Desde criança sonhamos com super esportivos como Ferrari, Lamborghini e Bugatti. Mesmo em filmes eles são incomuns — talvez porque, quando aparecem, acabam roubando a cena. O efeito que daria se o James Bond dirigisse uma Ferrari seria como contracenar com a Angelina Jolie nua, assim, gratuitamente. “Dane-se Bond, quero ver mais da Ferrari, digo Angelina!”
Link YouTube | Ferrari, em filme do 007, só aparece como coadjuvante, fazendo ponta. Se não, nós perguntaremos: “Bond? Que james Bond?”
Lemos sobre esses carros em revistas especializadas, jogamos Super Trunfo de carros, babamos com as características de cada um deles e depois encontramos aqueles mesmos carros em videogames e tiramos uma casquinha virtual de como é dirigir uma super máquina de correr. Assim como sexo, nada virtual é melhor do que a experiência real. Dirigir vale mais que vê-los num salão de carros, que é melhor do que jogar no videogame, que é melhor do que ver na rua, que é melhor do que não fazer nada.
Mas quem dirige uma Ferrari? O padrão de uso desses carros no Brasil é muito peculiar. Geralmente é alguém endinheirado o bastante para colocar mais de R$ 1 milhão em um carro com uma capacidade de carga menor do que um Uno e consumo maior do que um Landau.
Mesmo assim, o felizardo não usa o carro sempre. Só lá nos finais de semana ele tira a fera da garagem, dá algumas voltas no bairro evitando ruas com asfalto ruim ou quebra molas e então volta para casa. Com um carro desses não dá para levar os filhos para tomar uma sorvete, pois só há espaço para um passageiro e o risco de bater ou ser assaltado é tão alto que inibe a vontade de usar. O dono repete a rotina por seis meses, roda cerca de 500 km, não faz manutenção alguma, e então troca de carro.
O importante não é ter o carro, é experimentar vários. Variar. Quem já trocou de carro consegue imaginar o custo de cada troca desse tipo. A brincadeira fica cara. É mais caro do que divórcio!
Dentro de uma Ferrari F 360
Entrar em uma Ferrari é uma experiência fascinante. O carro é mais baixo e a posição do motorista é mais horizontal. No espaço onde fica o câmbio na maior parte dos carros, a Ferrari tem apenas uma alavanca para selecionar a direção, para frente, para trás, neutro. A troca de marcha mesmo fica atrás do volante, no mesmo esquema da Fórmula 1. Aliás, o nome do câmbio é F1.
O acabamento é impecável, mas nada de luxo. Couro aqui e ali, velocidade, rotação, temperatura, etc. Um sistema de som completamente inútil. A perspectiva de ouvir mais uma vez Back in Black, do AC/DC, esvanece perto da possibilidade de escutar o ronco do motor colocado atrás de si.
Aliás, a relação do motor com uma Ferrari F360 é algo pornográfico. Quando ele ronca, você ronca junto na mesma frequência. As pessoas que estão próximas roncam também. E quem só vê na distância torce para que o trajeto do carro faça com que aquele ronco grave e alto passe perto do si.
Mantendo a figura de linguagem pornográfica: entrar no carro é como tirar a roupa da dama, e pisar no acelerador seriam as preliminares. Uma boa recomendação é não dirigir com o motor frio. Garanta que as preliminares durem por pelo menos alguns minutos. Tire o carro da garagem com cuidado. Neste momento, as pessoas que passam na rua começam a olhar para você e tirar fotos como se estivesse trepando com a Sasha Grey.
De certa forma está.
Mas o que importa de fato?
A F360 é um automóvel gonzo. O rugido da fera é acompanhado pela possibilidade de ver as suas entranhas, que são expostas tanto para quem está fora, quanto para quem está dentro do carro. A tampa do motor é de vidro e também dá para vê-lo através de uma pequena janela dentro da cabine.
Dane-se o resto do mundo. O motor é que conta. Todo mundo dança pela sua música, e o motorista está no controle da besta.
