recursos naturais, à conservação de reabilitação dos processos ecológicos, à conservação da biodiversidade e ao abrigo de fauna e flora nativas”.

O Código Florestal é uma lei maravilhosa do ponto de vista ambiental, pois ao regular esses dois tipos de usos nas propriedades rurais, ele garante um mínimo de sustentabilidade na zona rural.

Restrições deste tipo não existem em nenhum outro país do mundo, o que coloca o Brasil como pioneiro e inovador na sustentabilidade de seus recursos naturais.

No entanto, o que ninguém fala ao se discutir o Código Florestal é que esta lei é praticamente impossível de ser aplicada e não somente pelo fato do homem ser uma criatura insaciável e que deseja ampliar suas formas de produzir riquezas para ter cada vez mais bens. Claro que esse é um dos problemas, mas este é inerente ao ser humano. O problema de se cumprir o Código Florestal tem um contexto histórico.

Licença para desmatar

Na década de 70 surgiram os incentivos fiscais para os setores florestal e agrícola. Em termos práticos, o governo deu dinheiro e isenções de imposto para as pessoas e empresas que convertessem áreas de floresta nativa (tidas até então como improdutivas) em áreas produtivas, sejam de culturas agrícolas como florestais (aliás, foi nessa época que houve uma explosão das áreas produtoras de madeira de Pinus e eucalipto e a proliferação das indústrias de papel e celulose). Este fator foi fundamental para o desenvolvimento do Brasil, mas dizimou grande parte da vegetação nativa, sobretudo na região sudeste.

Vale ressaltar que nessa época, o Código Florestal já existia, mas era muito menos restritivo que o atual e, por conta disso, a população tinha uma “licença para desmatar” em favor do desenvolvimento do país.

Novo Código Florestal
Ninguém lembra do Código Florestal, a não ser em catástrofes (Detalhe para o canto superior direito da foto, onde não há arvores e o solo está exposto)

A legislação foi ficando mais dura ao passar dos anos. Entre as mudanças, houve aumento das faixas de áreas de preservação permanente de 5 metros – oi? Preservação de encostas com 5 metros de vegetação nativa? – para 30 metros. No entanto, a fiscalização não cobrou as mudanças da lei. Assim, imperou a lei de Gérson e “todo mundo” (eu sei, é uma generalização absurda) fingiu que nada havia acontecido.

O governo federal, ao ser pressionado pelo restante do mundo a diminuir suas taxas de desmatamento e a possuir uma postura de cumprimento de sua legislação ambiental, baixou uma portaria estabelecendo um limite para a recuperação das áreas em desacordo com a legislação atual.

Caso a lei não fosse cumprida até determinado período, multas caíriam nas cabeças dos produtores assim como máscaras de oxigênio caem nas cabeças dos passageiros de avião. E esse prazo se esgota agora, este ano. (Vale lembrar que já foi prorrogado várias e várias vezes.)

Se furto não fosse crime, ladrões seriam gente “do bem”

Os políticos (que não são bobos) tiveram uma brilhante ideia para resolver o impasse: em vez de bolar um pacotão tecnológico para resolver o problema, montando esquemas logísticos, incentivos financeiros e isenção de impostos para estimular os produtores a recuperarem as suas áreas de acordo com a legislação, decidiram por um caminho muito mais simples e indolor: mudar a lei para adequar todos! Fazendo uma analogia bem tosca:

Se todas as pessoas do mundo tivessem cometido o crime de furto, em vez de condenar uma por uma, o governo decide bani o furto da lista de crimes do país.

Pronto, problema resolvido.

Portanto, o Brasil está no caminho de mudar a sua lei ambiental para se igualar (por baixo) aos demais países. Lembro-me de uma das aulas da faculdade onde um brilhante professor me abriu os olhos e disse uma vez:

“O crescimento econômico de um país sempre ocorre em detrimento de algum outro fator. Taxas absurdas de crescimento não surgem do vácuo.”

Ele está coberto de razão. A China só tem essas taxas de crescimento devido ao preço da mão-de-obra, que é explorada ao nível de semi-escravidão. O Brasil se desenvolve dessa forma devido à exploração de seus recursos naturais. Estamos perdendo a chance de ser exemplo de política ambiental para o resto do mundo, pois estamos nos igualando a eles.

Veta, Dilma!

Em termos de política externa, se a presidenta Dilma Rousseff não vetar este absurdo que é o novo Código Florestal [link para download do texto final, na íntegra], ela será motivo de chacota na próxima Conferência das Nações Unidas sobre o Desenvolvimento Sustentável (Rio+20), que será realizada no Brasil. Ninguém mais vai querer saber de Brasil ditando as regras ambientais do mundo.

E se o Brasil não pode mais ditar tais regras, quem vai? A Inglaterra, que não tem mais nada?

Seguimos nos comentários.

Danilo Scorzoni Ré

Engenheiro Florestal, amante da natureza e de ecoturismo. Apesar de ambientalista, não gosta de eco-chato e ainda acredita na capacidade do ser humano em promover um futuro melhor. É <a>@dscorzoni</a> no Twitter."

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