É a pergunta do título que eu te faço. Você fala assim, de sopetão? “Eu te amo”, pra todo mundo que quer? Fácil? Sem sentir o peso de uma declaração dessas? Sem passar pela dificuldade em realmente olhar alguém nos olhos e conseguir verbalizar isso?
Não sei vocês, mas eu, infelizmente não. As vezes sinto que é muito difícil. As vezes, que é desnecessário, mas na maioria, me convenço que é desnecessário justamente por ser difícil, eu acho.
O que compensa é que o “eu te amo” está implícito em vários momentos, recheando vários silêncios e dispensando a necessidade de, de fato, ser verbalizado (e ausente em diversos momentos em que, de fato, está sendo verbalizado do tipo te amo pra sempre for4ver S2, mas não vem ao caso aqui) e eu só estou falando tamanha obviedade porque, por mais evidente que ela seja, perceber esses momentos, olhar, dar e receber esse amor puro e silencioso, é tão, ou mais, difícil quanto verbalizá-lo.
Na minha família, no lado italiano dela ao menos, o amor é medido pelo tamanho do prato e pelas vezes que você repete a mesma refeição dizendo “nossa, está muito bom”, “que delícia essa lasanha”, e variações do elogio aos comes e bebes. É como se o coração abdicasse do seu posto de órgão do amor e deixasse o estômago tomar conta do pedaço. Um acordo tácito entre os dois órgãos e um entre nós, que preferimos fazer esse tipo de linguagem pra dizer “eu te amo”, tangenciando uma rota que pode esbarrar numa derrapada ocasional: a vulnerabilidade. Escolhendo um caminho seguro, por já termos percorrido tantas vezes.
No livraço, “Sobre A Beleza”, da Zadie Smith, ela fala bastante sobre isso. As demonstrações de afeto e suas dificuldades na vida familiar. Aqui um trecho que eu gosto muito:
“Harry só queria que Howard sentasse e começasse de novo. Havia mais quatro horas de programação de qualidade enfileirada antes da hora de dormir – programas de antiguidades, programas de propriedades, programas de viagem e programas de competição – todos poderiam ser assistidos por ele e o filho juntos num silencioso companheirismo, com comentários ocasionais acerca da mordida profunda desse apresentador, das mãos pequenas ou da preferência sexual de outro. E tudo isso seria outra forma de dizer: É bom ver você. Fazia muito tempo. Somos uma família. Mas Howard não conseguia fazer isso quando tinha dezesseis anos e não conseguiria fazer agora. Simplesmente não acreditava, como seu pai, que o tempo é o modo como se aplica o amor.”
Massa, né?
O curta de hoje vem nessa toada. A Navalha do Avô, dirigido por Pedro Jorge, é muito bonito, e encontra a beleza escondidas nas relações de afeto nunca faladas, mas sempre sentidas. Nas nossas brechas afetivas, recheadas de silêncio. Especialmente entre os homens, onde ele, o silêncio, parece ser a maneira mais comum de dizer “eu te amo”.
Sem mais delongas, o filme:
A Navalha do Avô (2013) from Pedro Jorge – "Cabron" on Vimeo.
E já começo perguntando nos comentários se vocês, amigos leitores, sentem o mesmo. Como você demonstra o seu amor? Como o sente?
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