Depois de trabalho, trânsito, chuva, mais chuva, falta de luz no escritório e prazos nada amigáveis, resolvi que era hora de parar o mundo e observar as pequenas coisas que nosso sempre inflado ego não nos deixa enxergar.
Foi aí que percebi o quanto um simples drink feito com três ingredientes pode melhorar nossa percepção da vida.
Veja o drink que preparei para deixar minha vida um tantinho melhor após um dia apocalíptico e depois leia meus comentários.
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O elixir do guerreiro
O Daikiri (ou Daiquiri) tem sua origem em Cuba, porém sua história é controversa.
No início do século XX (1905), havia uma mina de ferro próxima a Santiago de Cuba – cujo nome era Daikiri – onde trabalhava um engenheiro metido a bartender chamado Jennings Cox. Reza a lenda que uma noite estavam todos no bar Vênus de Santiago e acabou o gin, então Cox resolveu inventar alguma coisa com rum branco pra entreter os convidados.
Também existe uma outra versão pra história, muito mais nobre, que diz que o drink foi criado por Constantino Ribalaigua no restaurante La Floridita, inspirado nos soldados cubanos que lutavam contra os colonizadores espanhóis no final do século XIX e carregavam uma espécie de odre com uma mistura de rum branco e suco de limão que chamavam de “elixir do guerreiro”. Após a luta contra os espanhóis foi a vez dos americanos invadirem Cuba pela Praia de Daikiri. Sacou a origem do nome?
Receita do Dr. Drinks para um bom Daikiri
Este drink é muito simples de ser feito, como todos os grandes clássicos o são. E nem por isso deixa de ser sensual, como até o ar que se respira em Cuba.
Você vai precisar de:
• Uma taça de Martini gelada
• Suco de limão
• Rum branco
• Simple syrup (xarope simples de açúcar que ensinei no último post)
• Gelo
Adicione gelo à coqueteleira, 2 doses de rum, suco de meio limão e meia dose de simple syrup. Bate até gelar a parede da coqueteleira e sirva o drink coado sem gelo algum na taça de Martini previamente gelada.
O daikiri é um dos drinks favoritos de Ernest Hemingway (que o pedia sempre duplo quando ia ao Floridita) e de sua grande amiga, Lilian Hellman. Lilian morava em New York e era casada com Dashiell Hammet, que estava em Los Angeles quando ela tomou um porre de conhaque na noite da estreia de sua peça The Children’s Hour na Broadway (NY).
Reza a lenda que Lilian acordou numa tremenda ressaca na manhã seguinte e ligou para o marido, porém sua “secretária” atendeu o telefone. Lembrando que o marido não tinha secretária e que na hora que ligou eram três da manhã na Califórnia, a escritora pegou o primeiro voo para Los Angeles, se embriagou com tudo que pode no caminho e, chegando no apartamento do marido, se preocupou unicamente em destruir todo seu bar. Depois pegou calmamente um avião de volta.
Sobre como tornar nossa vida melhor
Já falamos sobre os aspectos sociais de beber vendo a bebida como uma forma de nos conectar ao outro. Mas você já parou pra pensar que ela pode ajudar a nos conectarmos a nós mesmos?
No dia que fiz esse vídeo, parecia que o universo inteiro conspirava para que tudo desse errado. Todos nós temos dias assim. Aqueles quando, ao chegar em casa, temos a certeza de que nunca deveríamos ter saído, de que era melhor ter dormido o dia todo.
Nada melhor para aliviar o trauma causado por um dia ruim do que um drink relaxante. Ok, muitos de vocês vão dizer quer o melhor é ir pro bar beber cerveja. Concordo, pode ser também, não tenho nada contra cerveja. Mas tenho contra o excesso de extroversão que nos cega para algo que sempre deveria estar em nosso campo visual: nós mesmos.
A cerveja é uma bebida que implica no consumo coletivo. Por ser mais fraca que os destilados, para atingir o mesmo grau de concentração alcoólica no sangue que dois ou três Daikiris, precisa-se de mais tempo de consumo. E ficar por horas a fio num bar bebendo cerveja sozinho é, no mínimo, preocupante do ponto de vista social.
