Talvez se você demitir cem pessoas, eventualmente se acostume. Mas eu duvido. Despedir pessoas é horrível. Nada me estressou tanto nos últimos doze anos de direção do Basecamp.

É claro, por pior que seja demitir alguém, ser demitido é mil vezes pior. Eu só fui despedido de verdade uma vez na minha vida, mas a experiência me marcou da mesma maneira.

Vinte anos depois, me lembro de quase tudo — o número de degraus na entrada, a mesa bagunçada, a xícara de café meio cheia. De maneira ainda mais forte, lembro de sentir um grande leque de emoções: surpresa, raiva, desapontamento, tristeza. O ápice da humilhação ao ter que voltar ao escritório porque tinha esquecido meu passe de ônibus e não conseguiria voltar para casa sem ele.

Não é forçar a barra dizer que a experiência ajudou a moldar meu desejo de ter um negócio próprio. De ter parceiros, mas não chefes. Tudo isso somente porque fui demitido de um trabalho manual, numa idade relativamente nova, sem quaisquer consequências práticas em minha vida (além da angústia emocional!).

Eu até posso ir além daquele dia horroroso e imaginar como deve ser perder o emprego de toda sua carreira, com contas reais para pagar e talvez uma família para alimentar, mas é só isso: uma imagem mental.

Mas é exatamente essa imagem mental que faz com que a ideia de demitir alguém seja tão assustadora. Dizer a um funcionário que seu tempo na empresa acabou é o poder máximo do chefe. Não deve ser usado levianamente. Não será sentido dessa maneira.

E mesmo assim, às vezes demitir um funcionário é algo que precisa ser feito. Há uma série de boas razões para essa pessoa nesse trabalho em sua companhia não estar funcionando.

Não há como saber como a mesma pessoa vai agir numa empresa diferente ou num emprego diferente. Excelência é algo extremamente situacional. Você pode ser péssimo num ambiente e um gênio em outro. É muito importante que ambas as partes se lembrem disso.

Porque apesar de ser possível alguém estar alegre e completamente alheio ao fato das coisas não estarem indo bem, normalmente não é o caso. Na maioria das vezes, há pelo menos uma impressão de que as coisas não estão ótimas. Pode ser um choque quando um “as coisas não estão ótimas” escala para uma demissão, mas pelo menos a semente está lá.

O melhor cenário é quando o funcionário e o chefe estão em total sincronia sobre o futuro desse relacionamento e, apesar de grandes esforços de ambos os lados, não está funcionando. Então o término se torna a conclusão natural, sem drama.

Esse cenário é tão provável quanto o da pessoa que está alegremente alheia. Sim, até acontece, e quando acontece, é ótimo. Mas não conte com isso. Espere que seja traumático e fique positivamente surpreso se não for.

Aqui vão algumas das considerações-chaves que tiramos das poucas vezes que tivemos que demitir alguém:

Minimize o tempo para sorrisos falsos

Não existe um momento certo para despedir alguém, mas atrasar sua execução só piora tudo. Cada interação entre o momento que a decisão final foi tomada até a consolidação do fato é uma dura ilusão. Os seres humanos deixam vazar emoções como uma peneira, então quanto mais você tiver que levar essa falsa cordialidade, maior será o sentimento de humilhação ou até mesmo de traição.

O melhor timing é o desconfortável agora mesmo. Não arraste ou atrase isso.

Esteja preparado

Já que essa geralmente é uma situação muito estressante, venha preparado. Pode não parecer natural ler uma declaração inicial que diz claramente: a) você está demitido, b) esses são os termos que estamos oferecendo e c) o porquê; mas isso irá garantir que você considerou e abordou todas as partes importantes.

Dê a pessoa um termo de rescisão com todos os detalhes, já que é provável que o choque prejudique sua memória. Fale para ela lê-lo atentamente, considerar uma assistência jurídica (elas normalmente estão desistindo de alguns direitos ao aceitar os pagamentos de indenização e devem entender todos os termos) e devolver o termo assinado somente depois de ter considerado tudo.

Seja absurdamente generoso

Se você está demitindo alguém porque sua companhia está quase falindo, você talvez não tenha escolha a não ser mandá-la embora com o mínimo possível. Mas se está demitindo alguém porque você decidiu que as coisas não estavam funcionando, você deve ser absurdamente generoso.

