Pouco depois do apito final da partida entre Grécia e Costa do Marfim, Natasha Martory já batia ponto na esquina com meio-fio amarelo na praia de Iracema, bairro nobre de Fortaleza. Às 21h30 o movimento era fraco, mas constante – turistas estrangeiros e brasileiros não perdiam a oportunidade de puxar papo ou pedir uma foto com ela.
Aos 19 anos, a travesti faz programas há dois, mas é novata na zona de prostituição mais famosa da capital cearense. Saiu há dois meses da Barra do Ceará, região em que também mora, de olho nos ganhos que a Copa do Mundo de 2014 prometia. O preço saltou de R$ 80 para R$ 150 e a renda alcançou o recorde pessoal de R$ 1.300 em uma noite, mas não graças aos clientes estrangeiros. O fenômeno acontece sempre que uma garota muda de ponto. “Eu achava que ia ter muito, muito gringo e muito dinheiro. Tem muito gringo, não quantos eu esperava, mas quem sai mais com a gente são os brasileiros”, diz ao contar que recebeu o apelido Juliana Milhões das colegas.
Natasha tinha cabelo grande, mas agora usa peruca por que isso também significa mais dinheiro. Fez uma tatuagem na perna, botou silicone industrial no bumbum – “medo eu tive, mas é a dor da beleza” – e faz planos para continuar na profissão até que consiga comprar uma casa própria, um carro, montar um salão de beleza e colocar peito (a operação para colocar próteses médicas de silicone são seis vezes mais caras que o outro procedimento, e saem por R$ 6.500).
O dinheiro a excita o suficiente para manter uma ereção e cumprir o papel sexual que os clientes esperam, mas o brilho nos olhos de Natasha aparece mesmo é quando fala da namorada, de 14 anos. A relação começou por uma brincadeira, mas vai fazer um ano no próximo dia 28.
Ela sabe que eu me visto. Sabe que eu faço programa. Sai comigo de mulher. Mas quando você se apega, né? (…) Eu quero virar travesti [ainda se veste como menino de dia], mas eu quero ficar com ela, por que me sinto à vontade. O pior é que eu gosto da indivídua. Eu amo ela”.
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P.S.: Muito obrigado à Lígia Cristaldi por recomendar o ótimo guia sobre conceitos e termos das questões de identidade de gênero da Jaqueline Gomes de Jesus. Recomendo a leitura.
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Uma Copa do Mundo se faz com pessoas.
As que entram em campo, as que viajam para testemunhá-la, as que enchem as ruas, as que se voluntariam, as que torcem e as que veem no evento uma oportunidade para garantir seu sustento ou para extravasar.
A seção “Álbum de Figurinhas” pretende contar, com um microrrelato artesanal e um retrato por dia, a história de algumas dessas pessoas, muitas vezes invisíveis, que povoam os bastidores da Copa do Mundo do Brasil.
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