O momento coletivo faz com que não paremos para entrar em contato com nós mesmos. Aqueles minutos que precisamos de introspecção para refletir sobre a real necessidade de toda tensão e estresse que nos proporcionamos desnecessariamente e nem percebemos. Estamos sempre tão preocupados com o mundo ao nosso redor que esquecemos de ter dois dedos de prosa com nossa consciência e, por isso, muitas vezes esquecemos do que e de quem somos.
Parar o mundo
A partir do momento que nos analisamos friamente, temos a chance de diminuir a importância de nossas emoções e, assim, mudar nossa leitura sobre a realidade. Muito da forma como enxergamos a vida é fruto do conjunto de crenças e costumes que foi plantado por nosso meio em nosso inconsciente. Ou seja, se conseguirmos, mesmo que por apenas um instante, filtrar nossos sentimentos sobre nossa visão de mundo, existem grandes chances de surgirem novas percepções.
Então percebemos que, por exemplo, uma hora no trânsito só nos incomoda porque não temos uma atitude firme diante da vida a ponto de mudar nossos hábitos ou de juntar tudo e começar uma nova vida numa cidade mais pacata.
São reflexões como essas que nos remetem aos primórdios do uso das bebidas alcoólicas: acessar uma visão superior para encontrar alguma entidade que não se manifesta de forma corriqueira, mas por um momento único, um ritual. Só que nesse caso essa entidade é você mesmo. O âmago do seu ser.
É duro se olhar no espelho com sinceridade e não gostar do que se vê. Ao mesmo tempo é necessário, pois é só conhecendo nossas falhas, sejam elas de caráter ou de conduta, que temos condições de melhorar o que precisa ser melhorado e assim, aos poucos, nos tornarmos pessoas mais evoluídas.
Engolindo os problemas
Você já parou pra questionar sobre porque uma quantidade enorme de pessoas que conhecemos fazem análise? O que elas buscam com isso?
Também fiz análise durante muito tempo e a conclusão a que cheguei é que o psicanalista é um profissional treinado para me proporcionar uma auto-reflexão e, dessa forma, fazer com que eu consiga encarar meus problemas de frente. Todos aqueles problemas que fingimos que não vemos e inconscientemente queremos afundar dentro de nós mesmos usando vícios ou qualquer forma de entretenimento, distração.
A adicção nada mais é do que uma forma inconsciente e um reflexo físico de manter dentro de nós tudo aquilo que não temos coragem de externar, tudo aquilo que não conseguimos encarar como um problema a ser resolvido. Quando bebemos além da conta, isso sai pra fora facinho, facinho. Ou alguém tem uma explicação melhor para justificar a atitude das pessoas que bebem e ligam pra ex-namorada(o)s?
Tornar seu dia mais nobre
Você já experimentou, em vez de sentar num bar rodeado de amigos pra tomar cerveja e literalmente jogar conversa fora, ir para casa preparar um drink e refletir sobre você? Perceba que pode começar essa reflexão de forma elevada, o que torna mais suave o confronto com seu ego.
Se você sabe preparar um bom drink e conhece sua história, já começa se sentindo conectado aos piratas ingleses do século XIX ou até mesmo aos frequentadores dos saloons do velho oeste. Suas histórias, preocupações e desafios cotidianos não mais existem, assim como as preocupações que fisgam você atualmente perderão todo o peso daqui a alguns meses ou anos. Eles nasceram, viveram, fizeram algumas coisas, beberam e morreram, assim como você morrerá em breve.
Fazer isso é também uma forma de voltar aos antigos rituais e usar a bebida como forma de proporcionar uma nova consciência em relação à vida e ao mundo.
Para tomar o elixir do guerreiro, não basta beber um Daiquiri.
Uma pergunta…
Agora que vimos a bebida como uma forma de nos levar à introspecção, a novas leituras da realidade, podemos fazer um questionamento que demonstrará claramente se nossa relação com a bebida é algo sadio e inteligente ou simplesmente automatizado, mecânico, excessivo.
O que você já aprendeu sobre você mesmo enquanto bebia?
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