*notinha do editor: In vito veritas – “No vinho está a verdade”
Sean Penn dirigiu um filme chamado Into the Wild. Nele, o protagonista vai a pé até o Alaska, tornando-se mais forte à medida que se submete à condições que o exigem lançar mão de porções selvagens de sua personalidade. Acredite ou não, esse é exatamente o mesmo argumento de Kung Fu Panda:
“A força está dentro de ti. Conhece-te e saberás onde encontra-la”
Considero isolar-se em si próprio uma eficiente forma de se conhecer. Ao restringir sua interação social, sobra mais foco para a auto-análise. Práticas como essa são importantes quando nos damos conta de que vemos as coisas como nós somos e não como elas realmente são. Por isso, esse hiato de 5 meses sem escrever pro PdH.
Por duas vezes estive na Índia nos últimos 12 meses. Grandes oportunidades de aprendizado com um povo que é genialmente simples. Conforme o contexto, um sorriso gentil pode ensinar mais do que anos de análise ou qualquer outra forma de fuga da espiritualidade que nós ocidentais arrumamos nos últimos séculos em detrimento de valores cada vez mais capitalistas e egocentrados.
Esse aprendizado proporcionou a coragem de procurar minhas próprias verdades. Mais preocupado em achá-las do que julgá-las, a busca por mim mesmo desencadeou um processo tal qual como o de Lord Shiva: destruir todas as (pseudo)certezas e a (ego)imagem até não ter mais ao que apegar-se. A única forma de libertação. Somente sem nenhum filtro da realidade conseguiria ter a clareza da missão.
O álcool é uma droga regulamentada e, por isso, seu acesso é muito mais fácil do que outras distribuídas via contravenção. Sua larga aceitação social faz com que seu consumo esteja inserido na rotina da maioria das civilizações desde sempre. Mas como qualquer substância toxica, também tem seus reflexos negativos.
A necessidade de desestabilizar o pleno domínio das faculdades mentais e motoras é quase intrínseca à condição humana. Isso leva o álcool para um lugar familiar no horizonte cotidiano de nossas vidas. Um lugar que de tão visível caiu na invisibilidade dos reflexos condicionados, de não-questionamento.
Socialmente o álcool é uma das drogas mais perigosas que existem. Uma dose a mais é o suficiente para que vidas estejam fatalmente em jogo em um intervalo curtíssimo de tempo. Ciente da gravidade do problema, direcionei minha vida a ajudar pessoas a refletirem sobre sua relação com o álcool. Tornar o hábito de beber tão nobre e especial como admirar uma obra de Da Vinci ou ler Hemingway é uma forma de agregar consciência a seus atos.
Cocktails são uma forma criativa de consumir álcool. Falar sobre essa arte durante os 2 anos que estive aqui com vocês foi o caminho que encontrei de despertar um sentimento contemplativo em relação ao ato de beber, ainda que contextualizado através de receitas, histórias e reflexões. A tudo isso, some-se a discussão e a construção comunitária de conhecimento contidos nos milhares de comentários registrados nos posts.
Link YouTube | Some também alguns “sensacional”, ainda com o logotipo antigo do PdH
Recentemente passei 50 dias chefiando o balcão do SubAstor, templo speakeasy da coquetelaria na Vila Madalena. Durante esse tempo, percebi que minha missão não era fazer “bons drink” para os clientes da casa. Conversar com algumas centenas de pessoas durante toda semana ainda não proporcionava o sentimento de missão cumprida. Esse tempo ajudou a enxergar que meu barato é incitar o diálogo massificado através de um contexto alcoólico. E não fazer 300 cocktails numa única noite.
No meu caso, a unanimidade de meus atos executando as mesmas receitas, movimentos, todas as noites, contribuiu para que eu me flagrasse indo roboticamente pelo caminho da venda qualificada e do atendimento de excelência. Obter sucesso nessa empreitada é um belo desafio, desde que esse seja seu foco, a sua verdade. Definitivamente não era a minha.
A fine-art de beber é relativamente nova. Seus pouco menos de dois séculos ainda não deram conta de preencher todo o universo disponível. Se falarmos de Brasil então, estamos engatinhando. Temos uma quase inigualável diversidade de aromas e sabores à disposição. Isso representa um novo mundo a ser descoberto e aperfeiçoado por meio da técnica da coquetelaria e da gastronomia.
Isso também representa a possibilidade de incrementar hábitos no consumo de novos conteúdos. E foi ela que me permitiu enxergar uma oportunidade de exercitar a criatividade e a inovação de linguagens tendo a mixologia como matéria-prima para essa nova forma de arte. Ou ao menos documentá-la. Assim encerro meu ciclo no Papo de Homem: amadurecido e convicto da contribuição que posso dar na caminhada rumo a um mundo um tantinho melhor. Com nossas amizades ainda mais fortalecidas.
Selamos essa página do livro de nossas vidas, com um jantar regado a muito vinho. O vinho entra, a verdade sai. Com a ombridade e a retidão de nossos caráteres, a verdade é sempre presente. Sabotá-la, é sempre jogar contra nós mesmos! Doa o quanto doer, encare sua verdade de peito aberto. Essa atitude define a diferença entre passar pela vida e deixar sua marca nela!
Obrigado por terem me tornado quem sou hoje. Espero poder ter contribuído de alguma forma com a vida de vocês, assim como vocês contribuíram com a minha! Em breve lançarei meu novo site e tenham certeza de que vocês o conhecerão via Papo de Homem.
Porque amigos nunca se separam, apenas seguem rumos diferentes.
Mecenas: Concha y Toro Embaixada Trio
A Concha y Toro veio no QG do PapodeHomem e, em nome do seu embaixador, fez um jantar delicioso regado a vinho pra nós que marcou um novo rumo ao Dr.Drinks.
Veja mais fotos do jantar e conheça a Embaixada Trio na Fanpage deles.
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