Seja um eletrônico ou uma comida, sempre há um produto mais caro. Uma versão parecida com as outras, mas que oferece funções melhores ou simplesmente é de um tamanho maior. Entenda por que quase nunca é um bom negócio comprá-las.

A TV mais cara da loja

Imagine que seu novo emprego depende de você ter em casa um picotador de papel automático, ou qualquer outro eletrônico que você nunca pensou em comprar, muito menos comparou preços. Pela primeira vez, você vai a um supermercado ou uma loja de eletrônicos (mesmo on-line) ver quais são os aparelhos disponíveis e, claro, comparar preços.

Agora imagine que você encontrou apenas uma loja nacional vendendo o picotador, que oferecesse dois modelos, o standart100, capaz de picotar 100 folhas por minuto, por R$ 300; e o smart250, capaz de picotar 250 folhas por minuto, custando R$ 500. Você não precisa picotar 250 folhas por minuto, logo o modelo standart100 é uma compra razoável. Muita gente sairia mais satisfeito com o aparelho de R$300 sabendo que o mais caro custa R$ 500. É justamente este o papel do produto mais caro.

Por isso qualquer vitrine tem sempre um produto muito mais caro do que os outros da mesma categoria. Entre TVs de 40’’ por R$ 1200, uma de 46’’ por R$ 1500 e outra com 50’’ de R$ 2100, é muito mais provável que as pessoas só comprem a mais cara se virem uma quarta, de 60’’, por R$ 5000. Afinal, não estão levando a mais barata, mas ela ainda está longe de ser a mais cara. O papel da TV de R$ 5000 é convencer você de que as outras estão mais baratas, estabelecer o chamado preço âncora, um preço com o qual os outros produtos serão comparados.

Quando oferecidas para cobrar ou pagar um valor por um produto ou serviço, o primeiro impulso de quase todas as pessoas é tentar saber quanto outros cobram ou pagam por aquilo, e usar esta comparação como âncora para seu valor. Nós somos animais comparadores por natureza. Vivemos há milhões de anos em sociedades com vários indivíduos, onde estamos sempre comparando e olhando ao nosso redor para saber nossa posição em relação ao grupo. Um aumento de R$ 2000 para um funcionário seria uma ótima notícia, mas se tornaria um ultraje se ele descobrisse que todos outros receberam R$ 10000 de aumento.

Assim surgem os produtos mais caros em uma loja. A tendência é que sejam muito mais caros do que os outros, e não sejam muito vendidos. O papel deles não é esse. O papel deles é garantir que o segundo mais caro se torne uma opção mais procurada. Para aumentar o interesse por uma opção, basta oferecer outra parecida que não seja tão boa. Dan Ariely fala bastante sobre isso neste ótimo vídeo do TED aos 12 minutos (legendas em português em subtitles):

Link TED |

A pipoca grande

Já na lanchonete, ou mesmo no setor de comida do supermercado, raramente um produto mais caro é muito mais caro. Geralmente, quando se divide o preço pelo tamanho da porção, o preço é melhor. Um refrigerante de 300ml custa R$ 4,20, enquanto o de 500ml custa R$ 4,50, com quase o dobro do volume. Mas aqui a opção mais cara não serve de âncora. O papel dela é ser comprada, e o motivo para isso é tão arraigado em nossos instintos quanto a comparação. Obra do senhor David Wallerstein.

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David Wallerstein foi contratado por uma cadeia de cinemas americana da década de 1950 para aumentar a renda deste comércio. Renda essa que vinha principalmente da venda de bebidas e pipocas. Wallerstein percebeu que, por mais que se esforçasse, não conseguiria fazer cada espectador comprar mais de um refrigerante e uma pipoca. As pessoas não saem no meio do filme para comprar outra pipoca, não só pelo filme, mas por se sentirem gulosas ao comprar mais uma porção. Daí surgiu a ideia de oferecer uma porção com o dobro do tamanho.

Com o tamanho grande e o extra-grande, as pessoas comem o mesmo que comeriam comprando duas unidades, mas não se dão conta disso. Este é outro instinto nosso, tendemos a comer tudo o que pegamos, sem repararmos no tamanho da porção. Um experimento de 2005 mostrou isso ao oferecer para as pessoas sopa em um recipiente que se enchia automaticamente por baixo sem que elas percebessem. O autor acabou ganhando um IgNobel por isso. Como resultado, quem tomou a sopa da tigela sem fundo consumiu em média 60% mais do que quem tinha uma tigela normal. Pelo mesmo motivo, restaurantes de comida por quilo usam pratos enormes: tendemos a enchê-los com mais comida do que pratos normais.

O próximo passo de David Wallerstein foi oferecer seus serviços ao McDonald’s, onde criou as porções maiores e os tamanhos gigantes que vemos hoje:

“Fritas grandes por mais 50 centavos, senhor?”

Em alguns estados americanos, ainda vendem refrigerantes do tamanho supersize, com mais de 1,2 litro. Será que alguém voltaria para comprar um copo de 300ml quatro vezes?

É este aumento do tamanho das porções em lanchonetes ou no mercado que tem contribuído para o aumento de peso da população mundial. Com uma garrafa de 2,5 ou 3 litros na mesa do almoço, ninguém vai ficar sem refrigerante mesmo enchendo o copo novamente. Michael Pollan trata de como o milho faz parte de tudo na dieta americana atualmente, e como a indústria alimentícia está mudando por conta disso, em outra ótima palestra do TED:

Link TED |

Seja para proteger o seu bolso ou sua saúde, esqueça o tamanho grande. Você não precisa dele e não vai levar vantagem nenhuma em consumi-lo.

Para saber mais

Dan Ariely fala de uma série de comportamentos que não nos damos conta no Previsivelmente Irracional, onde explica em mais detalhes o conceito de preço âncora. Michael Pollan fala sobre a indústria alimentícia, como aumentam os tamanhos e processam cada vez mais a comida, e como isto tem prejudicado nossa saúde no Dilema do Onívoro.

Atila Iamarino

Doutorando pela USP, biólogo viciado em informação e ciência. Autor do excelente blog <a>Rainha Vermelha</a> e editor do <a href="http://scienceblogs.com.br/">Science Blogs Brasil</a>