A Folha de São Paulo publicou na última semana uma matéria evidenciando que os homens héteros brancos têm se tornado os maiores alvos das piadas nos shows de stand up no Brasil, e mostrou que os mesmos não aceitam bem brincadeiras. 
 

Yuri Marçal , um dos maiores expoentes desta nova geração de comediantes brasileiros. 
Imagens das redes sociais do Humorista.

O humor sempre carregou o poder de levantar críticas e de trazer reflexões, por mais que tantas vezes ele se apresente de uma maneira mais simples, como em um besteirol por exemplo, despido de um olhar mais profundo.

Nos últimos anos, com o avanço das redes sociais, os comediantes passaram a encontrar neste meio das mídias um espaço para se colocarem e mostrarem sua arte para muito mais pessoas.

E assim surgiu uma leva de comediantes que traz um tempero mais crítico para suas narrativas, que fala de questões identitárias e sociais através do humor.

Comediantes como Yuri Marçal, utilizam o palco como canal para levantar a bandeira da cultura africana, denunciar o racismo em diversas situações no nosso cotidiano, entre outras coisas.

Semelhante a essa proposta, Bruna Louise sobe ao palco com piadas feministas que caçoam das atitudes de homens que costumavam estar em situação de superioridades, os homem héteros que se creem muito machos, conquistadores, ou como diz a gíria, os “héteros tops.’’
 

Bruna Louise (no centro da foto ) – em uma de suas apresentações em São Paulo


Muitos conteúdos de comédia refletem alguns padrões comportamentais da nossa sociedade e que estão em declínio, colocando em cheque as questões do comportamento masculino, por exemplo, e questões raciais e sociais também. A comédia tem sido um instrumento muito importante para o convite à reflexão, para chamar atenção sobre a forma como lidamos com diversas questões do nosso cotidiano.

Esse recorte de artistas de uma nova geração de stand up, trazem consigo premissas bem distintas das que eram maioria nas últimas décadas. Se antes o humor era muito pautado em piadas de estereótipos a grupos minorizados, hoje vemos que, apesar de muitos ainda insistirem nessa forma de ‘fazer rir as custas dos outros’, outra produções nascem carregando críticas e troças as estruturas da nossa sociedade que garantem privilégios para poucos. 

A insatisfação de muitas pessoas com comportamentos machistas, racistas e homofóbicos, deu margem para esses novos humoristas criarem narrativas calcadas no mundo real,  e que funcionam como uma resposta desses grupos minorizados.

Quando os comportamentos machistas, racistas e homofóbicos são colocados em cheque, entra, como alvo das piadas, o sujeito genérico que os comete: o homem hétero branco, para a dizer uma forma geral e resumida. 

Muitos destes homens brancos e héteros, que desde de nossa sociedade ocupam um lugar de poder, que estão no ‘topo da pirâmide’, demonstram insatisfação de verem seu lugar sociedade ser levemente abalado. Se nota um incômodo com o `’desprestígio”, com o ‘’ ser questionado’’.

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Claro, é preciso pensar sobre a linha fina que separa o humor com potencial para reflexão, do humor como humilhação que troca o alvo mas repete uma estrutura desrespeitosa. Até que ponto essas piadas podem ir e realmente contribuir para uma reflexão sobre o assunto?

Existe uma linha tênue para conseguirmos identificar até onde a brincadeira é saudável.  É preciso avaliar a estrutura e entender os lugares de poder. Se a piada foca em comportamentos machistas, racistas e homofóbicos, não é o caso de levar pro pessoal. O problema apontado, o motivo do riso não está em ser um homem branco hétero, e sim em reproduzir esses erros comuns.

Além disso, mesmo quando há generalizações direcionadas para todo o grupo, é preciso olhar para os lugares de poder: os homens branco héteros, mesmo quando são alvo de piada não correm o risco de “apanhar na rua” ou de “serem presos” só por serem homens brancos héteros, como aconteceu durante décadas e séculos com a população LGBTQIAP+; não se corre o risco de perder uma vaga de emprego ou de levar um tiro da polícia por ser branco, como acontecem com os homens negros. 

Como os homens brancos héteros estão num lugar de direitos garantidos e de uma parcela importante de poder, a comédia pode até incomodar, mas não desencadeia consequências desastrosas.

Receber puxões de orelha em forma de piada pode ser uma boa forma de quebrar barreiras, de abrir diálogos, de repensar suas atitudes sem que alguém precise ter uma conversa “séria“ e sisuda com você.

Se permita ouvir, tentar entender o que está sendo dito por trás da piada, sem um olhar simplista, mas entendendo o contexto. Precisamos estar aberto a criticas, porque elas podem ser muito construtivas.

A comédia pode ser uma maneira mais leve de você conseguir refletir e absorver mudanças que talvez sejam importantes. A capacidade de rir de si mesmo permite que as pessoas enxerguem os próprios erros e os aceitem com bom humor.

Acolher suas falhas  e ter compaixão com você mesmo  é um ato de inteligência emocional e que contribui para o crescimento de quem decide aceitá-la dessa forma. A comédia é uma grande aliada no avanço das discussões que precisamos ter na nossa sociedade, e rir de si mesmo é uma forma de se rever e criar uma consciência crítica.

Breno Teófilo

Estágiário de produção de conteúdo no papo de homem Apresentador do Canal Reflexo @canalreflexo ( https://www.youtube.com/c/CanalReflexoOficial )