Você acelera em primeira. O carro arranca com velocidade. Dirige com calma, troca a marcha na borboleta atrás do volante. Percebe que esticou a primeira até 40 km/h e a segunda até 120 km/h em menos de 4 segundos. Diminui, tem um pardal mais adiante. Controla o desejo de testar a velocidade máxima. Dá mais uma arrancada até 120 km/h e depois freia. O carro quase para.
A suspensão é dura, parece que você está sobre uma cama de hospital ou um skate gigante. O volante é sensível. Você percebe que o mínimo movimento gera uma alteração na direção do carro.
Você sente o carro. Lambe o asfalto sem pressa. Não dirige rápido. Não mais. Aproveita o tempo e o espaço. Ultrapassa um ou dos carros. Emparelha com um Uno. Os ocupantes do carro encaram você. Duas crianças no banco de trás se colam no vidro do carro e dizem “uau”. Você dobra à direita e vai para o centro da cidade.
Link YouTube | Mais linda ainda só se rebolasse
É um dia bonito de verão, mas faz frio. Gramado tem dessas coisas. Você pega trânsito (ou “tranqueira”, como eles chamam) perto do centro de Gramado. A cidade está cheia devido às turísticas comemorações do Natal Luz. Todos param para ver o seu carro. Tiram fotos. Você esgota o arsenal de caretas. Acelera o carro e pega à direita na avenida principal, cheia de turistas.
Crianças de bicicleta pedalam mais rápido do que você e perguntam “É seu carro, tio? Fala a verdade. É seu mesmo?”. Nove entre dez turistas olham para você como se fosse Angelina Jolie nua desfilando pelo centro da cidade. O guri da bicicleta não desiste e exige uma resposta. “É seu mesmo, tio? Não pode ser.”
E você responde como que quebrando o encanto. “É do Supercarros.”
A casa dos Supercarros
A ideia é óbvia, como toda ideia realmente boa. Um lugar onde ficam expostos os carros mais incríveis e exclusivos do mundo. Superesportivos como Ferraris e Lamborghinis e clássicos como Cadillacs, Rolls-Royces e Lincolns. Os visitantes são guiados por pessoas que gostam de carros. São apaixonados por isso. Não precisa marcar visita guiada, é só entrar e alguém já vem falando sobre os carros expostos.
Você pode tirar fotos com os carros, comprar miniaturas e suvenires ou fazer o que eu fiz. Entrar em um supercarro e passear pela cidade. São dois circuitos disponíveis, um apenas na avenida entre Gramado e Canela e outro que inclui o centro de Gramado.
“Olha, o mais impressionante é que tem gente que chora ao dirigir um carro desses”, conta Gustavo, dono do lugar. “Na maior parte, os clientes são homens e vêm realizar sua fantasia. Mas mulheres também fazem test-drives”.
O test-drive de um supercarro não é barato. Custa entre R$ 430 e R$ 940 na Mulher, Cerveja & Futebol. Mesmo assim, representa um milésimo do valor de um carro desses. Por este ponto de vista é uma verdadeira pechincha. Este valor inclui também ingresso em outras três atrações em Gramado, além da garantia de que o carro que você deseja estará disponível no dia que você agendar com a equipe do salão.
Isso é importante porque o “estoque” do salão tem dono. Vários donos. Em geral, caras que antes mantinham esses carros na garagem para dirigir apeas 20km por semana, e agora tem a garantia que os mesmos estão sendo cuidados e venerados por visitantes de todo o Brasil. Com isso, eles transformaram um passivo em um ativo.
Eventualmente aparece alguém e tira um dos carros da exibição sem a companhia dos pilotos do Supercarros. É um dos donos. Por este motivo é importante agendar.
No momento, temos online três opções de carro em duas opções de percurso. O pacote mais exclusivo inclui dirigir uma Lamborghini Gallardo, o Rolls-Royce Corniche, o Lincoln Continental ou o Cadillac Eldorado. Os outros pacotes à venda incluem a Ferrari F360 Modena e o conversível F355 Spider.
É muita pornografia pra um texto só, né? Mas digamos que, em um mundo de sexualidade descarada, algumas obscenidades ainda surpreendem.
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