Belo Monte agora é um assunto global. Isso aconteceu depois de um grupo de alto calibre de atores relacionados à Rede Globo decidir gravar um vídeo em oposição à construção da usina de Belo Monte, polêmico empreendimento de geração de energia na região de Altamira, ao norte do Pará. Você já deve ter visto no Facebook. Na produção impecável, rostos bonitos e um texto encaixadinho bradam contra a construção, seja por opinião ou patrocínio.

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Bem como a internet gosta, a reação foi imediata. A “blogosfera” e os portais de opinião logo se puseram a trabalhar. Os comentários serviram tanto para entrenimento quanto reflexão. De um lado, os mais desditosos desclassificavam o vídeo “feito por playboys que só pensam em torrar grana nos shoppings e que sequer viram um índio em pessoa”. Por outro lado, os mais ingênuos brindavam a iniciativa que mostra que a telenovela também tem miolos e pode se posicionar sobre questões importantes da sociedade.

Por que Belo Monte?

Antes de qualquer reação, vale ilustrar do que se trata o projeto. A capacidade energética ocupa a agenda política nacional desde a década de 1970. O grande plano de desenvolvimento e independência tecnológica dos militares passava pela construção de usinas capazes de suprir o promissor parque industrial brasileiro. Durante os anos de chumbo (1964-84), foram implementadas diversas usinas hidrelétricas pelo país, sendo as principais Itaipu e Tucuruí, mais conhecida como Sobradinho.

O projeto de Belo Monte data de 1975. O objetivo é aproveitar o leito do rio Xingu para a geração de 11,2 GWh. Esse montante é capaz de atender o consumo residencial mensal médio do país. O custo da obra ainda é estimado, envolvendo muita regulamentação. Atualmente se estima em R$ 30 bilhões.

Além do impacto ambiental, o lago de cerca de 520 km² gerado pela construção da barragem desalojará a população ribeirinha, além de índios capajós e jurunas. Alguns deles ainda não contatados pela civilzação ocidental. Nos termos da concessão, o consórcio Eletronorte terá de acomodar os desalojados e ainda cumprir uma série de requisitos para a instalação da usina.

(Para mais detalhes, acessem: Blog da Usina Hidrelétrica de Belo Monte e Instituto Sócio Ambiental.)

O que está em jogo

O grande debate

Estirpar índios de seu meio e degradar o ambiente não são coisas que peguem lá muito bem. Ainda mais em uma época que o ser humano passou (?) a repensar sua relação com o ambiente que o cerca. Nesse bojo, os custos sociais e ambientais galgam importância ante os custos econômicos, outrora soberanos. É o efeito da “sustentabilidade” reordenando os fluxos de caixa.

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O argumento motor da construção de Belo Monte passa pela superação dos limites estruturais de nosso país. O que começou como uma obstinação dos militares por promover a plena industrialização do Brasil, se transformou em uma necessidade vital para nosso futuro econômico. Obviamente que a questão política exerce um sobrepeso em ambos momentos. Tanto que será um grande bônus eleitoral se o atual governo edificar com êxito a usina.

Embora o saldo político já esteja apurado e a questão ambiental nítida, resta aos brasileiros decidir sobre o custo social do empreendimento. Desencurvar rios e engaiolar índios em nome do desenvolvimento soa primitivo ante os avanços de nossa civilização. A remoção das populações ribeirinhas e “aculturadas” traz um impacto vigoroso sobre as cidades. Favelização, violência e deserança cultural são só os grandes grupos dos problemas da remoção.

Então, que desenvolvimento é esse? Amartya Sen, em linha mais ortodoxa com nosso Celso Furtado, prega que desenvolvimento não se mede simplesmente por números estanques ao final de um ciclo produtivo. O desenvolvimento em sua plenitude trata de liberdade, trata de acesso. O indíviduo consegue exercer sua capacidade material, cultural, social, política e espiritual em uma sociedade realmente desenvolvida. Nessa linha, a construção de Belo Monte estaria contribuindo não para o acesso, mas para a degradação de parte do patrimônio humano brasileiro.

No entanto, o projeto é muito grandioso para se encerrar em um único posicionamento. Os argumentos contra a usina são fortes e prolíferos. Na internet e na mídia são raras as posições publicamente a favor. Talvez as grandes perguntas sejas, no fundo, qual o preço do desenvolvimento que queremos, e se Belo Monte e todo seu gigantismo vai de fato contribuir para tal. O que você acha?

Flaco Marques

Rapaz do interior de SP que vive suas desventuras na cidade grande. Poliglota valente, busca equilibrar o jeito cosmopolita de ser com a simplicidade caipira de viver.