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Não importa o que você acha que aquela pessoa deveria ou poderia ter feito enquanto havia tempo. A não ser que ela esteja indo embora por uma negligência absurda ou por malícia, a culpa é principalmente sua. É sua por não examinar melhor, por não acompanhar melhor, por não orientar melhor. A responsa é do chefe. Qualquer fracasso dos funcionários é, basicamente, sua culpa. Assuma isso.

Então considere o pagamento acordado com essa responsabilidade. No Basecamp, nossa regra geral tem sido de um mês de pagamento para cada ano no emprego. Então se alguém trabalhou durante três anos na empresa, são três meses de salário para receber, com um número mínimo de compromissos atados no termo de rescisão.

Não deixe a porta aberta

É uma reação natural para alguém que está sendo demitido verificar se há alguma maneira de isso não acontecer. Não alimente esperanças onde não há. Se você não tem certeza que alguém deve ser demitido, então não a demita! Ache outra maneira de dar uma segunda, terceira ou quarta chance.

Só convoque a reunião para demitir alguém se a decisão tiver sido tomada e for a final. Depois deixe incrivelmente claro logo de cara: quando alguém está sendo demitido, não há espaço para conversa casual. Lide com o momento com clareza e dignidade. Não crie uma falsa impressão de segurança ao começar com um sorriso ou conversa fiada.

A decência da confiança

Só porque você demitiu alguém não significa que essa pessoa se torne automaticamente duvidosa. Ela claramente ganhou sua confiança o suficiente para ser contratada e estava trabalhando sob essa confiança minutos antes de ser demitida. Então a palhaçada corporativa de ter a mesa liberada, acesso aos sistemas imediatamente revogado e alguém para acompanhá-la até a saída não é só desnecessária, como antagônica.

Novamente, sim, às vezes pessoas são demitidas por motivos em que precauções devem ser tomadas. Mas na maioria das vezes não é o caso. Tratar alguém com desconfiança instantânea porque ele não trabalha mais para você é colocar, desnecessariamente, mais sal na ferida.

Seja amigável, seja decente.

Informe o resto das pessoas

Quando as pessoas só desaparecem da empresa, sem qualquer aviso ou explicação, todo mundo vai pensar no pior. Vou ser o próximo? A empresa está fechando? Isso aconteceu por causa daquela vez que a pessoa disse ou fez aquilo?

Se você deixa um vazio ao manter a razão em privado, ele rapidamente será preenchido com histórias desinformadas. Como isso vai ajudar? É melhor ser razoavelmente honesto sem qualquer ênfase desnecessária no pessoal. Mas o restante da sua equipe deve saber, e rapidamente, que seu colega está fora.

Isso com certeza será algo desconfortável de escrever, mas despedir pessoas não deve ser algo fácil! Deve ser difícil e horrível, para que você não perca a consciência do quão traumático normalmente é do outro lado. E é por isso que não devemos tentar enfeitar demais também. Não diga aos outros que alguém se graduou quando na verdade foi demitido.

Aprenda com isso

Você fez algo errado para chegar a esse ponto. A empresa fez algo errado. Alguma coisa com certeza poderia e deveria ter ido melhor, e se sim, talvez você não estivesse nessa situação. É crucial que você e a empresa aprendam com cada, com sorte rara, ocasião em que alguém é demitido.

É difícil aprender algo coletivamente se você não tentar de verdade. Então por favor tente. Faça uma retrospectiva adequada. Aceite a culpa, ou pelo menos a responsabilidade. É tão absurdamente fácil jogá-la no funcionário, e é quase sempre o caminho fácil e errado para olhar para si mesmo, suas políticas e sua empresa.

De novo, é ok se sentir um fracasso até certo ponto por causa disso. Despedir alguém deve ser algo caro, estressante e pelo menos um pouco vergonhoso, se não completamente humilhante. Você quer as cicatrizes para lembrá-lo como contratar e ser melhor na próxima vez.

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Nota da tradução: este artigo foi originalmente publicado em inglês no Medium do autor e traduzido para o português por Julia Barreto.

David Heinemeier Hansson

Criador do 'Ruby on Rails'. Fundador do Basemcamp. Best-seller pelo New Yorque Times por Rework and Remote" e piloto de corrida."