Quando comprei minha primeira moto aos 18 anos pensei, “Pronto agora tenho asas…”.
Pegar ônibus fedido e lotado ou então chegar todo suado no trabalho por ir de bike, nunca mais.
Depois de um ano de felicidade e peripécias (leia-se alta velocidade aliada aos corredores de carros que se formam) veio meu primeiro tombo. Tombo que me custou 11 dias internado e mais dois meses de molho em casa.
Mas vamos aos fatos, um belo dia, após o almoço, transitava em um corredor formado pelos carros, quando o semáforo abriu e continuei no meu corredor até que, por desventura do destino, ele se afunilou.
Uma caminhonete mais larga que os carros apareceu “do nada”, a pancada foi tamanha que minha irmã (esqueci de falar que levava minha irmã na garupa) voou uns 10 metros, e saiu dessa sem um mísero arranhão, e eu fiquei colado na lateral da caminhonete junto com minha moto, meu corpo doía por inteiro e foi assim que dei meu primeiro rolê no Resgate dos Bombeiros.
Chegando ao hospital recebi a notícia que tinha quebrado o fêmur e que teria que operar. Mas para isso teria que esperar a diminuição do inchaço da perna e que a prótese (não, não perdi a perna, é só uma haste de titânio que vai dentro do osso para possibilitar que ele se cole novamente – me senti o Wolverine) chegasse da Itália, para minha operação.
Fiquei preso em uma cama, com a perna esticada por uma corda para mantê-la o mais imóvel possível. E assim aquele quarto de hospital, mais precisamente a cama, pois estava amarrado a ela, tornou-se o meu cárcere.
E foi nesse momento que repensei a minha vida, e o pior ainda estava por vir… aprendi a abdicar de meu amor próprio ao tomar banho de paninho e canequinha e com ajuda das enfermeiras bondosas.
A fazer xixi no papagaio. Imagine-se tendo que urinar deitado dentro de uma espécie de garrafa de boca grande, feita de aço inox, e na hora que você vai fazer aquele xixizinho pra dormir, tem que pedir ajuda de alguém para me trazer esse aparelho de tortura.
Mas o mais degradante de tudo foi fazer o número 2, já tenho dificuldades se tiver que fazer fora de meu trono, pior ainda fazer isso em um ambiente hostil e ainda por cima deitado. Deitado mesmo, pois sentado doía demais minha perna.
Bem, não consegui na Segunda-feira em que sofri o acidente, nem na Terça, mas na Quarta fui avisado pelo meu médico que para fazer a cirurgia teria que tomar uma anestesia que amortece da cintura pra baixo, e, conseqüentemente, iria acabar fazendo – no sentido literal da palavra – uma cagada na mesa de cirurgia.
Na Quinta-feira me sentia como se tivesse uma bomba atômica na barriga. Já decidido a usar a comadre(uma espécie de pinico chato) pra não fazer feio na mesa de cirurgia, chamei a enfermeira, e pra minha sorte era uma senhorinha com cara de vovó, aí já fiquei tranqüilo pois pelo jeito os bons ventos estavam do meu lado.
A comadre foi acoplada delicadamente pela enfermeira-vovó em minha bunda e ela me deixou só para me concentrar e trabalhar. Depois de muita força e suor, uma hora depois, sentia que a comadre quase fazia parte de meu corpo, o cheiro no quarto estava insuportável, e era hora de chamar a enfermeira para ajudar-me nos próximos tramites de limpeza.
Mas como toda desgraça é pouca, na hora que aperto a campainha para chamar a enfermeira-vovó, eis que surge a enfermeira mais gata de todas que haviam no hospital!!! Ela nem perguntou o que eu desejava, já pediu para abrir a janela… e eu se pudesse teria saído correndo de tanta vergonha, como não tinha jeito resolvi agir com bom humor, mas a Miss-Enfermaria estava sem jeito e resolveu fazer um comentário:
– Nossa você estava apertado mesmo… encheu a comadre…
– (risada amarela) Pois é…
– Agora dá uma viradinha pra eu te limpar.
– Não! Pode deixar que do um jeito (aí já era humilhação demais!)
– Tá bom…
Na hora em que fui passar o papel higiênico, consegui melar até as costas de mão de merda… aí eu desisti… perdi o orgulho e pedi pra ela me limpar, e ela o fez com muito cuidado, passou até lencinho umedecido.
É meu caro, a vida é foda, mas é divertida também, o que aprendi com tudo isso?
“Por mais orgulhoso que você seja, um dia precisará de uma mão amiga…”
Tomara que essa mão seja delicada também. Na próxima eu conto o resto de minha estadia no hospital…
Tiago Cordeiro, 25 anos, paulista, adora motos, cursa o 3º Ano em História, na Universidade Estadual de Londrina, e quer ser professor, porque acredita que assim pode fazer a sua parte.
Tiago é leitor da Papo de Homem, nos pediu para colaborar e enviou essa bela história real do mais puro aprendizado. ;D
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